O encontro é um dos maiores eventos sobre educação do país
Na última semana, entre os dias 11 e 13 de julho, ocorreu o 14º Congresso Estadual da APP-Sindicato (Sindicato dos Professores e Funcionários de Escola do Paraná), em Pinhais, na região metropolitana de Curitiba.
Ao longo dos três dias, aproximadamente 800 educadores, incluindo docentes, funcionários de escola e estudantes definiram as ações que devem orientar as lutas da entidade pelos próximos quatro anos.
Entre as pautas levantadas estão valorização salarial e defesa das carreiras, rechaço à militarização e privatização das escolas estaduais. “A principal pauta do Congresso no contexto atual torna-se a luta contra a privatização da escola pública no Paraná. Mas não apenas essa pauta, também estamos numa luta constante contra a militarização, na essência, a defesa da escola pública com recursos públicos”, diz Márcio André Ribeiro, professor da rede estadual e presidente da APP-Sindicato Núcleo Londrina.
A liderança destaca que a principal reivindicação da categoria, aliada ao movimento estudantil e outras forças progressistas, é a manutenção da oferta da educação de maneira gratuita e universal.
“Uma defesa histórica da nossa entidade é por uma escola pública de qualidade, inclusiva, laica e livre de todos os preconceitos. Essa sempre foi a nossa defesa e, por vezes, parece mais difícil, dado o momento histórico da sociedade. Mas é isso, a defesa dos recursos públicos que eles realmente se destinem para a educação pública”, reforça.
Ribeiro avalia que o Congresso atendeu as expectativas e ressalta a importância de retomar a realização do evento após um período de suspensão devido à pandemia de Covid-19.
“Fazia um bom tempo que não conseguíamos realizar um Congresso, então, depois de alguns anos em que ele foi adiado, finalmente conseguimos reunir presencialmente uma boa parte da categoria com representações do estado todo presencialmente para debater e refletir sobre a educação pública paranaense”, analisa.
Durante o encontro, os trabalhadores da educação, discutiram conjunturas internacionais, nacional e estadual com foco nas políticas educacionais. “A defesa da educação pública, com recursos públicos, de qualidade, livre de todo e qualquer preconceito. Isso é inegociável para nós, então, algumas pessoas podem entender que isso é ideológico, entendemos que é ideológico mesmo, compreendemos que é direito da sociedade ter a melhor educação possível”, complementa.
Para além dos muros da escola
Além das demandas específicas sobre as condições de trabalho da categoria, o evento também debateu planos para a atuação sindical no combate às violências de gênero e racismo, problemas crescentes na sociedade brasileira.
O coletivo estabelece como uma das metas prioritárias a inclusão e permanência das camadas marginalizadas nos bancos escolares. A título de exemplo, atualmente, no Brasil, cerca de 73% da população transexual está fora do ensino básico ou superior, segundo dados da ONU (Organização das Nações Unidas). Entre as principais causas para a evasão está o preconceito.
“Historicamente, a APP sempre defendeu as especificidades educacionais dos povos indígenas, quilombolas, segmento LGBTQIA+, respeitando as diversidades de cada um, com o objetivo de levar a educação pública de maior qualidade possível para todos os grupos”, afirma.
Outro ponto preponderante, de acordo com o professor, é agregar estas temáticas nos currículos. A valorização da realidade de cada estudante torna-se um dos maiores objetivos.
“Trazer para dentro da escola esses debates, incluir todos esses segmentos dentro da educação, pois é na diversidade que nós temos uma das nossas maiores qualidades. O respeito a todos, LGBT, povos quilombolas, indígenas, caiçaras, no litoral não podemos esquecer, também temos essa característica aqui no Paraná”, assinala.
“Não venda minha escola”
Ainda, durante o Congresso aconteceu o lançamento da campanha estadual “Não venda a minha escola”. A mobilização é uma resposta à aprovação do projeto de lei nº 345/2024, proposto pelo governador Ratinho Júnior (PSD). Nomeado de “Parceiro da Escola”, a iniciativa autoriza que a administração de 204 escolas estaduais – aproximadamente 10% da rede – seja repassada para iniciativa privada.
A legislação foi aprovada em caráter de urgência pela ALEP (Assembleia Legislativa do Paraná) no início de junho. Desde o início da tramitação, a APP-Sindicato tem denunciado a falta de diálogo por parte da SEED (Secretaria Estadual de Educação).
“Nós já estamos nesse embate há algum tempo, isso não começou agora, já tem alguns anos que estamos contra escolas militarizadas, de uma forma geral, e depois também contra a privatização, a venda das escolas, a doação das escolas públicas do Paraná, isso é inaceitável”, adverte.
Conforme informado pelo Portal Verdade, para tentar impedir o avanço da medida, os educadores deflagraram greve com ampla adesão da categoria. A mobilização ocorreu entre os dias 3 e 5 de junho e foi marcada por uma série de ataques por parte do governo.
Além das práticas antissindicais como o pedido de prisão da presidenta da APP, Walkiria Mazeto (relembre aqui), sob o comando de Ratinho, a Polícia Militar agiu com truculência contra manifestantes que tentavam ocupar a ALEP para acompanhar a votação.
“Nós estamos organizando todos os esforços sem o apoio da mídia tradicional, das grandes TVs, grandes jornais. Nós consigamos equilibrar o contraponto, as argumentações e atingir toda a sociedade paranaense, que é o que nos interessa, os pais, as mães, aqueles que precisam entender de fato o que está acontecendo para que possam conscientemente fazer a sua escolha”, observa.
Mesmo com o projeto sancionado, a entidade tem encampado uma jornada de lutas em defesa da escola pública. Entre as ações estão o questionamento da legalidade do programa e a tentativa de barrar as privatizações durante consulta pública, prevista para acontecer em outubro deste ano.
“Nós temos certeza de que se tivermos a possibilidade de debater e mostrar os prós e os contras, ninguém aceitaria de forma nenhuma, jamais, essa possibilidade. A nossa única dificuldade é atingir as pessoas. Toda nossa organização, nosso trabalho focam nesse objetivo de atingir, nos próximos meses, o maior número de pessoas possíveis e para isso nós contamos com a colaboração de absolutamente todo mundo que puder ajudar”, finaliza Ribeiro.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.