O Capitalismo Financeiro Parasitário é quem manda no mundo, por enquanto.
É muito comum ouvir que quem manda no mundo são os Estados Unidos, por ser a nação mais rica e mais poderosa, tanto economicamente quanto pelo poderio militar, que tem sido apresentado nas guerras dos últimos 30 anos.
Se esse mandar foi um dia uma realidade, hoje é colocado em dúvida! Primeiramente, é preciso deixar claro que quem manda no mundo, por enquanto, é o Capitalismo Financeiro, que tomou forma a partir dos anos de 1970 com o processo de globalização e seu braço direito, o neoliberalismo.
Foram as mudanças tecnológicas, oriundas da terceira revolução industrial, que trouxeram inovações como o avião à jato, os grandes navios de containers, o sistema de comunicação via satélite e a revolução da informação como um todo, que propiciaram uma nova liberdade para o capital, que conseguiu assim se soltar das amarras que ainda havia perante o Estado Nação, fruto ainda de uma fase keynesiana e fordista. A partir daí, uma nova fase do capitalismo passa a ser delineada, com um capital que se desprende facilmente do território e consegue se reterritorializar em outros espaços, quase sempre aqueles que garantem maior acumulação, visando sempre a leis brandas, concessões estatais generosas e, principalmente, mão de obra barata. É isso que fez com a China se transformasse num excelente lócus de investimento. Temos aqui mais um paradoxo do capitalismo: aumentar seus lucros utilizando-se das
características de um país dito “comunista”.
Esta nova fase do capitalismo se tornou o que pode ser denominado de Capitalismo Financeiro Parasitário, por não se interessar mais pela produção de bens materiais e geração de empregos, como outrora; hoje, seu foco está muito mais direcionado à reprodução do dinheiro por si mesmo via mecanismos do mercado financeiro. Um dinheiro que, aos poucos, começa a perder valor, já que o que dá valor ao dinheiro é a produção material da economia e não a reprodução da moeda. No caso dos Estados Unidos, isso ainda lhe dá um certo fôlego para a sua economia, por possuírem a máquina de fazer dólar e por exigirem, desde o acordo de Breton Woods, que o mundo utilize essa moeda em suas
transações. O dólar é ainda o que dá um certo poder à hegemonia americana e é por isso que Saddam Hussein foi cassado, quando ousou iniciar negociações de petróleo em euro e não em dólar. Deu no que deu, sua cabeça foi exibida para o mundo, uma cena bárbara de um capitalismo decadente, para que ninguém mais ousasse fazer aquilo!
Mas o tempo passa e fica cada vez mais impossível construir algo em alicerces podres, que é o que sustenta grande parte do sistema financeiro, este mesmo que manda no mundo! É ele que elege o presidente dos Estados Unidos, podendo ser republicano ou democrata, inclusive, por financiar as duas campanhas, ou seja, ele sempre vence! E é esse poder que procura, de toda forma, manter a acumulação via espoliação (termo do geógrafo David Harvey) para assim continuar a garantir uma taxa de rentabilidade ”adequada” para a cúpula do sistema, por meio de mecanismos como a ação das multinacionais e pelo sistema da dívida pública, orquestrado mundialmente pelo BIS, uma espécie de banco central dos bancos centrais, que garantem essa extração de rentabilidade para o setor financeiro em âmbito internacional, inclusive, garantindo a presença de presidentes de Bancos Centrais, manipulados, que defendem, a qualquer custo, altas taxas de juros, que só beneficiam este setor. Também pelos processos de privatizações que se apropriam de ativos de vários países a preços módicos e pelas guerras que garantem o poder econômico e geram lucros imensos para a indústria de armamentos americana.
A grande questão é que todo esse poder passou, nos últimos anos, a ser afrontado pela ascensão da Rússia e da China, que se recusam a fazer parte desse sistema, pois sabem que o que ele realmente causa é um retrocesso no desenvolvimento do país, com uma desigualdade crescente que gera uma classe bilionária, conivente com o parasitismo e o empobrecimento do restante da nação.
Como reação a essa afronta, e pela necessidade de uma nova guerra, já que foram escorraçados da Síria e do Afeganistão, os EUA incitaram, orquestradamente, a entrada da Ucrânia na OTAN, pois sabiam que a Rússia como resposta, iria invadir a Ucrânia. Dessa forma, trazer a Rússia para uma guerra, comprometendo assim seu desenvolvimento econômico e gerando uma desestabilização, inclusive, com as sanções econômicas recorrentes dessa invasão. O resultado é que a Rússia, mesmo em guerra, se apresenta hoje como uma das nações mais estabilizadas economicamente na Europa. Esta, por sua
vez, vem sendo o continente mais atingido economicamente pelo aumento do custo da energia, que era importado da Rússia, e pela consequente inflação que tomas os países europeus.
Rússia e China estão mais unidas do que nunca! Não vão voltar atrás e continuar submissas a um capitalismo financeiro parasitário. Passam agora, juntas, a dar as cartas num futuro mundo multipolar alicerçado nos investimentos em infraestrutura nos países do sul, com a factual e já existente “Nova Rota da Seda”.
Isso nos mostra que esta guerra não deve acabar por enquanto, já que o capitalismo financeiro ainda aposta numa reação da Ucrânia mesmo sabendo que ela vem sendo arrasada. A entrada da Finlândia na Otan só acirra o conflito! A Rússia não vai recuar enquanto seus objetivos não forem alcançados, ainda
mais porque está ganhando a guerra, só a mídia corporativa ocidental, funcionária do capitalismo financeiro, não quer ver isso!
Esta guerra, na verdade, é um embate entre o Capitalismo Financeiro Parasitário, que também manda nos EUA, e um Capitalismo produtivo comandado pela China e Rússia. Nenhum dos lados vai abrir mão, pois sabem que, se assim fizerem, será o início de sua derrocada. É por esta razão que planos de paz como do Presidente Lula estão fadados a não serem aceitos, pois não interessa, por enquanto, a nenhum dos lados. Resta saber até quando a Ucrânia vai conseguir se manter em pé.
Fábio da Cunha
Professor Dr. Fábio César Alves da Cunha é geógrafo e docente associado do Departamento de Geografia da Universidade Estadual de Londrina UEL. Possui mestrado em Planejamento Ambiental (UNESP), Doutorado em Desenvolvimento Regional (UNESP) e Pós-Doutorado em Metropolização pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Trabalha com geografia urbana e regional, planejamento urbano e ambiental, geopolítica e metropolização.