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Espere pela primavera Bandini…

É a primeira obra publicada daquele que, pela minha lente, é o grande escritor estadunidense do século XX – John Fante.  Fante (um ítalo americano) criou um personagem (seu alter ego Arturo Bandini) que permeia sua construção literária e, através dele, retrata um país recém-saído da grande depressão em polo de convívio com a luta pela sobrevivência.

A história (ou as histórias) de Bandini não são senão desventuras em série que todo escritor jovem enfrenta em sua busca pelo santo Graal da felicidade (viver de suas construções de nanquim) enquanto observa e descortina a sociedade. Assim o colorido da vida antagoniza o cinza dos instantes de dificuldade e os desenhos da existência abraçam e redimem a dura realidade.

Lembro de Fante sempre que procuro beleza na vida e, não por acaso, através dele venho enfrentando toda sentença que se anuncia bruta, suposto que sua arte me puxa pela manga, impedido executá-las – afinal, pode o coração, com o passar das horas, perdoar (o que seria bom) e o perdão não teria um significado e sim uma consequência. Assim é que Fante vem, ao longo de minha vida, ressignificando e redimindo meus passos.

Demais disso, é ele o autor da obra prima da literatura estadunidense na primeira metade do século vinte – Ask the Dust (Pergunte ao Pó). Lembrei de Fante, todavia, ouvindo moro depor no Tribunal Regional Eleitoral do Paraná e não por conta de seus notórios erros de português – como cobrar de quem gosta de ler biografias e nem se lembra da última que leu, uma articulação mínima com palavras e ideias?

Minha lembrança abraça a tragédia que moro vem encenando após ser desnudado em suas maquinações (Vaza Jato) aviltantes do estado democrático de direito. Vê-lo enfrentando o sistema que usou e corrompeu (pelo viés do devido processo) equivale a uma construção filosófica onde as filigranas de um mundo imperfeito acabam por afastar homens maus de circunstâncias de protagonismo.

Essa grandiosa metáfora não é senão o doce da vida ou o sal da terra (escolham vocês!), e nossa condição humana depende cada vez mais de identificar e afastar de qualquer protagonismo, todo algoz da humanidade – feito moro e os fascistas que o aplaudem.

Tive pena de moro, todavia. Da ignorância dele, da arrogância dele – enfim, das coisas de sempre que me davam asco. Mas desta vez me apiedei. Acho que a solidão do cadafalso (político) entorpeceu-me os sentidos em tempo de desafiar meu melhor eu. Então e assim, o sentimento que aflorou foi de pena.

Sigo achando dele tudo que sempre escrevi. Sustento cada crítica com mais ênfase ainda, notadamente após entendê-lo coveiro da própria cova. Não quero aqui mudar o tom, deslembrando que sempre estive contra ele, combatendo o que ele significa – juiz ativista, de extrema direita, que usou o devido processo, usurpando a jurisdição (que deveria ser isenta) em causa própria.

Passou que a solidão do processo (eleitoral) apontou para a areia da história, disparando a ampulheta do tempo e desafiando um encontro com o destino, sob o lume de um entendimento ancestral, onde a humanidade se põe diante de um modelo execrável de protagonista: o que persegue os adversários ideológicos com a letra da lei que – lawfaire!

O cidadão moro é, pois, o reflexo do ex-juiz sérgio moro: um totalitário a serviço do próprio interesse. Nesse contexto, será tragado pela história, onde tem um encontro marcado com o destino. Deveras e à par o sentimento de pena, na medida em que sigo sendo um libertário garantista (desde sempre), averbo minha gratidão à vida que me presenteou com o sal da alegria, batizado em Parque São Jorge – o que me faz amar e sonhar sempre que a vida balança do lado errado.

Noves fora foi a sabença da sombra me deu de conhecer a beleza da luz e, nesse entorno, assumo que a dificuldade alheia jamais me seduziu. Assim, se moro irá responder e pagar por seus muitos crimes contra o devido processo é uma questão outra e não é disso que este pequeno texto trata – até porque a elite branca que moro representa não é punida, historicamente, no Brasil.

Trato aqui da ironia existencial fina que se revela ao ver moro se agarrar, feito afogado à tábua encontrada em mar de tormenta, no enfrentamento de sua narrativa, onde confronta a acusação que se lhe promove a Justiça eleitoral parnanguara, com a expiação de uma traição social de que seria vítima, notadamente por ter ‘enfrentado o poder’.

Nem o Bardo de todos os bardos teria ido tão longe. Ao se vitimizar moro cria uma personagem que jamais existiu (o paladino defensor do estado de direito) buscando na miséria existencial que articula (vítima do enfrentamento do poder) criar um qualquer estado de coisas que lhe favoreça.

Seria cômico não fosse trágico – mas é a cara de moro, que sempre tratou seus jurisdicionados em conformidade com um qualquer interesse pessoal. Para o bem e para o mal.

O que sobreviverá à sentença da cassação do mandato de moro, caso esta seja dita, faz lembrar uma passagem que guarda a conduta, quando o Cristo diz ‘atira a primeira pedra quem nunca pecou’. Enquanto juiz, moro sempre deu a impressão que sua mão guardava a cor do tijolo atirado, na exacerbada confiança que sua arrogância existencial sugeria.

O mundo dá voltas e nas voltas que a vida dá, todavia, moro passou (muito rapidamente) de feroz e sanguíneo atirador de tijolos à vidraça que se espedaça ante a força dos arremessos com os quais a vida nos golpeia.      

A régua moral fascista de moro não guarda qualquer empatia pela vida e, com esse entendimento, ele se auto golpeou. Esperar empatia de quem lhe julga seria um caminho?

Tivesse um fundo musical este texto, estaríamos ouvindo a imortal Balada para um Locco de Piazzolla, na parte em que o cantante diz que as pessoas olham e não o enxergam.

Após ser desnudado, todo mundo enxerga moro e sabe quem ele de fato é.

Haverá espaço para acomodar, em nome do devido processo, seu mais letal agressor?

Espero que não!

Tristes e esperançosos trópicos.

João dos Santos Gomes Filho para o Canto do Locco

João Locco
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João dos Santos Gomes Filho, mais conhecido pelo apelido João Locco. Advogado, corintiano, com interesse extraordinário em conhecer mais a alma e menos a calma.

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