A guerra Israel-Irã e a entrada, por enquanto superficial, dos EUA no conflito, com o bombardeio às instalações nucleares do Irã e a sua retaliação à base militar estadunidense no Catar, nos mostram algumas evidências, discutidas a seguir.
Está mais que comprovado que não é mais possível confiar nos EUA como nação que pode trazer alguma paz para o mundo. Mesmo não admitindo no início, os EUA deram o aval para que Israel atacasse o Irã, no dia 12 de junho, ainda durante negociações diplomáticas sobre o não enriquecimento do urânio no país islâmico. Isso por si só é um ato de covardia e desrespeito às leis internacionais. Trump abala a reputação de seu país.
O governo de Israel, que já vem sendo criticado pelo mundo todo pelas ações genocidas na Faixa de Gaza, aproveitou a oportunidade para fazer os ataques de surpresa. Atacou instalações nucleares, assassinou militares, cientistas ligados ao programa nuclear iraniano e seus vizinhos com os bombardeios. Famílias inteiras foram aniquiladas. Israel, achando que resolveria os problemas com esses ataques, acabou pagando caro com a retaliação que o Irã iniciou no mesmo dia.
Em abril de 2024, Israel já havia realizado um ataque à embaixada iraniana em Damasco, na Síria. Algo até então nunca visto, já que as embaixadas são protegidas por tratados diplomáticos históricos que não permitem qualquer tipo de agressão a esses locais, pois são considerados territórios estrangeiros que não podem ser violados.
Naquele mesmo mês, o Irã atacou Israel, não sem avisar o mundo de seu ataque. Com 170 drones, 120 mísseis balísticos e 30 mísseis de cruzeiro, o “Domo de Ferro”, sistema de defesa aérea do qual Israel se orgulha, não impediu que duas bases militares fossem atingidas. Esse ataque já deixava claro, no ano passado, que o poder de atingir Israel com facilidade era uma nova realidade e sua hegemonia no oriente médio não existia mais. O Irã se mostrou com grande capacidade de armamentos e uma tecnologia muito desenvolvida.
Esta constatação se provou mais uma vez com a retaliação sem precedentes que o Irã impôs a Israel. Este país, até então, nunca havia sido atacado como foi, apesar de a mídia ocidental tentar esconder isso. Os mísseis hipersônicos, tecnologia que o ocidente ainda não detém, é bom frisar, foram os protagonistas da devastação que o Irã impôs pela primeira vez ao território israelense.
Os sistemas de defesa aérea de Israel não deram conta dos intensos ataques do Irã. As qualidades do “Domo de Ferro”, tão propagadas por Israel, evaporaram. O mito da invencibilidade israelense acabou, a ponto do seu primeiro-ministro, Benjamin Netaniahu, correr para pedir socorro aos EUA, solicitando um cessar fogo imediato. Os EUA tiveram que realizar um ataque “brando” ao Irã, para tentar de qualquer forma o cessar fogo implorado por Israel.
Estamos agora vivenciando um cessar fogo sem saber até quando vai, mas já é possível apontar que o Irã tem vários argumentos para não mais confiar na Agência Internacional de Energia Atômica – AIEA. Esta se mostrou não mais confiável, desonesta, pois não condenou Israel ao atacar instalações nucleares. Passou informações até dos endereços dos cientistas iranianos que foram assassinados pelos ataques realizados. O Irã tem vários motivos para não mais compactuar com esta Agência que é, na verdade, um instrumento de sabotagem a serviço do Ocidente.
Os ataques implementados por Israel e pelos EUA não enfraqueceram militarmente o Irã, nem o seu programa nuclear. O Irã já declarou que continuará com seu programa de enriquecimento de urânio; se será para fins pacíficos, depois disso tudo, ninguém sabe. As consequências ainda são uma incógnita.
Trump e Netaniahu conseguiram tirar o Irã do acordo nuclear fechado com Obama em 2017, no qual o Irã se limitava a enriquecer o urânio em seu território. A própria chefe de inteligência dos EUA, que havia declarado que Teerã não estava desenvolvendo armas nucleares, foi afastada das reuniões! Trump e Netaniahu podem ter jogado o Oriente Médio em um conflito sem precedentes, inclusive, nuclear.
O Paquistão já anunciou que pode fornecer armas nucleares para o Irã. Rússia e China, aliados do Irã, também já anunciaram que este país terá total apoio. Tudo pode escalar para uma situação inimaginável.
As armas nucleares têm o poder da dissuasão, isto é, de convencer alguém a deixar de fazer algo. Sem serem detonadas, servem para fazer com que o inimigo mude de ideia e desista de atacar. Neste ponto, as armas nucleares podem ser consideradas também instrumentos de paz. Se o Irã já possuísse uma arma nuclear, Israel não teria realizado o ataque do dia 12 de junho.

Fábio da Cunha
Professor Dr. Fábio César Alves da Cunha é geógrafo e docente associado do Departamento de Geografia da Universidade Estadual de Londrina UEL. Possui mestrado em Planejamento Ambiental (UNESP), Doutorado em Desenvolvimento Regional (UNESP) e Pós-Doutorado em Metropolização pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Trabalha com geografia urbana e regional, planejamento urbano e ambiental, geopolítica e metropolização.