A assistência à saúde está entre os mais emblemáticos dos direitos sociais. E, junto com a educação, entre os mais frágeis e vulneráveis a ataques.
Quando olhamos para trás, em perspectiva, é possível ver que cuidar da saúde da população como uma responsabilidade do estado é muito recente na história da saúde. A assistência médica no Brasil, antes do SUS, dependia apenas de atos individuais. Quem podia pagava, quem não podia ficava entregue à filantropia, dependendo de organizações caritativas, na maior parte ligada a organizações religiosas. A saúde pública, sob responsabilidade do estado ficava apenas no controle de epidemias.
Havia, apesar do apelo humanitário, uma precariedade absoluta. O atendimento à saúde era ato de caridade. Vale lembrar que as Santas Casas, pioneiras na assistência médica prestavam serviços “de misericórdia”.
O conceito de saúde ser um direito do cidadão e um dever do estado como reza o texto constitucional só se tornou possível a partir de 1988, com a nova constituição.
Os problemas, no entanto, apesar de a lei maior determinar a universalização do atendimento à saúde, crescem e a cada dia se descaracterizam mais. E. certamente o maior dos problemas é a falta de financiamento adequado.
Estamos reproduzindo na saúde os modelos típicos do Brasil que criam cidadãos de primeira e segunda classe. Uma bipartição econômica e social que reflete o abismo de renda. À população periférica e pobre dá-se a escola pública com professores mal pagos, estruturas precárias e para o andar de cima, escola particular paga. Na saúde, aos pobres UPAS e hospitais superlotados, com filas e outros dramas. Aos que podem, planos de saúde, ou atendimentos particulares em clínicas e hospitais melhores aparelhados e em alguns casos redes de hospitais de luxo, ligados aos fundos de investimento.
Retomar o SUS como um sistema universal de atendimento à saúde passa a ser um tema tão importante quanto a preservação da democracia no Brasil, hoje tão atacada. Aliás, esses dois troncos se embricam.
Não há democracia política se não houver acesso democrático à saúde. Democratizar a assistência à saúde significa destinar recursos fartos e equânimes, já que o SUS já cronicamente sub financiado ainda arca com quase todos os procedimentos de alto custo. Aqueles que os planos de saúde acabam não conseguindo atender.
A conferir.
Texto: Marco Antônio Fabiani, cardiologista