Projeto de Lei, que determina uso de câmeras em fardas e viaturas precisa de 80 mil assinaturas para ir ao plenário
Nesta quarta-feira (16), os coletivos “Justiça por Almas” e “Mães de Luto em Luta”, formados por familiares e amigos de vítimas das forças de segurança pública em Londrina, entregaram ao ministro dos Direitos Humanos e Cidadania, Silvio Almeida, dossiê que apresenta o cenário da letalidade policial na cidade. O responsável pela pasta estava em Curitiba para entrega de automóveis que serão repassados aos Conselhos Tutelares de 24 municípios paranaenses.
“Arriscamos ir até lá para falar com ele. Nós não tínhamos certeza se iríamos conseguir. Eu fiquei esperando com o dossiê na mão quando eu vi que ele estava vindo, o abordei e falei que era mãe de uma vítima de suposto confronto. Ele me recepcionou muito bem, foi muito educado, ouviu tudo que eu tinha para falar, pedi encarecidamente para ele ler o dossiê, dar uma atenção para todo o Paraná, principalmente, para Londrina, falei sobre as execuções que têm ocorrido em nossa cidade”, conta Hayda Melo, representante dos grupos e mãe de Willian Jones Faramilio da Silva Junior, um dos jovens assassinados pela Polícia Militar há um ano e três meses.
Ela explica que o documento traz relatos de famílias sobre os casos, contrapondo a versão dos agentes divulgada pela mídia hegemônica. Uma das principais finalidades, além do pedido de justiça, é conscientizar a população sobre os abusos. Ainda, segundo a liderança, jornalistas de veículos de comunicação independentes como Rede Lume de Jornalistas e Nova Democracia contribuíram para a criação do estudo.
Até o momento, o material aborda 27 assassinatos, mas há outros casos para serem agregados ao levantamento. “As famílias estão vencendo o medo e indo para a luta. É ruim, mas como estas vítimas existem, precisamos falar sobre elas”, observa.
Audiência Pública
Conforme informado pelo Portal Verdade, os movimentos estiveram na capital paranaense para participar da audiência pública “Letalidade policial e o uso de tecnologias na Segurança Pública”. O encontro, proposto pelo presidente da Comissão de Igualdade Racial, deputado Renato Freitas (PT), aconteceu na ALEP (Assembleia Legislativa do Paraná) na última quarta-feira (saiba mais aqui).
“A audiência pública em Curitiba foi muito boa, voltamos muito esperançosas que a gente vai conseguir nossos objetivos que são as câmeras corporais e nas viaturas, exames toxicológicos e GPS [Sistema Global de Posicionamento]. Esses são nossos focos, nossas maiores lutas”, avalia.
Luta continua
O uso de câmeras nos uniformes e veículos policiais em todos os municípios paranaenses é tema do Projeto de Lei nº 448, apresentado pelo deputado Tadeu Veneri (PT), em 2019, quando ocupava uma das cadeiras da ALEP. No final de 2022, após quatro anos engavetado, o projeto foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Com isso, a medida está apta para ser levada ao plenário.
A medida estabelece que os registros das gravações deverão ser arquivados pelo período de cinco anos para eventual uso em demandas judiciais e administrativas. O recurso pode proteger eventuais vítimas de abuso policial, como também ampara os próprios agentes em caso de dúvidas sobre a atuação.
“A gente precisa de um abaixo-assinado com 80 mil assinaturas no mínimo à mão, não tem como coletar digital, para gente fazer com que o projeto vá à votação, porque ele está parado desde 2019 na Assembleia. Agora, vamos correr atrás das assinaturas em Londrina e nas outras cidades também”, pontua.
Em 2022, levantamento do Gaeco (Grupo de Atuação de Combate ao Crime Organizado) identificou aumento de 17% no número de mortes decorrentes de intervenção policial no Paraná em comparação ao ano anterior. No total, foram registrados 488 assassinatos no estado.
Em Londrina, o crescimento foi ainda maior: 56%. Em 2021, foram contabilizadas 32 mortes, saltando para 50 em 2022. A maioria das vítimas é composta por jovens negros de até 29 anos (58%).
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.