“Se o Trump não acabar com o PT agora, ninguém acaba.” Ouvi esta frase, dia desses, de uma trabalhadora – caixa de supermercado em Londrina. Na afirmação, ela ostentou um certo orgulho pelas ações do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, para sancionar o Brasil com taxas de importação sobre produtos brasileiros. A afirmação foi acompanhada de expectativas positivas de uma consumidora.
A trabalhadora do supermercado – mal remunerada e explorada por um dos setores que mais promove precarização – não consegue se dar conta que a taxação de Donald Trump, aos produtos brasileiros, não é contra o Partido dos Trabalhadores nem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas contra o Brasil. O aumento das taxas impacta toda a cadeia produtiva, afetando postos de trabalhos, independentemente da posição político-ideológica dos envolvidos.
Aqui o objetivo não é avaliar de onde vem e para onde vai o complexo de vira-lata de quem se diz patriota, mas bate continência para a bandeira dos Esteites e sai às ruas para defender sanção contra o Brasil. A provocação é suscitar a reflexão de quem poderá sofrer com a taxação de Trump e, mesmo assim, aplaude as medidas por supostamente atingir um inimigo, o PT.
Em uma pesquisa rápida no Jooble, um site internacional que atua em 67 países – um agregador de vagas de emprego, a média salarial em supermercados no Brasil é de R$ 1.976,00. O cálculo considera 2.034 vagas ofertadas pelas empresas cadastradas no site em um período de sete dias, na semana passada. Mesmo não tendo metodologia científica, a média salarial apontada pelo Jooble é um bom indicador de como o setor supermercadista paga. E paga muito pouco.
A média salarial de R$ 1.976,00 é um pouco maior que o salário mínimo que, em 2025, é de R$ 1.518,00. Coincidência ou não, na semana passada, o Congresso Nacional aprovou – depois do motim de deputados extremistas que bloquearam as mesas da Câmara dos Deputados e do Senado – a isenção de Imposto de Renda para quem ganha até dois salários mínimos. A proposta é do governo federal, que também enviou projeto para aumentar a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil.
É nessa faixa de renda que está a trabalhadora mal remunerada, autora da frase que abre esse artigo: “Se o Trump não acabar com o PT agora, ninguém acaba.” Nenhum trabalhador é obrigado a gostar, a fazer campanha e a votar em partido algum. O que espanta é a falta de capacidade para refletir sobre a própria realidade, que insiste em revelar, mostrar, provar e, mesmo assim, o trabalhador não toma consciência da sua condição: trabalhador mal remunerado.
Combater essa situação passa por compreender as causas que levam trabalhadores, como a atendente do supermercado, a pensarem como pensam e agem. Essas causas são complexas e não apresentam uma resposta simplista nem de solução de curto prazo. O diagnóstico desse problema deve levar em conta elementos multifatoriais.
Pode-se citar alguns: i) um sistema de ensino que não estimula o pensamento nem o aprendizado de bases conceituais que interferem na vida em sociedade; ii) um sistema pluripartidário personalista, que favorece o poder econômico; iii) um conglomerado de comunicação que privilegia o interesse dos donos e não o interesse público; iv) uma cobertura midiática que oculta, fragmenta e inverte fatos e acontecimentos; v) um método de fazer política que estimula o ódio nas relações sociais.
Resolver essa situação não é uma tarefa fácil nem rápida e, portanto, se torna uma atribuição para algumas gerações. Defender que Trump acabe com o PT, sem refletir acerca da extinção de postos de trabalho e o aumento do desemprego de vários setores da cadeia produtiva, apenas por ódio político, é correr o risco de se tornar vítima daquilo que se deseja para o outro.
NOTA – Para quem achou exagerada a afirmação no começo deste texto, que o setor supermercadista é um dos que mais precariza, uma informação. Em abril de 2024, na Justiça do Trabalho havia mais de 610 mil ações trabalhistas tendo como causa acidentes de trabalho. O comércio varejista de mercadorias em geral, que inclui supermercados, está em quarto lugar do ranking. O setor fica atrás apenas do transporte rodoviário de cargas, da construção de edifícios e da administração pública em geral.

Reinaldo Zanardi
Jornalista, doutor em Estudos da Linguagem, mestre em Comunicação. Diretor do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Norte do Paraná. Professor do Departamento de Comunicação da Universidade Estadual de Londrina. Membro do Conselho Municipal de Política Cultural de Londrina.









