Promovido pela Frente Antirracista de Londrina no dia 13 de maio, evento reuniu movimentos sociais, coletivos e militantes para abordar a falsa abolição
Em um longo evento no último sábado, 13 de maio, a Frente Antirracista de Londrina reuniu diversos movimentos sociais, coletivos e militantes da causa do povo negro para um debate sobre a falsa abolição. A data marca a assinatura da Lei Áurea, que em 1988, em tese, pôs fim à escravização no Brasil. Na prática, porém, não foi o que ocorreu.
“A gente escolheu esta data para que pudéssemos falar sobre o 13 de maio, que não nos contempla”, explica Natália Lisboa, presidenta da Frente Antirracista. Welisson Vieira de Aguiar, presidente do CMPIR, diz que “muitas vezes as pessoas avaliam a princesa Isabel, que assinou a Lei Áurea, como heroína e sabemos que não é. Houve pressão dos movimentos abolicionistas pela assinatura da lei, mas não houve nenhuma política pública para que aqueles aproximadamente 700 mil negros acessassem direitos”, ressalta.
Participaram do evento representantes do Movimento Negro Unificado, das religiões de matriz africana, do Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial (CMPIR), do Centro de Direitos Humanos (CDH), da APP-Sindicato; a vereadora Lenir de Assis, do Partido dos Trabalhadores (PT), integrantes do Partido Socialismo e Liberdade (Psol), do PT Solidário; professores da Universidade Estadual de Londrina (UEL), representante do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros da UEL (Neab), e membros da sociedade civil.
A gestora de Promoção da Igualdade Racial no município, Fátima Beraldo, acompanhou todo o evento, que aconteceu na sede da prefeitura. O prefeito, Marcelo Belinati, também passou pelo local. Houve apresentações artísticas do casal Wagner Nogueira e Ângela Maria e do Coletivo Máfia, que reúne mulheres negras do hip hop.
Presença aguardada, o deputado estadual Renato Freitas (PT) chegou ao local por volta das 19h, após extensa agenda na cidade. O parlamentar participou de roda de conversa na qual expôs sua visão sobre a emancipação do povo negro. Para isso, fez um resgate histórico de como os negros foram excluídos da participação social.
“O que me importa não é o 13 de maio, mas o dia posterior, 14 de maio. Falar de abolição de que forma, se não havia reforma agraria; se não havia acesso a educação; se não havia alguém disposto a pagar pela mão-de-obra; se estar na rua era considerado vadiagem?”, questionou o deputado.
Renato havia cumprido agenda no Jardim União da Vitória, zona Sul de Londrina, onde muitas famílias vivem em condições precárias. “Lá tem mais negros que em outros bairros perto da universidade”, constatou. Para o parlamentar, os negros foram “lançados nesta condição” de exclusão de acesso a políticas básicas, como moradia e educação, após a abolição.
Beatriz Batista Silva, do Movimento Negro Unificado, citou Yá Mukumby como um exemplo de ativista que debatia a pauta negra com todos os seus atravessamentos e opressões, lutando também por acesso a saúde e educação.
“Apesar de termos conquistado algumas coisas, quando vemos casos de violências do Estado, por exemplo, lembramos que a escravidão não acabou, ela foi ressignificada. Houve abolição, mas a população não pode acessar a vida em sociedade. Foi estabelecido um projeto de nação europeizado, então o preto tinha que ser apagado em todas as esferas. A maior política de estado que vai chegar na população negra é a segurança pública. Vai chegar a polícia, a cadeia”, ressalta a cientista social.
“Tem que pensar as outras frentes, da educação, da saúde. As pessoas pretas precisam estar presentes nesse processo (de pensar a pauta étnico racial na cidade). Nem mesmo a pessoa negra que tem um título de parlamentar está isenta de sofrer racismo”, lembra ela, referindo-se ao mais recente caso de racismo vivenciado por Renato Freitas no aeroporto de Foz do Iguaçu.
Robson Arantes Ogumsola, do coletivo Aweto de lideranças de religiões de matriz africana, entoou o canto Rei Zumbi dos Palmares, de Mestre Moraes, que questiona a falácia da abolição, e acrescentou: “Toda casa de Candomblé, todo terreiro, é um quilombo”.
Deputado aponta formas de emancipação
O deputado Renato Freitas elenca três pontos prioritários de luta para a população negra: reforma agrária, desmilitarização das polícias, das escolas e da mídia e acesso à educação.
“Se o perfil dos jovens que morrem hoje no Brasil é exclusivamente pobres, majoritariamente negros, moradores de periferias e com ensino fundamental incompleto e esse também é o perfil de quem está preso, é contraditório. Se eu estou dizendo que a juventude negra é vítima dos homicídios, porque é ela que está sendo presa?”, questiona.
Para Renato, quando estado condena à prisão um jovem de 20 anos está depondo contra si próprio.
“Aquele jovem é testemunha de um crime. A Constituição diz que é dever do estado, da família e da sociedade garantir os direitos fundamentais das crianças e adolescentes. Se aquele jovem tem o ensino fundamental incompleto, de quem é a culpa? Se a família não teve condições é porque estava desestruturada”, declara.
Sendo assim, ter o ensino fundamental completo amplia os horizontes de possibilidades e de vida da população negra e periférica. “A educação ainda é o único meio de mobilidade social no Brasil”, acredita o parlamentar.
O deputado também defendeu a aprovação de leis que garantam a instalação de câmeras corporais nos uniformes dos policiais militares do Paraná e GPS nas viaturas como forma de frear as mortes causadas pelas forças de segurança, que somaram 488 no ano passado.
Fonte: Rede Lume