Estudo nomeado “Servidoras e servidores públicos contra assédio e violência no trabalho: limites da estabilidade do mecanismo de proteção” identificou que apenas 12% dos acusados de assédio moral e 21% dos de assédio sexual são punidos.
Trata-se do mais abrangente estudo do gênero já feito no Brasil, com dados consolidados pelo governo federal, estados e Distrito Federal, entre 2022 e outubro de 2023.
Do total de denúncias, 82% foram classificadas como assédio moral e 18% como assédio sexual. Embora, os casos de assédio moral sejam majoritários, as penalidades são mais recorrentes face às ocorrências de assédio sexual.
De acordo com a investigação, entre as queixas de assédio moral, somente 12,3% das pessoas denunciadas recebem algum tipo de sanção como demissão que foi observada em 1,5% dos registros. Já entre casos de assédio sexual, apenas 21,3% dos denunciados sofreram algum tipo de penalidade, sendo que 9,4% foram desligados do cargo.
Ainda, o levantamento observou que quase metade dos governos estaduais não possui canais e protocolos específicos para atender servidores que se sentem assediados.
Dos 26 estados, 14 deles, além do Distrito Federal, têm legislações que tratam de assédio na administração pública. O assédio sexual foi regulamentado por cinco unidades federativas, em comparação ao assédio moral, que ocorreu nos 14.
Apenas dois estados definiram o conceito para assédio sexual (Amazonas e Rio Grande do Sul) e 12 descreveram o assédio moral (Acre, Ceará, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Tocantins, Rondônia, São Paulo e Sergipe).
Tipos de assédio
De acordo com Resolução nº 351 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), três modalidades de assédio são mais recorrentes nos ambientes corporativos:
Assédio moral: processo contínuo e reiterado de condutas abusivas que, independentemente de intencionalidade, atente contra a integridade, identidade e dignidade humana do trabalhador, por meio da degradação das relações socioprofissionais e do ambiente de trabalho, exigência de cumprimento de tarefas desnecessárias ou exorbitantes, discriminação, humilhação, constrangimento, isolamento, exclusão social, difamação ou abalo psicológico;
Assédio moral organizacional: processo contínuo de condutas abusivas amparado por estratégias organizacionais e/ou métodos gerenciais que visem a obter engajamento intensivo dos funcionários ou excluir aqueles que a instituição não deseja manter em seus quadros, por meio do desrespeito aos seus direitos fundamentais;
Assédio sexual: conduta de conotação sexual praticada contra a vontade de alguém, sob forma verbal, não verbal ou física, manifestada por palavras, gestos, contatos físicos ou outros meios, com o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afetar a sua dignidade ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador.
“A denúncia ainda é um caminho difícil, principalmente, porque estamos falando de situações de poder em que trabalhadores e chefias não possuem a mesma força. A necessidade de subsistência muitas vezes fala mais alto e não podemos culpabilizar as vítimas por isso, ao contrário, temos que avançar no estabelecimento de leis que as resguardem”, afirma a advogada Janaína Bertão.
Mas a profissional também alerta para o fato de que nem sempre os agressores ocupam postos de maior hierarquia do que as vítimas. Além disso, destaca que em casos nos quais as denunciantes são mulheres, a dificuldade para a instauração de um processo de investigação torna-se ainda maior, isto porque a cultura machista tende a deslegitimar tais vozes em todos os espaços.
“É sabido que as mulheres são as principais vítimas de assédio no país. Precisamos avançar em estudos mais detalhados que permitam ver como isto ocorre no mercado de trabalho. Mas a suspeita é que elas também sejam as vítimas mais frequentes neste ambiente. Entretanto, acompanhando alguns casos de perto, observo que a mesma tentativa de minimizar a violência, desacreditar do relato e tentar impedir que processos avancem é muito comum”, ressalta.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.