Nova etapa da Reforma Tributária é considerada fundamental para reduzir desigualdade social e injustiça no país
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem exatamente um mês para enviar ao Congresso Nacional um projeto de lei para uma reforma dos impostos sobre a renda no Brasil. O prazo foi estabelecido no texto da reforma tributária dos impostos sobre o consumo, promulgado em 2023.
De acordo com a Emenda Constitucional 132, o Executivo tinha 90 dias para apresentar um projeto de reforma do Imposto de Renda, acompanhado das correspondentes estimativas e estudos de impactos orçamentários e financeiros, a partir da promulgação do texto. Ele foi publicado no Diário Oficial da União no dia 21 de dezembro de 2023. Os 90 dias, portanto, encerram-se no dia 20 de março deste ano.
A reforma dos tributos da renda é considerada essencial para redução da desigualdade social no país. Ela poderia aumentar a carga de impostos sobre os mais ricos e reduzir a dos mais pobres, tornando o sistema tributário nacional mais justo.
De acordo com economistas e especialistas em tributação, uma série de medidas precisam ser incluídas na nova reforma para que ele alcance seu objetivo. Confira as principais:
Renda trabalho = renda do capital
Marcelo Lettieri, diretor do Instituto Justiça Fiscal (IJF), disse que o ponto mais importante dessa reforma tributária é equiparar a cobrança de impostos da renda obtida no trabalho com a renda obtida pelo capital.
Atualmente, um trabalhador formal que ganha mais de R$ 2.824 por mês –o equivalente a dois salários mínimos– tem o Imposto de Renda debitado diretamente de seu pagamento. Paga automaticamente seus impostos por meio de uma tabela progressiva.
Já os donos de empresas, que recebem seus ganhos por meio de lucros e dividendos, pagam proporcionalmente menos impostos que seus funcionários. Isso porque a transferência desses recursos das empresas aos empresários é isenta.
Revisão da tabela do IR
Além de equipar a tributação dos ganhos de trabalhadores e empresários, Lettieri e Faria reforçam a necessidade de revisar a tabela do Imposto de Renda (IR), algo que não ocorre para todas as faixas de renda desde 2015.
O presidente Lula prometeu em sua campanha isentar quem ganha até R$ 5 mil do imposto até 2026. Com isso, ele sinalizou que corrigir a tabela e reduzir o peso dos tributos sobre a renda sobre quem ganha menos no país.
Lettieri e Faria disseram, porém, que isso não basta. É preciso também criar novas alíquotas de cobrança para tributar quem ganha mais.
Hoje, quem ganha mais de R$ 4.664,68 por mês paga 27,5% de IR por mês. Lettieri fala em 35% de imposto para quem ganha “realmente muito, não só funcionários públicos”. Faria chegou a falar em 40% para ganhos mensais acima de R$ 40 mil por mês.
Revisão das deduções
Outra revisão esperada na reforma sobre o imposto sobre a renda é a das deduções. As deduções são despesas com saúde e educação, por exemplo, as quais podem ser registradas na declaração do IR e abatidas do cálculo do imposto do contribuinte.
Um relatório produzido pela Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda mostra os 1% mais ricos concentram 22,7% das deduções com despesas médicas. De acordo com o próprio documento, “a ausência de limites de dedução para despesas médicas é recorrentemente apontada como uma distorção que reduz a progressividade do IRPF, gerando distorções distributivas e prejudicando a justiça tributária”.
Para Weslley Cantelmo, economista e presidente do Instituto Economias e Planejamento, uma revisão das deduções deveria focar em benefícios para a classe média, não para os ricos.
Imposto sobre grandes fortunas
A cobrança de impostos sobre grandes fortunas está prevista na Constituição. Entretanto, isso nunca foi regulamentado e o tributo, cobrado.
A nova reforma é uma oportunidade de avançar no tema. A campanha “Tributar os Super Ricos”, composta por mais de 70 organizações, propõe que pessoas com patrimônio superior a R$ 10 milhões paguem o imposto, cuja alíquota partiria de 0,5% sobre o que exceder os R$ 10 milhões. Seria possível arrecadar R$ 40 bilhões por ano com esse tipo de cobrança.
Benefícios fiscais
Lettieri ainda recomendou uma ampla revisão sobre benefícios fiscais. Segundo ele, boa parte dos incentivos dados pelo governo para o desenvolvimento do Nordeste e da Amazônia são concedidos como descontos em Imposto de Renda de Pessoas Jurídicas.
Ele ressaltou que a maioria dos beneficiados são grandíssimas empresas. Afirmou também que parte dos incentivos não tem prazo para acabar nem para ser revisto. A reforma tributária poderia definir isso.
Terras e heranças
Cantelmo defende uma revisão do Imposto Territorial Rural (ITR), prevendo alíquotas mais altas para latifúndios e mais baixas para propriedades destinadas à agricultura familiar, e a criação de alíquotas progressivas de impostos sobre herança.
Propostas em estudo
Técnicos do governo federal ainda trabalham na proposta para a reforma do imposto sobre a renda que será encaminhada ao Congresso.
Fontes ouvidas pelo Brasil de Fato informaram que o texto que será encaminhado dependerá também de uma decisão política do próprio governo. Não está descartada a hipótese do envio de um texto mais simples, focado em alguns pontos, para o cumprimento do prazo estabelecido da Emenda 132. Neste caso, outros pontos que o governo pretende debater na reforma seriam propostos posteriormente.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), aliás, já disse que a discussão sobre mudanças no Imposto de Renda (IR) pode não ocorrer neste ano, devido às eleições municipais.
Fonte: Brasil de Fato
O economista Pedro Faria defende o fim das isenções sobre os dividendos.
André Roncaglia, economista e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) também é favorável à taxação dessa forma de distribuição de lucro. Para ele, isso pode até estimular a economia nacional como um todo já que empresas tenderiam a reter mais seus lucros e reinvesti-los na produção ao invés de repassá-los a seus sócios.
“A retenção de lucros nas empresas e com isso elas invistam mais, inovem mais, porque o dinheiro não é distribuído para dividendos”, explicou.