De acordo com pesquisa, imposto de até 5% sobre super-ricos poderia arrecadar 1,7 trilhão de dólares por ano. Valor suficiente para retirar 2 bilhões de pessoas da pobreza
Relatório, que acaba de ser publicado pela OXFAM Brasil, traz informações relevantes sobre um problema que persiste há décadas, porém tornou-se ainda maior nos últimos dois anos: a desigualdade de renda. Os altos índices de concentração de riqueza nas mãos de poucos podem ser observados em diversos países.
O estudo nomeado “A sobrevivência do mais rico: por que é preciso tributar super-ricos agora para combater as desigualdades” demonstra, por exemplo, que desde 2020, a parcela da população mundial 1% mais rica acumulou quase dois terços de toda a nova riqueza produzida em escala global. Com isso, as fortunas estão aumentando em 2,7 bilhões de dólares por dia, mesmo com a inflação superando os salários de, pelo menos, 1,7 bilhão de trabalhadores.
Ainda, de acordo com a investigação, empresas dos setores de alimentos e energia mais do que dobraram seus lucros em 2022, pagando 257 bilhões de dólares a acionistas enquanto mais de 800 milhões de pessoas foram dormir com fome no último ano.
Informações do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) — que mede a inflação oficial do país – divulgadas na última quinta-feira (9), indicam crescimento de 0,53% em janeiro, quarto mês seguido com alta. O maior impacto positivo geral no índice veio do grupo de alimentação e bebidas, com aumento de 0,59%. Nos últimos 12 meses, a inflação acumulada é de 5,77%.
“A inflação de alimentos no Brasil tem a ver com a questão externa, mas não é toda verdade que é apenas algo natural, por causa da Ucrânia. Existem setores monopólicos que dominam estas cadeias e influenciam as políticas públicas. Então, é uma tragédia evitável. Se você tem menos lucro, tem preço menor. Hoje, por exemplo, R$ 100 bilhões que você dá para os acionistas da Petrobras é parte deste mercado financeiro, destes ricos que estão concentrando o mundo e ficam pressionando Brasil, Argentina, outros países”, explica o economista Venâncio Oliveira.
De acordo com ele, além da desconstrução de explicações reducionistas, é necessário pensar em propostas dentro de uma política econômica soberana, ou seja, que priorize os interesses da população de maneira ampla e não que atenda somente determinados conglomerados econômicos. Estes últimos, se aproveitando da construção de monopólios, aumentam os preços de serviços e produtos, dificultando, sobretudo, o acesso de segmentos mais pobres.
Reforma tributária
Ainda, segundo Oliveira, outra medida urgente para a redução da desigualdade econômica no Brasil é a reforma tributária. O assunto voltou aos holofotes durante campanha presidencial. Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que assumiu seu terceiro mandato, garantiu que o novo governo promoverá isenção da taxa para quem recebe até R$ 5 mil por mês.
“A primeira questão é: precisamos atualizar a tabela, então, estamos falando de mais dinheiro que vai chegar para uma família e vai virar consumo, girando a economia popular que está deprimida e ao mesmo tempo estamos falando de ricos que não pagam seus impostos, vão as paraísos fiscais, offshore [sociedades ou contas bancárias abertas em países ou territórios do exterior, ou seja, fora do local de domicílio dos proprietários]”, observa.
Conforme estudo da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco Nacional), a última atualização ocorreu em 2015. Porém, não ocorreu reposição completa e a defasagem acumulada é de aproximadamente 145%. Apenas nos últimos quatros anos, a diferença estimada é de 30%.
“Quem paga são os assalariados que têm apenas a reposição da inflação nos salários e pagam mais imposto de renda ano após ano. São recursos que deveriam estar nas mãos das famílias e não estão”, afirma Mauro Silva, presidente do Unafisco Nacional.
O imposto sobre consumo representa praticamente a metade de toda a carga tributária no Brasil. Assim, quem tem menor renda acaba pagando proporcionalmente mais impostos, visto que os ganhos são direcionados, majoritariamente, para quitar despesas básicas.
“O rico não paga imposto, esta é a grande questão, ele evade e se você distribui renda, além de justiça tributaria, tem impacto na economia. Porque, na medida que o rico concentra a renda, não é certo que isso gera mais desenvolvimento como dizem os neoliberais, que ele vai investir e gerar mais emprego. Não, o rico quer ficar mais rico, vai pegar este dinheiro, viver dos títulos da divida pública. O pobre com R$ 500 vai e consome, gerando emprego, distribuição de renda e desenvolvimento econômico”, indica Oliveira.
Para mais informações, acompanhe coluna do economista publicada nesta semana, disponível aqui.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.