Alunos reforçam a importância da gratuidade para seguirem com os estudos
Nesta segunda-feira (24), com o início do ano letivo de 2025, a UEL (Universidade Estadual de Londrina) dá boas-vindas a aproximadamente 2 mil novos estudantes que ingressam nos 53 cursos de graduação oferecidos pela instituição.
Entre eles, estão cerca de 10 egressos do Cursinho Práxis Itinerante. Maíra Mascarenha, cientista social e integrante do projeto de extensão homônimo, responsável pela oferta das aulas preparatórias, conta que o Cursinho surgiu em 2023, com o intuito de incentivar estudantes oriundos de escolas públicas a prestarem o vestibular.
“O Cursinho surge dessa vontade de preparação desses estudantes para o vestibular, por mais que a gente entenda que o vestibular não é a maneira mais justa de entrar no ensino superior, que era para ser público para todos. Por mais que a gente entenda isso, também vemos como uma maneira interessante de se entrar na universidade”, diz.
No último ano, as aulas foram ministradas no Colégio Estadual Albino Feijó Sanches e no Colégio Estadual Professor Thiago Terra, ambos localizados na zona sul de Londrina.
Ana Beatriz Pavilhão Boscariol, mestra em Ciências Sociais, também integrante da equipe Práxis Itinerante, compartilha que ao todo, cerca de 100 estudantes participaram das atividades na última edição. Ainda, de acordo com ela, a iniciativa foi possível após a seleção por um edital, ofertado pelo Programa de Fomento à Extensão – Paraná Mais Ciência em parceria com a SETI (Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior).
Todas as atividades desenvolvidas pelo Cursinho como aulas, disponibilização de materiais, são gratuitas.
“A principal finalidade é oferecer um ensino gratuito, com material de estudo – apostilas – do CEPV [Curso Especial Pré-Vestibular] ofertado na Universidade Estadual de Londrina, a toda a comunidade, não apenas aos estudantes matriculados nos respectivos Colégios Albino Feijó Sanches e Thiago Terra, mas realmente a todo mundo que tivesse interesse, independente da idade”, pontua Ana.
Arthur Francez Vitorino é um dos calouros do curso de Ciência de Dados e Inteligência Artificial. Ao Portal Verdade, Arthur destaca que Cursinho propiciou conhecimentos fundamentais para a realização da prova, também no estímulo à autoconfiança e divulgação de informações sobre políticas afirmativas como o sistema de cotas.
“Foi muito bom estar com mais pessoas que também estavam lá com o propósito de serem aprovados em seus cursos e pelo apoio mútuo entre os estudantes e os professores. Foi graças ao Cursinho que tomei um melhor conhecimento sobre o sistema de cotas, o que fez eu optar por fazer minha inscrição pela cota de negros”, relata.
Atualmente, o vestibular da UEL reserva 20% do total de vagas ofertadas para estudantes que cursaram integralmente as quatro últimas séries do ensino fundamental e todo o ensino médio em escolas públicas.
Outros 20% do total de vagas são para candidatos autodeclarados negros que frequentaram integralmente do 6º ao 9º ano do ensino fundamental e todas as séries do ensino médio em instituições públicas da educação básica. Outras 5% das vagas são destinadas para candidatos autodeclarados negros, independentemente do percurso de formação, ou seja, podem ter estudado em escola pública, privada ou em ambas.
Desde 2021, a UEL também oferece cotas para pessoas com deficiência no processo de seleção, reservando 5% do total de vagas dos cursos de graduação.
“Gostaria que todos pudessem aproveitar ao máximo e tirar o máximo de dúvidas possível, até porque é um curso feito, especialmente, para nós que não temos condições de pagar um cursinho e ter esses professores e pessoas que estão se comprometendo a ministrar aulas perto de casa e gratuitas para a gente é sim uma oportunidade, portanto, se alguém , assim como eu, tem dificuldade de estudar ou se concentrar sozinho é de grande proveito frequentar o Cursinho”, reforça Arthur, que acompanhou as aulas no Colégio Estadual Albino Feijó Sanches.
Já Maria Clara Damasceno Moura garantiu sua vaga no curso de Pedagogia. Ela destaca que o Cursinho contribuiu, principalmente, para sanar dúvidas em matérias que apresentava mais dificuldade. Para ela, as metodologias empregadas pelos professores foi um dos grandes diferenciais.
“Todos os dias de Cursinho eram excelentes, onde até mesmo onde eu tinha muita dificuldade, conseguia aprender de forma dinâmica e com muita atenção”, compartilha.
Maria Clara também evidencia a importância da gratuidade, já que o alto custo dos cursinhos tende a ser um impeditivo para os estudantes, sobretudo, para aqueles de camadas mais vulnerabilizadas.
“A importância de frequentar o Cursinho não está apenas em passar para a universidade ou curso que tanto deseja. Lá, os professores explicam de forma dinâmica e leve, levando materiais personalizados e com muitos ‘macetes’ para o vestibular. Creio que a parte mais importante, é também de ajudar pessoas que tem sonhos, mas que muitas vezes não possuem condições de pagar os cursos super caros de nossa cidade, além de que podemos aprender de forma leve e ainda fazer muito amigos”, acrescenta.
“A minha mensagem para os próximos alunos é para que eles estudem, se esforcem e que acreditem em seus sonhos, pois todos nós chegamos desacreditados, e diversos de nós conseguimos passar onde mais sonhávamos. Desejo também força e muita diversão na hora de aprender. Estou torcendo por cada um”, ela deixa de mensagem aos novos cursistas.
Além da UEL, os estudantes também foram aprovados em outras instituições como UTFPR (Universidade Tecnológica Federal do Paraná) e a PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná). Entre os cursos estão Administração, Ciência de Dados e Inteligência Artificial, Ciências Sociais, Letras – Português, Pedagogia, Engenharia Elétrica e Engenharia Química. A expectativa é que o número de aprovados aumente ainda mais com as listas de convocação rodando.
Yone Gabriely Tamilin Ribas, ingressante no curso de Engenharia Química na UTFPR, salienta o papel do Cursinho na retomada dos estudos.
“Teve muita importância pois fazia um pouco mais de um ano que eu estava fora do colégio e sem estudar, então com todos os professores e ensinamentos consegui ter uma retomada excelente das matérias”, diz.
“Só façam, os professores são excelentes, contribuiu demais para alcançar os objetivos acadêmicos que sonhei, não percam a oportunidade de entrar no cursinho”, ela complementa.
Rede de formação inicial e continuada
Ana Beatriz indica que os processos de planejamento à efetivação do Cursinho envolveu uma série de profissionais, desde a coordenação até os professores que foram selecionados através de edital para que ministrassem duas aulas, uma vez na semana, sendo uma em cada colégio, com duração em média de 50 minutos.
A maioria do corpo docente era composta por estudantes dos mais variados cursos da UEL, ou seja, a iniciativa também possibilitou um campo de experiência profissional para os graduandos.
“Acredito que o Cursinho teve relevância na formação profissional dessas pessoas, afinal alguns, cursando a licenciatura, ainda não tinham tido contato com a sala de aula, apesar de ser em circunstâncias diferenciadas, ou seja, não estavam atuando em uma sala cheia de ensino fundamental ou ensino médio, puderam ter uma ‘palhinha’ de como funciona o esquema da escola, preparando aulas, se organizando para cumprir um cronograma de conteúdos em período curto, e tendo contato direto com os estudantes”, avalia.
Ana Beatriz também avalia que a experiência com o Cursinho tem contribuído para retomar o desejo de lecionar. “O contato diário com as juventudes sempre trás novas reflexões a nossa própria vida e trocas são realizadas com todos que circulam pelo espaço físico escolar, você acaba mesmo que minimamente se envolvendo naquele cotidiano. Acredito que essa experiência me retomou uma vontade adormecida, desde o momento em que conclui a graduação, de estar presente na sala de aula”, afirma.
Estar mais inserida nas escolas também foi um das vontades que as vivências oportunizadas pelo Cursinho despertou em Maíra. “Continuar fazendo essas ações, entrar, de fato, nesse ambiente educacional e trabalhar junto com os adolescentes, independente se for para vestibular ou, enfim, qualquer outra frente aí que seja de interesse, mas trabalhar nesse ambiente educacional”, aponta.
“Para os profissionais desenvolvidos, eu acredito que seja muito interessante estar nesse processo burocrático mesmo, que a gente só consegue aprender fazendo. Além, é óbvio, de ter essa interação com as escolas, tentar essa interação com a comunidade, para aprender como fazer uma pesquisa com a comunidade, para a comunidade, algo mais coletivo acontecendo”, acrescenta Maíra.

A possibilidade de esperançar
As coordenadoras estimam que estudantes de pelo menos 10 escolas públicas tenham sido impactados pelo Cursinho apenas no último ano, já que além das aulas, a equipe também visita colégios para orientar sobre o pedido de isenção da taxa de inscrição do vestibular, entre outras informações sobre o processo seletivo.
Ainda, elas sinalizam a importância do acompanhamento dos estudantes, sobretudo, neste momento de grande ansiedade que marca o vestibular.
“Para os estudantes de imediato pensamos na questão da retomada de conteúdo ou até mesmo aprendizado, diante das inúmeras circunstâncias que transpassam o ensino fundamental e médio atual nas escolas públicas, inclusive, a reestruturação da grade curricular. Mas outra coisa possível de ser observada é a troca entre aquelas que frequentavam as aulas e eu mesma que estava lá todos os dias ou com os professores que criavam mais afinidade, costumávamos conversar bastante sobre essa ansiedade para com o futuro e as cobranças que sentiam internamente”, assinala Ana Beatriz.
“Os estudantes que participaram do Cursinho, a gente percebe que foi de muita importância assim para eles não terem que estudar sozinhos. Alguns dos próprios estudantes comentaram isso, que estudar sozinho às vezes é muito complicado. Fica muito solto e com as aulas eles conseguiram afunilar o conteúdo, entender o que que vai cair na UEL, porque no dia a dia, assim, no ensino médio é difícil também para o professor que estava todo dia na escola conseguir focar tanto no vestibular, porque ele tem outras demandas para cumprir, então, para o aluno foi, pelo que eles falaram, foi bom por conta disso, por não estarem sozinhos, conseguir tirar dúvidas na hora, e acabar sendo um reforço do que eles viram na escola”, observa Maíra.
A previsão é de que novas turmas sejam ofertadas neste ano. Mais informações podem ser acompanhadas na página @praxisitinerante.

Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.