Prática de perseguição contínua e reiterada é o crime contra a mulher que mais cresce no país. Só em 2023, foram mais de 77 mil casos
Os números da violência no Brasil revelam um contexto preocupante quando se trata do crime de perseguição reiterada contra mulheres, o chamado stalking. De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 77.083 casos foram registrados em 2023, o que representa uma vítima a cada sete minutos.
Entre 2022 e o ano passado, o aumento foi de 34,5%, o que coloca o delito como o crime contra a mulher que mais cresce no país. Ele está à frente, por exemplo, de violência psicológica (33,8%), ameaça (16,5%), lesão corporal (9,8%), tentativa de homicídio (9,2%), tentativa de feminicídio (7,1%), estupro (5,2%) e outros.
O stalking acontece quando a pessoa é vítima de perseguição frequente, seja por meios virtuais ou físicos, e por isso vive com medo, sob constante ameaça e com a liberdade cerceada. Em geral, quem o pratica contra mulheres tende a ser ex-companheiros, ex-namorados ou pessoas que foram rejeitadas amorosamente.
Desde abril de 2021, com a sanção da chamada Lei do Stalking, essa conduta ganhou uma nova tipificação no Código Penal brasileiro. Até então, ela era enquadrada apenas como contravenção penal, com punição de 15 dias a dois meses de prisão.
Agora, a lei prevê pena de seis meses a dois anos de detenção e multa, podendo chegar a três anos quando o crime é praticado contra menores de 18 anos, idosos, mulheres, com participação de duas ou mais pessoas e emprego de arma.
Invasão de propriedade e até uso de bomba
Nos últimos dias, vários casos de stalking foram noticiados no Brasil. Há sete anos, a dona de um pet shop na cidade de Frutal (MG) enfrenta as perseguições e ameaças do ex-namorado. Apesar de ter conseguido medida protetiva para proibi-lo de se aproximar, o caso chegou ao limite na manhã de quinta-feira (1º/8).
O homem passou de carro em frente ao comércio da ex e arremessou um explosivo contra o local. De acordo com a investigação, a vítima e o stalker tiveram um relacionamento breve no passado e, após o término, ela se casou com outra pessoa. Desde então, o homem começou a persegui-la e ameaçá-la.
Na madrugada desse domingo (4/8), um homem invadiu o apartamento de uma mulher que ele havia conhecido em um aplicativo de relacionamento, em Brasília. O caso ocorreu no Sudoeste. Segundo a polícia, o suspeito é de São Paulo e conheceu a vítima há dois meses. Após um desentendimento entre os dois, ele decidiu invadir a casa dela.
Em Goiás, um homem foi preso nessa segunda-feira (5/8) por perseguir e ameaçar mulheres que expressaram apoio a um político do lado adversário. Mateus Manoel da Silva Souza foi preso preventivamente. Ele teria feito várias vítimas. Uma delas chegou a receber mais de 100 mensagens em um único dia.
“Stalking é o prenúncio de crimes mais graves”, diz criminalista
Para o advogado criminalista e pós-doutor em Democracia e Direitos Humanos Pedro Paulo de Medeiros, a aprovação e sanção da Lei do Stalking foi um avanço importante, mas a continuidade do aumento dos números, três anos depois, o leva a pensar que seriam necessárias outras medidas para combater esse tipo de crime.
“O stalking é o prenúncio de crimes mais graves. Ele é o primeiro degrau que leva para agressões, lesões mais sérias e até o homicídio contra mulheres. Combatê-lo é prevenir crimes mais graves”, diz ele.
Durante a votação do projeto no Congresso Nacional, em 2021, o relator no Senado, Rodrigo Cunha (Podemos-AL), chegou a citar dados que correspondem a essa visão do advogado. À época, pesquisas indicavam que 76% dos feminicídios foram precedidos por casos de stalking dos respectivos parceiros.
Pedro Paulo sugere que para conter o aumento dos casos, talvez, fosse necessário um trabalho maior de conscientização das pessoas e, até mesmo, o aumento da pena atribuída ao crime. “Uma característica é que a pena máxima é de dois anos, e pena máxima de dois anos não tem investigação, não instaura inquérito. É caso para Juizado Especial. Precisava ser mais do que isso”, aponta.
Como identificar e denunciar o stalking
Alguns aspectos do dia a dia ajudam a identificar quando uma pessoa está sendo vítima de stalking. Se ela muda a própria rotina, os horários ou até de endereço para fugir das investidas do criminoso, é porque tem algo de errado.
Além disso, o sentimento de medo é constante. Se a pessoa tem medo de sair de casa, muda as rotas no trânsito para chegar aos lugares ou troca o número de telefone, ela também pode estar sendo vítima de perseguição.
Do ponto de vista do criminoso, algumas atitudes que configuram stalking são:
- ligações constantes e envio insistente de mensagens;
- rondas à casa da vítima;
- envio de presentes inesperados;
- frequentar locais nos mesmos horários da vítima;
- e tentativas de invasão a dispositivos eletrônicos.
Para denunciar o crime, a pessoa precisa procurar uma delegacia e registrar um boletim de ocorrência. Uma dica importante é juntar provas, como prints, mensagens, números de telefone, perfis utilizados pelo criminoso nas redes sociais, áudios, vídeos, testemunhas e outros.
Fonte: Metrópoles