O time de colunistas do Portal Verdade acaba de ganhar um novo reforço. Chega para compor a equipe: Mayara Medeiros, professora de História, pós-graduada em Humanidades pela UENP (Universidade Estadual do Norte do Paraná). Atualmente, é secretaria estadual de mulheres do Partido dos Trabalhadores (PT) no Paraná, tornando-se a primeira mulher negra a ocupar este espaço.
Nas eleições municipais de 2020, foi responsável por liderar a única candidatura negra concorrente à cadeira de prefeita em todo o estado. Mãe de três filhos, iniciou a maternagem ainda na adolescência como a realidade de muitas meninas negras no país. Ela conta que sua formação é reflexo de programas sociais dos governos petistas, como a política de ações afirmativas para ingresso no ensino superior.
Sancionada em 2012, durante o governo de Dilma Rousseff (PT), a Lei 12.711 tem possibilitado que alunas e alunos de escolas públicas, de baixa renda, negros, indígenas, e pessoas com deficiência obtivessem acesso ao ensino superior público por meio da reserva de vagas em instituições federais. Em complementariedade à legislação, governos estaduais também criaram políticas que visam incentivar a entrada e permanência de grupos subalternizados nas universidades.
Oriunda do interior, pertencente à uma família adepta do sincretismo religioso, que respeita as múltiplas divindades – de Deus aos Orixás – e inspirada pelas potencialidades dos encontros, Mayara relata que o convite para integrar o grupo partiu da jornalista e editora-chefe do Portal Verdade, Elsa Caldeira.
“Eu estava no escritório regional do Deputado estadual Arilson Chiorato e encontrei uma energia, uma potência chamada Elsa Caldeira, que me deu uma carona. Falamos sobre a vida, sobre a nossa luta, sobre ser mulher nesse ambiente da militância, sobretudo, no meu caso, de uma mulher negra. Ela me convidou e eu aceitei de pronto”, pontua.
A periodicidade dos textos será quinzenal e irão abordar a participação de mulheres na política e demais ambientes de poder, sempre partindo do olhar intersecional, ou seja, considerando a estrutura racista presente na sociedade brasileira que condiciona mulheres negras à base da pirâmide social. Porém, como sementes de Lélia Gonzalez, Beatriz Nascimento, Sueli Carneiro, Marielle Franco, Carol Dartora, seguem resistindo.
As produções também irão pautar as reinvindicações e lutas da comunidade LGBTQIA+. Ambos segmentos, historicamente marginalizados, foram ainda mais violentados com a ascensão do projeto necropolítico, que assumiu a liderança do país em 2016, após o golpe de estado misógino que destituiu a primeira mulher eleita presidenta do país. Desde então, a disseminação de discursos de ódio tem imposto quais vidas valem menos do que outras.
“A violência sobre as mulheres e pessoas pretas foram sempre um dos pilares da organização social econômica da história. Enquanto as pessoas LGBTQIA+ foi silenciada sob todo tipo de violência. Tivemos um tempo neste país, onde se acendeu uma esperança de tempos melhores. Mas quando a gente consegui conquistar quase nada, o mínimo do direito à sobrevivência, tivemos um golpe que naquele momento parecia ter afundado esse sonho”, observa.
Porém, concordando com Paulo Freire, Mayara considera que luta é verbo e a articulação das classes populares nos permite “esperançar” realidades outras, muito mais igualitárias porque diversas. Assim, avalia que o resultado que saiu das urnas no pleito de 2022, responsável por conceder vitória a Luiz Inácio Lula da Silva (PT), permite mudanças de ventos face aos tempos sombrios, que vivemos com a chegada da extrema-direita ao Palácio do Planalto, em 2018. Conjuntura que, de acordo com ela, traz o imperativo: compreendê-la para que não se repita.
“E estamos aqui para reconstruir a democracia, os direitos básicos de uma vida com dignidade. Falar sobre isso construir uma linha temporal nos ajuda a entender a construção histórica e nos dar uma percepção melhor e mais completa sobre o “porquê das coisas”, pondera.
Em diálogo com Carolina Maria de Jesus, também mulher negra, catadora de materiais recicláveis e escritora, a docente avalia que a possibilidade de juntar as letras rompe com as lógicas de dominação machistas e racistas que também permeiam a linguagem:
“Escrevo a miséria e a vida infausta dos favelados […] meu sonho era escrever e o pobre não pode ter ideal nobre. Eu sabia que ia angariar inimigos, porque ninguém está habituado a esse tipo de literatura. Seja o que Deus quiser. Eu escrevi a realidade”, disse Carolina.
“Ocupando um espaço que historicamente teve sempre nas mãos de uma população privilegiada. Vamos escrever nossas pressões do mundo da política sob a ótica do chão da fábrica. Se você pudesse me ouvir agora, no fundo teria alguns chamados, “mãeee” mãeee”. A motivação mora em ver esses lugares como uma das frentes de luta para uma sociedade mais justa, feminista, antirracista e livre de qualquer opressão e violência”, complementa Mayara.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.