Decisão do Cepe em manter atividades não essenciais diverge de greves anteriores
Em assembleia realizada nesta terça-feira (23), professores da Universidade Estadual de Londrina (UEL) repudiaram a suspensão do calendário dos cursos de graduação com excepcionalidades. A determinação foi tomada pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe) em reunião na última sexta-feira (19) a partir de pedido do Sindiprol/Aduel, coletivo que representa docentes da UEL e Universidade Estadual do Norte do Paraná (Uenp).
Resolução nº 034/2023 do Cepe (disponível aqui) estabelece que atividades envolvendo estudantes dos últimos anos bem como as de mobilidade estudantil nacional e internacional e os serviços prestados pelos alunos de Direito no Escritório de Aplicação de Assuntos Jurídicos (EAAJ) devem ser mantidas. Ainda, de acordo com o órgão, os calendários da pós-graduação stricto (mestrado e doutorado) e lato sensu (especialização e residência) também seguem em andamento após votação.
Eliel Machado, professor de Ciência Política e diretor de Comunicação do Sindiprol/Aduel, destaca que a categoria discorda da suspensão parcial e reforça a preocupação com consequências que as ressalvas podem trazer, comprometendo o direito de adesão à greve, sobretudo, aos educadores com vínculo temporário, submetidos a condições ainda mais precarizadas de trabalho.
“Nós repudiamos o modo como foi feito, a suspensão apenas parcial. Achamos, inclusive, que pode resultar em assédio aos professores, principalmente, os temporários que se veem obrigados pelas administrações superiores ou mais imediatas como Colegiados, chefias de Departamento, a terem que ministrarem aulas, darem provas, montar bancas de TCC [Trabalho de Conclusão de Curso]”, pontua.
O docente salienta que excepcionalidades, a exemplo de serviços que se interrompidos colocam em risco a vida humana e animal, já estão contempladas pela Comissão de Ética do Comando de Greve. “Por isso que não dá para suspender atividades do HU [Hospital Universitário], Pronto Socorro. As aulas não entram como excepcionalidades, menos ainda, bancas de TCC. A gente viu de muita forma muito negativa esta decisão que o Cepe tomou”, observa.
Machado explica que a greve – instrumento legítimo de manifestação dos trabalhadores, garantida pelo Artigo 9º da Constituição Federal de 1988 – é realizada mesmo face a posicionamentos de órgãos gestores que contrariem o movimento.
Ainda, segundo ele, a solicitação para suspensão do calendário visa respaldar os estudantes a fim de que eles não sejam constrangidos a comparecer a Universidade, visto que com a interrupção das aulas, a acessibilidade ao campus é comprometida. Vans que trazem discentes oriundos de cidades da região deixam de correr, por exemplo.
“Nós fazemos greve independente de suspensão de calendário. Houve uma solicitação para suspensão dos dois calendários para proteção dos estudantes para que eles não sejam prejudicados até porque a gente repõe aulas depois e, portanto, minimiza os prejuízos, sempre fizemos isso, é histórico”, indica.
O sindicalista também assinala que a decisão da administração universitária destoa do encaminhamento realizado em greves anteriores. “As Câmaras avaliaram, o Cepe referenciou e acabou suspendendo de uma maneira não usual, não foi feito assim na greve de 2019 e nem anteriores, esta suspensão parcial. De qualquer maneira, a greve continua. Aulas, demais atividades que se referem ao ensino estão suspensas e retornam quando a gente suspender a greve e voltarmos ao trabalho”, afirma.
Avaliação do movimento grevista
Nesta segunda-feira (22), a greve completou duas semanas. Desde o dia 8 de maio, docentes da UEL paralisaram as aulas e demais atividades acadêmicas. A mobilização foi acompanhada pelas demais universidades estaduais do Paraná.
Os professores reivindicam o pagamento da data-base. Estabelecida juntamente com a Consolidação das Leis de Trabalho (CLT) em 1943, a data-base de uma categoria profissional corresponde ao período destinado à correção salarial, e encaminhamento de discussões para melhoria das condições de trabalho bem como ampliação de direitos e benefícios.
A defasagem salarial enfrentada pelo funcionalismo público chega a 42%. Sem reajuste desde 2016, servidores estaduais perdem, em média, cinco salários por ano. No final de março, Ratinho Júnior (PSD) anunciou reajuste geral de 5,79% para cerca de 271 mil servidores ativos e inativos no estado. A porcentagem considera a inflação acumulada nos últimos 12 meses. A declaração causou espanto e revolta, já que não foi previamente discutida. Além disso, a taxa informada é sete vezes inferior a atual dívida do Palácio do Iguaçu com os trabalhadores.
“Nós iniciamos a greve sozinhos, na semana seguinte se juntaram praticamente mais seis universidades, então, se formos fazer uma avaliação retrospectiva, desde o dia 8, podemos dizer que ela vem um crescente, está cada vez mais forte e tende a ficar ainda mais em função da intransigência do governo Ratinho Júnior em não reconhecer o movimento, a pauta de reivindicações e não se dispor a abrir uma mesa de negociações. A adesão está bastante grande, porque a indignação também é muito grande, sete anos sem reposição, quase metade do salário corroído”, adverte Machado.
Sem diálogo
Nesta quinta-feira (25), docentes da UEL voltam a se reunir para nova assembleia. O encontro acontece no Anfiteatro Cyro Grossi, no Centro de Ciências Biológicas (CCB) a partir das 13h30, com segunda chamada às 14h. Compõem a pauta: 1) informes e avaliação da greve e 2) Definição de estratégias de intensificação da greve.
“Neste momento, estamos em um processo de reconhecer o movimento de greve exatamente para forçar uma negociação, mas a intransigência e autoritarismo do governo são enormes e, portanto, não tem disposição, apesar dos esforços. Toda semana estamos indo para Curitiba, conversando com a base do governo, aliados, os principais interlocutores para sensibilizar o governo no sentido de abrir uma mesa de negociação, nos ouvir e apresentar uma contraproposta porque a forma como estamos sendo tratados não tem o mínimo de civilidade e o menor sentido”, acrescenta o professor.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.