Decreto tira o poder da comunidade escolar e determina que a adesão ao programa Parceiro na Escola seja decidida somente pela Secretaria da Educação
A juíza substituta da 5ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba, Diele Denardin Zydek, determinou ao governo do Paraná que respeite a decisão da comunidade escolar sobre a adesão ao programa Parceiro na Escola, que prevê a terceirização da administração em 204 escolas no estado. No decreto que regulamenta o programa, o governo havia decidido que a adesão sobre a adesão caberia somente à Secretaria de Estado da Educação (Seed) caso não haja quórum na consulta.
Publicado no dia 3 de setembro, o decreto 7.235, em seu artigo 28, prevê que, se não houver quórum nas consultas, “a adesão ao Programa será definida pela Seed”, o que contraria a lei aprovada em junho na Assembleia Legislativa do Paraná (Alep). O líder da base de apoio ao governador Ratinho Júnior, Hussein Bakri (PSD), afirmou várias vezes que o projeto era “democrático” por prever a consulta à comunidade.
Na ação que levou à suspensão do artigo, o APP-Sindicato argumentou que a determinação do governo fere o princípio da gestão democrática.
“A parte autora defende que as disposições dos supramencionado Decreto violam o princípio da gestão democrática. No primeiro ponto levantado, impugnou a regra que prevê que, nos casos de não atingimento do quórum mínimo (maioria absoluta), a adesão do programa será decidida pela Seed. Sobre isso, entendo estar configurada a probabilidade do direito sustentado”, afirmou a juíza Diele Denardin Zydek em sua decisão.
A magistrada determinou que a Seed não poderá decidir sobre a adesão ao programa caso não haja quórum. “Diante do exposto, defiro parcialmente a liminar pretendida para suspender os efeitos do parágrafo único, incisos I e II do art. 28 do Decreto nº 7.235, e determinar que o réu Estado do Paraná se abstenha de decidir, unilateralmente, pela inclusão/adesão de determinada instituição de ensino ao Programa Parceiro da Escola nos casos em que a consulta pública seja frustrada pela ausência de quórum mínimo de votação”, afirmou a juíza.
“É evidente que a decisão sai da alçada da comunidade escolar diretamente envolvida e passa a ser tomada exclusivamente pelo Poder Público, tolhendo o direito de escolha dos docentes e discentes, que é indispensável para que a gestão democrática seja efetivamente materializada”, diz Denardin.
Sem informações sobre o projeto-piloto
Na quarta-feira (27), o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE) Maurício Requião pediu vistas durante o julgamento da cautelar que suspendeu as contratações para o Parceiro na Escola, concedida pelo conselheiro Fábio Camargo no dia 15 de novembro.
Segundo Maurício Requião, o governo ainda não enviou informações sobre o projeto-piloto que teria baseado o programa Parceiro na Escola. Em dezembro de 2022, os colégios Anita Canet, em São José dos Pinhais, e Anibal Khury, em Curitiba, passaram a ser administrados por empresas. O governo alega que há ampla aprovação da comunidade, mas no início deste mês a deputada Ana Júlia (PT) denunciou que a empresa responsável pela administração recebeu R$ 6 milhões do governo sem prestar contas.
“Estamos diante de uma trama muito mais complexa, que a meu ver, se implementada, será o desmonte da espinha dorsal do sistema público de ensino no nosso estado”, afirmou Maurício Requião. “Não temos acesso a um relatório do projeto-piloto. Não há uma informação que tenha sido extraída do projeto-piloto para fundamentar o projeto definitivo”. Em outubro, uma autoria da 2ª Inspetoria do TCE apontou sete irregularidades no projeto-piloto.
Para Maurício Requião, não se trata apenas da terceirização da administração das escolas, mas também da parte pedagógica. “Se é para administração de ar-condicionado, de merenda e de segurança, por que a empresa tem que ser empresas especializada em gestão educacional?”, questionou o conselheiro.
“Como uma empresa privada vai administrar finanças públicas? Está sendo transferida para empresas a gestão do ensino. As empresas comprarão os livros didáticos que serão utilizados nas escolas. As empresas contratarão os professores, em afronta direta à Constituição. Por que a modalidade de contratação é o cadastramento? Por que não haveria possiblidade de licitação num caso desse?”, diz Maurício.
Fábio Camargo afirmou que a suspensão das contratações protege o governador Ratinho Júnior, que estaria sendo “mal assessorado”.
“Estamos aqui protegendo o governador, que foi muito mal assessorado. Um péssimo secretário de Educação (Roni Miranda), mal-educado, porque não respeita o Tribunal de Contas do Estado do Paraná. É um escárnio o que estão fazendo com as escolas”.
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A Seed segue fazendo propaganda do programa Parceiro na Escola utilizando os dados fornecidos por pais e responsáveis por alunos, que têm recebido materiais via WhatsApp. O envio de mensagens ocorre pelo menos desde setembro, como mostrou matéria do Plural.
O mesmo banco de dados foi utilizado pela Seed para enviar um vídeo apócrifo que tentava desmobilizar estudantes contrários à aprovação do projeto de terceirização, no início de junho. Em resposta a pedido de informações protocolado pelo Plural, a Seed informou que o envio do vídeo foi feito “de forma automática“.
O Plural entrou em contato com a assessoria da Seed na manhã desta quinta-feira (28) e fica à disposição caso a Secretaria queria comentar a decisão judicial e o julgamento no TCE.
Fonte: Jornal Plural