Protestos iniciaram em julho. Nesta segunda-feira (21), audiência pública ocorre na Câmara Municipal
Neste último fim de semana, diversas regiões da cidade registraram manifestações contra o Projeto de Lei (PL) nº 203/2021. Proposto pelo vereador Fernando Madureira (PP), o “Programa Vida Saudável”, estabelece que, a partir de parcerias com a Prefeitura Municipal de Londrina, associações não governamentais podem ficar responsáveis pela manutenção de quadras, campos esportivos, ginásios, praças, entre outros espaços públicos destinados ao esporte, lazer e cultura.
A medida possibilita, inclusive, a cobrança de taxas para uso destes ambientes. Conforme informado pelo Portal Verdade, a mudança tem provocado grande descontentamento da população que tem alertado para a privatização dos espaços públicos.
Laurito Porto de Lira Filho, secretário de Formação do Sindicato dos Bancários de Londrina e Região e membro do Coletivo de Sindicatos de Londrina, explica que a principal reivindicação é a não aprovação do PL que promove o aprofundamento das desigualdades sociais. Ainda, de acordo com ele, a proposta tem vício de iniciativa, pois já existe lei municipal aprovada em 2018 sobre o tema, que é a cessão de espaço público.
“A possibilidade do cessionário poder fechar os espaços públicos e cobrar pela utilização do espaço é o principal problema. Isso é um instrumento de exclusão social, fere o direito de ir e vir, além de obrigar as pessoas de forma indireta criando um vínculo associativo a alguma entidade através de uma possível cobrança mensalidade ou taxa para o uso dos espaços”, acrescenta o sindicalista.
“Vamos cobrar de quem se já estamos fazendo um esporte que é inclusivo, social, para estimular a população a participar do esporte e da cultura? Como vamos cobrar destas pessoas? E como manter esta estrutura, esse bem público?”, observa Maria Giselda, de Lima Fonseca, representante da Comissão de Esportes do Centro de Direitos Humanos e da Associação Amigos da Bocha Sul-Americana de Londrina.
Para ela, a Prefeitura e Câmara Municipal de Londrina querem repassar atribuição que é dever do estado para as entidades. “Nós não vamos assumir porque não temos condição financeira, este é problema. Cuidar como temos feito, limpando o espaço, convidando a população a participar, isso fazemos de graça. Nossa briga é para não assumir o papel do estado. Não tem um espaço onde se possa recolher dinheiro”, reforça.
Desde o início de julho, quando o assunto voltou à pauta, mais de 20 coletivos da cidade estão se mobilizando para tentar barrar o avanço do PL que é considerado uma forma de negligenciar o acesso a direitos constitucionais, principalmente, para camadas mais economicamente mais vulneráveis (relembre aqui). Uma das mobilizações foi realizada no domingo (20) pelo Projeto Vista Bela em Movimento. O coletivo realizou o fechamento simbólico da praça do bairro, na zona Norte de Londrina.
Representantes de entidades como o Centro de Direitos Humanos e Associação Amigos da Bocha Sul-Americana de Londrina também amanheceram na manhã desta segunda-feira (21) com cartazes em frente às sedes dos poderes Executivo e Legislativo locais em protesto ao PL.
Os coletivos questionam o argumento do autor do PL de que não se trata de privatização. “Toda vez que você dá o direito à alguém de ficar com algo que pertence a todos como o espaço público, e esse alguém pode fazer as intervenções que julgar necessárias para realizar o projeto que se propõem e podendo cobrar sobre isso daquilo que era de graça para todos, isso é privatização. Podem tentar dosar a pílula mandando o nome mas na essência é uma privatização”, adverte Filho.
Os grupos também criaram abaixo-assinado contra a iniciativa. O documento disponível aqui salienta que o PL “retira dos cidadãos de Londrina a utilização dos espaços públicos da cidade os entregando para a iniciativa privada, também o poder de decidir quem poderá utilizar e quando poderá utilizar mediante o pagamento pecuniário de taxas”.
O PL prevê que 30% das vagas nas atividades ofertadas sejam reservadas a alunos beneficiados com programas de auxílio de renda federal, estadual ou municipal.
PL é aprovado com ampla maioria no primeiro turno
Em julho, o PL foi aprovado em primeiro turno pela Câmara Municipal de Londrina sob protesto dos coletivos que ocuparam as galerias da Casa. Dos 19 parlamentares, apenas cinco votaram contra: Lenir de Assis (PT), Lu Oliveira (PL), Mara Boca Aberta (Pros), Professora Flávia Cabral (PTB) e Roberto Fú (PDT). Os demais apoiaram o projeto que vem tramitando desde 2021.
Coletivos conseguem audiência pública
A partir da articulação dos coletivos, foi agendada audiência pública para esta segunda-feira (21) a partir das 19h na Câmara Municipal de Londrina para debater o PL. Para Filho, a reunião é importante, pois possibilita a discussão, inclusive, de posições contrárias, já que “o projeto vem sendo apresentado como a solução para os problemas da má conservação dos espaços públicos. E isso não é verdade as experiências em outras cidades como São Paulo e Curitiba mostram que esse problema não foi resolvido”, pontua.
A liderança destaca o exemplo do Vale do Anhagabau em São Paulo. “Foi totalmente alterado e virou um grande Boulevard. A empresa o transformou para melhor explorar o local comercialmente, nem árvores tem no local para proteger as pessoas do sol as pessoas que tem que transitar pelo local para chegar a outros pontos da cidade e acessar estações do metrô que ficam próximas à região, ou seja, o espaço foi privatizado para o melhor aproveitamento de quem recebeu a cessão e não foi pensado no bem estar de quem circula por lá ou pretende usar o local para o seu lazer ou prática esportiva”, diz.
Os interessados em participar da audiência no prédio da Câmara podem fazer o cadastro antecipadamente na aba “Cidadania” do site do Legislativo ou entrar no endereço através deste link.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.