A comunidade interna da UEL (Universidade Estadual de Londrina) e a Câmara Municipal de Londrina se mobilizam, nesta segunda (5) e terça-feira (6), para discutir e chamar a atenção da sociedade para o projetode lei 522/22,que prevê mudanças na gestão dos hospitais universitários no Estado. Enviado pelo governo do Paraná à Assembleia Legislativa na última quarta-feira (30), a proposta tramita em regime de urgência e o temor é que, se aprovada, resulte em impactos significativos aos projetos acadêmicos e assistenciais prestados pelo HU.
A Assuel (Associação dos Servidores da UEL) convocou para esta segunda-feira assembleias extraordinárias com os funcionários do HU (Hospital Universitário) e do HC (Hospital de Clínicas) para deliberar sobre a possibilidade de paralisação das atividades. Se aprovada, os funcionários das duas instituições de saúde poderão parar a partir de quinta-feira (8).
As assembleias irão acontecer às 11 horas, em frente ao ambulatório do HC, no campus da UEL, e às 13h30, no hall do HU. “(O projeto) é um desastre. Isso demonstra que o governador não tem compromisso nenhum com a população. Em nenhum momento ele colocou no programa de governo dele que iria privatizar órgãos e instituições. Começou com a Copel e agora, os hospitais universitários”, apontou Marcelo Seabra, presidente da Assuel.
A principal consequência da terceirização do HU, apontou Seabra, seria a queda na qualidade do serviço público oferecido pela instituição em razão da alta rotatividade de pessoal. “Não basta ter diploma, é necessário prática, vivência que se adquire no serviço público. Essa experiência é que vai dando um atendimento de excelência aos pacientes. Com a rotatividade de mão de obra, reduz salário, mas não vai ser uma economia para o governo. Lucro não rima com saúde”, avaliou.
“A toque de caixa”
Na terça-feira, o presidente da Assuel deverá estar em Curitiba onde pretende reunir-se com deputados e tentar articular a suspensão da tramitação do projeto no Legislativo estadual ou, ao menos, a suspensão da tramitação em regime de urgência. “Qual o motivo de mandar em regime de urgência se a proposta é boa? Por que não estender o debate acerca do projeto? Ele (o governador, Ratinho Junior) quer passar a toque de caixa.”
Também nesta segunda-feira, às 10 horas, acontece uma reunião na Câmara Municipal para debater o assunto. A vereadora Lenir de Assis (PT) convocou vereadores, prefeitura, Ministério Público e outras entidades para discutir a questão e torná-la pública, com o intuito de provocar uma reação maior da sociedade. “Votar o projeto do jeito que ele se propõe é autorizar o fim de um serviço 100% público, 100% SUS. Deixar passar sem que seja discutido com a população, é inadmissível”, disse a vereadora.
O projeto de lei deverá ser avaliado pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da assembleia na manhã de terça-feira e, se aprovado, deve entrar na pauta de votação no mesmo dia, à tarde. Pela proposta, a gestão dos atendimentos médicos dos hospitais universitários deixa de ser feita pelas universidades, que ficariam limitadas à gestão acadêmica dos hospitais-escola. A mudança transfere a administração à Sesa (Secretaria de Estado da Saúde), que poderá terceirizar ou privatizar o serviço. “O Estado se descompromete da gestão do HU”, ressaltou Assis.
As mobilizações marcadas para segunda e terça-feira, destacou a vereadora, são meios de sensibilizar o governador e de fazer os deputados entenderem que em razão dos possíveis impactos da medida, a votação não pode acontecer em caráter de urgência. “É o fim do concurso público, fim da participação popular, fim da gestão pública. Perde-se o caráter público do HU. Será um dos maiores crimes que irão acontecer com a conivência dos deputados e quem votar a favor sabe o dano que vai causar na vida da população. O HU tem uma vida que foi a construção de um bem público. Vamos perder tudo isso. Não é uma coisa que se pode recuperar depois”, alertou a vereadora. “O governo pode fazer mudanças, mas primeiramente, deve discutir com a população.”
Ato em defesa do SUS e do HU
Alunos e docentes do CCS (Centro de Ciências da Saúde) da UEL e servidores do HU participam de um ato em frente ao hospital na terça-feira, a partir das 9h30, para alertar sobre o projeto de lei, mas também em defesa do SUS e da universidade pública. “Suspender a tramitação é o ponto mais importante da nossa proposição ao governo do Estado. A UEL, a reitora, a superintendente do HU não têm se furtado a fazer um canal de diálogo. Mas a gente precisa de tempo para discutir com a comunidade universitária, com os servidores, a melhor maneira de fazer a gestão, se é que tem sido feita uma gestão ruim”, declarou a pesquisadora e professora do Departamento de Saúde Coletiva da UEL, Marselle Carvalho.
A docente cobra maior clareza do governo sobre os motivos que levaram ao novo modelo de administração proposto. “Que se apresente o estudo, a expectativa e a razão de se mudar a gestão. Que motivação é essa?”, indagou. “O que a gente tem conhecimento é que o HU da UEL é um hospital de excelência, com as contas saneadas e que passou pela pandemia sendo hospital de referência para a região e o Estado.”
Carvalho salientou as características do HU, que reúne em um mesmo ambiente docentes, pesquisadores, técnicos e alunos. “Não pode dissociar. Tem que trabalhar de forma articulada a pesquisa, o ensino, a assistência. É um ambiente de inovação, pesquisas. O HU é a nossa grande referência. Atende mais de 90 municípios e mais de dois milhões de habitantes. A gente forma pessoas de excelência para o Brasil e para o mundo.”
A professora comparou o que acontece agora com o que ocorreu em 2021, a poucos dias do início do recesso parlamentar, quando a Assembleia aprovou com enorme rapidez a criação da LGU (Lei Geral das Universidades). A lei foi fortemente criticada pelos gestores das universidades, que tiveram os recursos engessados. “Isso não é uma novidade, a forma como o governo do Estado tem agido com as universidades”, disse Carvalho. “Isso (projeto de mudança de gestão nos hospitais universitários) também é resultado da LGU, que permitiu que se tire a autonomia de gestão do HU. Agora a gente está vendo os frutos”, afirmou Lenir de Assis.
Nos últimos dias, desde que o projeto de lei 522/22 foi enviado ao Legislativo, o governo do Estado só tem se manifestado por meio de nota. Na última, enviada na sexta-feira (2), a Casa Civil disse que a proposta define que a gestão acadêmica e administrativa dos hospitais compete às universidades estaduais e a gestão hospitalar assistencial será de competência da Sesa e suas fundações. “As Fundações de Apoio poderão captar, receber e manter recursos financeiros para destinar à formação, execução e continuidade de programa e projetos de ensino, extensão, pesquisa, desenvolvimento institucional, gestão hospitalar, serviços de saúde e inovação sem que seja necessário utilização de recursos do Tesouro Estadual. A mudança permite, além de novos investimentos nos hospitais universitários, uma gestão mais unificada e compartilhada, voltada para a ampliação de serviços e fortalecimento da regionalização e da educação permanente em saúde”, destacou o texto oficial.
Fonte: Redação Folha de Londrina