Inspiração. Motivação. Dedicação. Esses são alguns dos enfoques que embalam as homenagens ao professor e à professora, na data em que se comemora o dia da profissão: 15 de outubro. Mensagens carinhosas e melosas inundam as redes sociais, circulam pelos aplicativos de conversa, viram memes na internet.
A romantização da função do/a professor/a – no dia 15 de outubro – é um discurso cujo efeito de sentido é perverso. Aquele sentido que atribui à docência um dom, uma vocação. O trabalho vira uma missão. Isso se contrapõe ao/à professor/a enquanto categoria de trabalhador, que precisa de salários dignos e melhores condições de trabalho. Professor não é um missionário. É um trabalhador, que integra uma categoria. Aliás, qual a profissão não pede dom e vocação?
Essa homenagem toda no Dia do/a Professor/a não esconde os maus tratos que a categoria sofre ao longo do ano. Parte significativa dos brasileiros ataca os professores acusando-os de doutrinadores esquerdistas e outras invenções. Não à toa, viralizou recentemente fala do deputado federal Nikolas Ferreira em que acusa professores de exibir, em sala de aula, vídeos pornográficos. O Conselho Nacional de Direitos Humanos já tomou medidas contra o direitista extremista.
A acusação do deputado não é ponto fora da curva. A vereadora de São Paulo Zoe Martinez, no mês de maio, da mesma facção que Ferreira, o PL, chamou professores da rede municipal de vagabundos. A motivação? Professores em greve protestavam do lado de fora da câmara paulistana. O barulho do protesto desagradou a extremista. “Gente, que dor de cabeça do inferno. Vão trabalhar, seus vagabundos.”
A ação de políticos famosos em nível nacional repercute Brasil afora, incentivando o extremismo, a incivilidade do conservadorismo. A orientadora escolar Juliana Andozio, de uma escola em Florianópolis, tem sido perseguida e agredida por um grupo de pais. Por quê? Porque ela fez o que qualquer professora séria faria: acolheu uma estudante, mas por ser uma estudante trans, a professora virou alvo dos extremistas catarinenses, liderados por um vereador bolsonarista. Do PL. Sempre o PL.
Os maus tratos contra o professorado também podem ser medidos pelo (não) cumprimento do piso salarial do magistério no Brasil, que é de R$ 4.867,77.
Podem argumentar que é um valor acima da média da renda do brasileiro, mas o piso não é alto. É a média salarial brasileira que é muito baixa. Mesmo com piso salarial, não há garantia de que ele seja pago. Segundo o Anuário Brasileiro da Educação Básica, divulgado no mês passado, um terço dos municípios brasileiros – quase 1.900 – não paga o valor do piso. E isso não é coisa do interiorzão. No Sudeste, a região que se orgulha de ser a mais rica do país, 45% dos municípios não pagam o piso salarial. Quase a metade!
O ódio destilado a professores – seja de políticos seja de pais conservadores – tem consequências. Em 15 anos, o Brasil terá um apagão na categoria. O déficit de professores até 2040, será de 235 mil professores na educação básica. Essa informação é de uma pesquisa do Instituo Semesp, entidade que reúne mantenedoras de ensino superior do Brasil. A pesquisa foi divulgada em maio último. Como querer ser professor diante de tanta violência de políticos, de pais e de desvalorização da categoria? A célebre frase “Ao mestre, com carinho” nunca foi tão vazia.

Reinaldo Zanardi
Jornalista, doutor em Estudos da Linguagem, mestre em Comunicação. Diretor do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Norte do Paraná. Professor do Departamento de Comunicação da Universidade Estadual de Londrina. Membro do Conselho Municipal de Política Cultural de Londrina.












