Cinco escolas já foram afetadas somente em 2023. Decisão considera, sobretudo, frequência de alunos – taxa que modula cálculo do Ideb
Cleuza Milani Del Forno descobriu por conta própria, na última segunda-feira (22), que havia sido afastada do cargo de diretora do Colégio Estadual Professor Edimar Wright, em Almirante Tamandaré, na região metropolitana de Curitiba. A revelação veio por acaso, enquanto analisava no sistema on-line do governo do Paraná novas peças de um processo administrativo pelo qual responde desde abril do ano passado, baseado em novos parâmetros de metas implementados pela Secretaria de Estado da Educação (Seed). Assim como ela, desde o começo de 2023 outras quatro equipes de escolas estaduais foram destituídas dos postos para os quais foram eleitos – em média, um desligamento por mês, afirma a APP Sindicato, entidade que representa os professores da rede.
As novas regras aplicadas pela Seed deram mais poder à pasta para destituir diretores. Elas observam, sobretudo, o cumprimento de requisitos incluídos nos cálculos do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), para o qual a educação paranaense se voltou desde o início da gestão de Ratinho Jr., com impactos à legislação vigente.
Em outubro de 2020, a maioria governista da Assembleia Legislativa (Alep) deu aval ao governo para alterar a lei que estabelece os critérios de escolha e permanência dos diretores na rede estadual. O texto de 2015 já previa afastamento em casos de insuficiência de desempenho da gestão administrativa-financeira, pedagógica ou democrática, mas o processo de desligamento tinha mais amplitude: precisava partir do conselho escolar e ser aprovado pela comunidade escolar, por maioria absoluta, em votação convocada a partir de requerimento com no mínimo um terço de assinaturas do estabelecimento de ensino. Com a mudança, a própria Seed ganhou prerrogativa de propor a saída de diretores, e a validação do afastamento, ao invés de passar por debate na comunidade, agora é restrita à aprovação de uma comissão paritária, constituída por dois membros do Conselho Escolar e outros dois membros da secretaria.
No ano passado, as atribuições dos gestores escolares passaram por novo pente-fino. Resolução de número 7.123 assinada pelo então secretário da pasta, Renato Feder, reformulou os processos disciplinares das comissões de apuração e paritárias, encurtando os prazos de decisões, e fixou metas que diretores obrigatoriamente precisam cumprir para permanecer no cargo. Ficou estabelecido, por exemplo, que é de competência da equipe garantir frequência mínima de 85%, sendo índices abaixo desse patamar já suficientes para iniciar processos possíveis de chegar à exoneração.
Segundo a APP sindicato, destituições calçadas na falta de cumprimento de metas – principalmente a de comparecimento – já atingiram cinco escolas do estado desde janeiro. Foram removidos as equipes diretivas dos colégios estaduais Visconde de Guarapuava, em Guarapuava; e Bento Munhoz da Rocha Neto e Antonio Lacerda Braga, em Colombo. Nesses casos, a lei prevê que quando diretores e diretores auxiliares são afastados, “caberá à Seed indicar o substituto”. Em Almirante Tamandaré, as regras já haviam sido aplicadas no Colégio Vereador Pedro Piekas, onde o gestor auxiliar permaneceu.
Na escola Professor Edimar Wright, em Almirante Tamandaré, Del Forno permanece oficialmente no cargo porque a exoneração dela e de seu vice ainda não foi publicada no Diário Oficial. Até a tarde desta terça (23), eles ainda não haviam sido comunicados de fato da decisão assinada pelo secretário Roni Miranda. Depois de questionar o despacho, segundo informou a diretora, a pasta trancou o acesso dela ao sistema virtual de consultas a processos internos do governo, o E-Protocolo – tudo indica que o documento de exoneração deveria ter permanecido sob sigilo no sistema.
“No processo, o que eles alegam é que eu não participava de determinadas reuniões e não cumpria as metas determinadas, principalmente os índices. Nem de longe os índices do Edimar são os piores do município, ao contrário, é uma escola muito bem vista, tem o maior número de estudantes, mesmo não tendo a maior estrutura, e tem gente saindo pela janela”, defende Del Forno, docente de matemática há 27 anos na escola e eleita diretora, na última consulta à comunidade escolar, com mais de 95% dos votos.
Segundo a professora, a Comissão também teria levado em conta o baixo índice de acesso dos alunos às plataformas Inglês Paraná e Redação Paraná, ferramentas complementares de ensino implementadas por Ratinho Jr. “O que para mim é difícil entender, e isso eu justifiquei a eles, é como eu vou garantir o acesso com apenas 20 computadores para todos esses alunos na escola. Até ano passado eram apenas 20, este ano já são 40, mas é um fator que parece não ter sido avaliado”.
O portal da Seed indica atualmente um total de 1.317 matrículas Colégio Estadual Professor Edimar Wright. É o maior em números de alunos em comparação com outras escolas da rede no município, conforme levantamento da pasta. Parte desses alunos começaram a se manifestar contra o a determinação da Secretaria da Educação. Nesta terça e quarta-feira, houve protestos em frente ao estabelecimento, e pais já foram chamados a participaram de uma reunião de esclarecimento.
Em nota, a Seed confirma que a destituição foi por falta de cumprimento às metas estabelecidas em lei. “Neste caso foram observadas algumas insuficiências como a falta de observação de sala de aula com o propósito de apoiar os professores e pedagogos, de propiciar instrumentos para manter a frequência elevada, retirada de documentos oficiais do âmbito escolar, entre outras questões”, justificou a secretaria. “Após a apuração prévia para início do processo pelo NRE da Área Metropolitana Norte, uma comissão paritária constituída por membros do conselho escolar e da Seed-PR ouviu testemunhas e analisou as provas, sempre observados os princípios da ampla defesa e do contraditório, para então tomar a decisão”.
Por outro lado, o que a APP Sindicato alega é que não existe coerência na aplicação dos novos parâmetros estabelecidos. “Se for levar a ferro e fogo o que diz a resolução, não há cumprimento por todas as direções. Eles teriam, então, de substituir os diretores das duas mil e cem escolas que tem no Paraná hoje. São metas bastante absurdas”, avalia Élio da Silva, secretário de Finanças da entidade. “E estamos falando de um processo em que, se os diretores não cumprem as metas, não existe uma sindicância, um procedimento interno para avaliar, é uma comissão que a própria Seed conduz”.
Representantes da entidade estiveram reunidos na manhã desta quarta-feira com deputados estaduais para tratar da condição da equipe diretiva Edimar Wright. Houve encontro, inclusive, com o líder do governo na Assembleia, Hussein Bakri (PSD), que também preside a Comissão de Educação da Casa. A tentativa é fazer com que os parlamentares cobrem da Seed um posicionamento mais claro sobre as exonerações e que tentem intervir no afastamento, uma vez que ele ainda não foi publicado no Diário Oficial do estado – condição que passar a valer de fato a decisão.
“A gente sabe que a frequência é importante, mas há uma série de condições que precisam ser avaliadas em conjunto. São situações como vulnerabilidade social, de violência, de transporte e até mesmo fatores climáticos. Em dias muito frios, é comum a gente ter falta de alunos da manhã e da noite até mesmo por falta de agasalho. Isso precisa ser justificado, é justificado, mas na Comissão de Apuração passa a não ser válido”, afirma Silva.
Peso grande nas últimas decisões, a frequência mínima de alunos vem sendo tratada como estratégia crucial da pasta, que tem um setor próprio para acompanhar questões relacionadas – a coordenadoria de Frequência e Aprovação. “O foco da nossa atuação é na manutenção da frequência do aluno. É tomar todas as ações para que ele permaneça na escola, para que não venha a evadir, para mantê-lo estudando”, disse o coordenador do programa na Seed, Orivaldo Június Alexandre, em entrevista à Agência Estadual de Notícias em abril do ano passado.
Hoje, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) estipula uma frequência mínima de 75% no ano letivo para aprovação nas séries da educação básica (ensino fundamental e médio). Em alguns casos, como nas escolas cedidas à gestão da iniciativa privada, o governo do Paraná requer taxa de, no mínimo, 90%.
Em uma das frentes, a manutenção elevada do patamar ajuda o desempenho do estado no Ideb, exame que tem pautado as ações de educação no Paraná. Frequência e aprovação são fatores de cálculo do indicador, computado a partir do cruzamento da taxa de aprovação com o desempenho escolar dos estudantes – motivo pelo qual o comparecimento em sala de aula é tão importante.
Dentro desta política, escolas da rede passaram a ter os chamados “presençômetros”, quadros em que ficam expostas as taxas de comparecimento às aulas de cada turma.
Fonte: Jornal Plural