Presidente Lula deve mudar comando brasileiro da usina, que, sob aliança Ratinho-Bolsonaro, bancou dezenas de obras no Paraná
Ratinho Jr. (PSD) terminou na semana passada de anunciar os nomes do primeiro escalão de seu segundo mandato, mas um posto valoroso para o novo ciclo segue em aberto – e não depende dele. A mudança na Presidência da República vai redirecionar em breve o assento brasileiro na direção-geral da Itaipu binacional, em ano de revisão do tratado assinado com o Paraguai, e imagina-se que a nova escolha diminua consideravelmente o poder de tráfego do Palácio Iguaçu na usina, fonte estratégica de investimentos para o governo do estado.
Nos quatro anos de Jair Bolsonaro (PL), aliado por quem o governador mobilizou uma intensa campanha no segundo turno contra o eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a Itaipu subsidiou mais de 20 grandes projetos no Oeste do Paraná, em convênios com o estado e com municípios que ultrapassam R$ 1,55 bilhão, de acordo com números repassados pela própria empresa. Entre eles, a nova ponte entre Brasil e Paraguai, bastante veiculada nas campanhas eleitorais de Ratinho Jr. e cujo custo total de R$ 373 milhões foi bancado pela usina.
A boa leva de investimentos da Itaipu no estado fez Bolsonaro chegar a declarar ser o responsável pelo melhor secretário do governador, referindo-se ao diretor de Itaipu à época, o general João Francisco Ferreira. A fala foi no contexto do início da duplicação de trecho da BR-277 e do Contorno Oeste, demandas de grande porte da região de Cascavel também retiradas do papel com dinheiro da binacional.
Pró-Bolsonaro
No meio político, os aportes pesados da usina em municípios paranaenses nos últimos anos, para além dos royalties distribuídos por lei, passaram a ser lidos como um dos motivos para explicar a lealdade de Ratinho a Bolsonaro.
O governador do Paraná manteve apoio incondicional ao lado do ex-presidente nos últimos quatro anos. Deixou de se juntar a governadores em cartas de repúdio contra ações pontuais do então mandatário e, no segundo turno das eleições recentes, mobilizou prefeituras de todo o estado para garantir a vitória do militar nas urnas paranaenses. Em reunião extraordinária convocada pelo presidente Lula com todos os governadores nesta segunda-feira (9), na esteira dos atos terroristas comandados por bolsonaristas em Brasília, Ratinho titubeou em comparecer.
Agora sem o aliado no Palácio do Planalto e logo sem seu devido intermediário dentro de Itaipu, fontes ouvidas pelo Plural preveem um relação menos íntima do chefe do Executivo paranaense com a direção da usina. Os investimentos devem continuar, mas a distribuição de recursos tende a ser menos direcionada aos interesses do governador.
“As coisas tendem não a acabar, mas não terão o ritmo do ponto de vista de propaganda eleitoral como no passado recente. Não acredito que vai interromper, mas vai diminuir porque o foco é outro. O foco da Itaipu é uma relação com todos os municípios e com o desenvolvimento de pesquisa, novas tecnologias, e isso não é adequado quando você pensa em construir obras para o governo do estado”, disse um político envolvido.
Quem será?
Outra fonte procurada pela reportagem citou uma suposta costura para se chegar a uma espécie de denominador comum indicado não pelo PT de Lula, mas pela frente ampla que apoiou a volta do petista à Brasília. O resultado cairia bem menos indigesto para o governador do Paraná e soaria interessante para o novo mandatário da República sob o ponto de vista da governabilidade. Estaria neste pacote um nome representativo do Oeste do estado, Eduardo Sciarra, ex-deputado federal e secretário de Estado na gestão de Beto Richa. A reportagem não conseguiu entrar em contato com Sciarra para questioná-lo sobre a hipótese.
Outros nomes aptos também circulam com força. Estão entre as apostas o ex-presidente da OAB paranaense, Juliano Breda, que integrou a equipe de transição de Lula; e de Paulo Bernardo, ex-ministro de Lula e Dilma Rousseff e também marido da presidente nacional do PT, a deputada federal paranaense Gleisi Hoffmann.
As especulações geraram intenso burburinho na semana passada com a recusa de Roberto Requião, ex-senador e ex-governador do Paraná, a uma das vagas do Conselho de Itaipu que lhe chegou a ser oferecida por Gleisi Hoffmann. No ano passado, Requião migrou do MDP para o PT, se candidatou ao governo do Paraná como oposição a Ratinho e encabeçou a campanha de Lula no estado, onde o petista é bastante rejeitado. A aliança fez dele o primeiro cotado a assumir a usina binacional, responsável pela produção de 10,8% da energia consumida no Brasil e 88,5% da consumida em solo paraguaio.
Requião, que afirmou nunca ter cobrado cargo em troca do apoio dado ao agora presidente, disse ter se sentido desrespeitado com o convite. Nas redes sociais, referiu-se à proposta como “boquinha de luxo”, e ao Plural, criticou a funcionalidade do cargo ofertado. O Conselho de Administração de Itaipu é um órgão interno com atribuições complementares à direção da usina, e seus 12 membros – sendo seis brasileiros e nomeados, portanto, pelo presidente da República – reúnem-se seis vezes por ano para fiscalizar o cumprimento do tratado, definir diretrizes administrativas e aprovar orçamentos e relatórios da empresa, por um salário mensal de cerca de R$ 25 mil.
“Eu entrei nessa por ideologia, para apoiar Lula e se desfazer de Bolsonaro, desta barbárie, desta loucura. Se fosse por dinheiro, essa proposta [da vaga ao Conselho] seria irrecusável, mas isto não é e nunca foi meu propósito”, disse.
Megaorçamento
Em 2021, a Itaipu administrou orçamento de recursos e aplicações que superou os US$ 3,7 bilhões, cifra capaz de explicar a intensa disputa por trás da nomeação à direção-geral da empresa, compartilhada com o Paraguai.
A previsão é que esta margem cresça com a quitação completa da dívida da construção da usina. O saldo devedor termina de ser amortizado neste ano, quando o acordo entre Brasil e Paraguai para a construção do empreendimento completa 50 anos. A data também prevê a revisão do anexo que estipula as bases financeiras e de prestação de serviços de eletricidade de Itaipu. Como a dívida representa 66% da tarifa, há possibilidade real de redução do custo de energia gerada.
As mudanças em iminência tornam ainda mais estratégica a nova composição da direção-geral brasileira da usina.
Além do cargo de diretor-geral e conselheiros, articulações políticas também podem mobilizar nomes para outras funções dentro da empresa. Em 2019, o então secretário de Segurança Pública de Ratinho, o general Luiz Felipe Kraemer Carbonell, foi empossado diretor de coordenação da empresa, em meio a uma leva de militarização dos postos de alto comando na gestão Bolsonaro.
Desde 2019, foram colocados na direção-geral de Itaipu os generais Joaquim Silva e Luna e João Francisco Ferreira e o almirante Anatalicio Risden Junior, curitibano ainda no cargo.
Principais investimentos de Itaipu no Paraná entre 2019 e 2022
-Ponte da Integração: R$ 373 milhões
Projeto iniciado em 2019 é parceria entre os governos do Estado e Federal com Itaipu, responsável pelos recursos financeiros totais.
-Perimetral Leste: 336,6 milhões (orçamento total)
-Duplicação da Rodovia das Cataratas: R$ 139,4 milhões
A duplicação da BR-469 (Rodovia das Cataratas) entre o trevo de acesso à Argentina e o portal de entrada do Parque Nacional Iguaçu também prevê vias marginais, passeios, ciclovia, uma nova ponte sobre o Rio Tamanduá.
-Estrada Boiadeira: R$ 200 milhões
-Duplicação de trecho da BR-277 em Cascavel: R$ 72,7 milhões
A duplicação da BR-277 também integra convênio entre o governo do Estado e a Itaipu Binacional. Obra já tem 60% de andamento.
-Contorno Cascavel: R$ 101,5 milhões
Obra executada pelo DER e custeada pela usina já se encaminha para a fase final
-Iluminação viária BR-277 entre Foz e São Miguel do Iguaçu: R$ 18,6 milhões
-Obras no Aeroporto Internacional de Foz do Iguaçu (duplicação de acesso, ampliação do pátio de estacionamento, ampliação da pista de pouso e decolagem, iluminação de acesso): R$ 81,4 milhões
-Aeroporto de Cascavel: R$ 3,4 milhões
-Hospital Ministro Costa Cavalcanti: R$ 81,4 milhões
-Revitalização do Gramadão, em Foz: R$ 3,9 milhões
-Reforma do prédio da Delegacia da Mulher: R$ 1,6 milhão
-Vila A Inteligente: R$ 4,329 milhões
-Ciclovias na Vila A e Tancredo Neves, em Foz: R$ 23,5 milhões
-Revitalização da pista de atletismo do ginásio Costa Cavalcanti, em Foz: R$ 10,9 milhões
-Mercado Público de Foz: R$ 8,9 milhões
-Reforma na base para o BPFron em Entre Rios do Oeste (estudos de viabilidade): R$ 298 mil
-2ª Sede do BPFron em Guaíra: R$ 22 milhões
-Terminal Multimodal de Foz do Iguaçu e Cascavel (estudos de viabilidade): R$ 2,9 milhões
-Centro Integrado de Polícias: R$ 2,6 milhões
-Projeto Urbanístico Beira Foz: R$ 3,8 milhões
-Reformas de Delegacias, DCCO e BPFron: R$ 4,5 milhões
-Investimento no Hospital Municipal de Foz do Iguaçu: R$ 26,1 milhões
-Interligação Viária em Santa Helena: R$ 26,2 milhões
-Infraestrutura do Conjunto Habitacional Porto Seguro (Santa Helena): R$ 5,1 milhões
-Revitalização da sede e subsede da Apae: R$ 2,6 milhões
Fonte: Redação Plural