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Aproximação do período eleitoral eleva violência política; casos crescem 117%

Pesquisador da Unirio diz que tem sido observado aumento da violência em anos eleitorais, sem sinais de redução. De 2019 até hoje, Observatório verificou mais de dois mil casos

A aproximação das eleições municipais deste ano pode ter contribuído para o aumento de 117% nos casos de violência política verificados entre abril e junho em relação ao trimestre anterior. No período, houve 128 registros de ocorrências contra lideranças políticas, dos quais 17,2% foram homicídios.

Os dados são do Observatório da Violência Política e Eleitoral no Brasil, da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), que acompanha dados sobre essas ocorrências desde 2019. Daquele ano até hoje, foram 2.113 casos.

“Temos observado uma consistência no aumento da violência em anos eleitorais, que são anos mais violentos. E temos percebido a manutenção de um cenário de violência, sem sinais de redução”, explica, ao Portal Vermelho, o coordenador do Observatório, Miguel Carnevale. Ele acrescenta que as eleições não são a causa da violência, “mas funcionam como o último estalo para um acirramento que eventualmente já existia antes do período eleitoral chegar”.

No que diz respeito aos tipos de violência, as ameaças permanecem como a categoria mais recorrente. No trimestre em foco, o Observatório identificou 47 casos, o que corresponde a 36,7% do total. Em seguida, aparecem as agressões, com 42 ocorrências (32,8%), 22 homicídios (17,2%), 11 atentados (8,6%), três homicídios de familiares (2,3%) e três sequestros (2,3%).

Considerando o recorte regional, o Sudeste vem sendo a região mais atingida, com 47 registros (36,7%), seguido do Nordeste com 46 (35,9%), Centro-Oeste com 13 (10,2%), e o Norte e o Sul com 11 cada (8,6% cada).

Segundo o relatório, ao todo foram identificados episódios de violência em 23 estados, sendo São Paulo o mais atingido, com 21 (16,4%). Em segundo lugar estão a Bahia e o Rio de Janeiro, ambos com 15 casos cada (11,7% cada).

Além disso, o Observatório aponta que os homicídios, de lideranças e familiares ocorreram em 12 estados. “O Rio de Janeiro chama atenção com seis casos (24%). Um deles foi o assassinato de uma pré-candidata a vereadora no município de Nova Iguaçu (RJ). Juliana Lira de Souza Silva, conhecida como ‘Nega Juh’, foi baleada junto ao seu filho na cidade”.

De acordo com o relatório, os vereadores lideram como os mais vitimados, respondendo por 51 casos (39,8%). Depois, foram verificados casos envolvendo nove funcionários de administração municipal (7%), nove prefeitos (7%) e três vice-prefeitos (2,3%). Juntas, essas categorias compreendem 56,3% de todos os episódios violentos computados no trimestre.

“É importante mencionar que 37 casos (28,9%) ocorreram contra lideranças sem cargo político no momento da violência. Muitas delas são pré-candidatas a vereador ou à prefeitura nas próximas eleições”, pondera o Observatório.

Porém, acrescenta, “independentemente da vítima ter ou não um cargo político, se considerarmos todos os casos contra lideranças que se intitulam pré-candidatas, tem-se 33 casos (25,8%): 17 contra pré- candidatos a prefeito (13,3%), 14 contra pré-candidatos a vereador (10,9%), e dois contra pré-candidatos a vice-prefeito (1,6%)”.

Motivações

O coordenador do Observatório, Miguel Carnevale aponta que nesse universo da violência política, as motivações mais comuns são a briga pelo poder, por interesses econômicos e pelo controle político. “A disputa pelo controle é a violência mais comum dos pequenos municípios”, destaca.

Carnevale ressalta, ainda, a presença dos casos de violência política relacionados às questões ideológicas. “É possível assinalar que nos últimos anos, o Brasil tem presenciado um aumento desta categoria de violência. Ela ainda não é, e eu imagino que nem venha a se tornar, a violência mais comum. A violência dos pequenos municípios, em busca do poder, de controle econômico, ainda é superior. Mas eu acredito que seja possível falar que há um aumento nessa violência ideologicamente motivada”, argumenta.

O pesquisador acrescenta que estudos feitos em outros campos — por exemplo, o da polarização política — vêm apontando “uma radicalização do eleitorado, principalmente na extrema direita, com uma ampliação da aversão contra o que é oposto”.

Outro aspecto que vale destacar é a relação cada vez mais próxima entre organizações criminosas, especialmente milícias, e o poder político em diferentes níveis, esferas e locais, com destaque para o Rio de Janeiro. “O crime organizado está diretamente relacionado à política, no Brasil inteiro, em alguns postos até oficialmente, assumindo cargos”, diz.

Carnevale pontua o caráter clientelista dessa relação. “Muitas vezes, a política alimenta o crime organizado em algumas instâncias e o crime organizado alimenta a política, seja com ganho de votos, seja com entrega de áreas de apoio. Essa relação compõe o turbilhão de questões que guiam a violência política”.

Perfilamento das vítimas

O estudo também segmentou os dados segundo categorias como gênero, idade e raça das vítimas. Em relação ao perfil social, 97 eram homens (75,8%) e 31 mulheres (24,2%). “O percentual de mulheres vitimadas aumentou 14 pontos percentuais em comparação com o trimestre anterior”, salienta o Observatório.

Embora o levantamento não se detenha especificamente sobre o recorte de gênero, Carnevale aponta que “a violência física é mais recorrente entre os homens, enquanto as de caráter psicológico ou semiótico — como a destruição de reputação, objetificação e invisibilização da figura política — são mais recorrentes entre as mulheres”.

O pesquisador também explica que, segundo análises estatísticas que fez, “foi possível observar que as mulheres são vítimas mais frequentes de violência em ambiente institucional e também quando o autor da violência é outra liderança política”.

Para ele, “esses resultados parecem encaminhar para uma visão que a literatura de violência política de gênero já põe na mesa de que o meio político é hostil às denúncias femininas, que o meio político parece reagir à entrada das mulheres na política”.

Quando é feito o recorte racial, o estudo mostra que 49 lideranças se declararam brancas (38,3%), 29 pardas (22,7%), 13 pretas (10,2%) e uma amarela (0,8%). Não foi possível identificar a cor/raça de 36 lideranças (28,1%).

A maior parte das vítimas, 34,4%, se concentra na faixa etária dos 40 aos 49 anos; em 46,9% dos casos (60), as vítimas tinham ensino superior.

Por fim, o levantamento mostra que entre abril e junho de 2024, 23 partidos tiveram ao menos uma liderança atingida. O PL lidera a lista, com 15 casos (11,7%). Em seguida, surgem o PSB e o PP, com 11 casos cada (8,6% cada). O PT, que costuma ser um dos partidos políticos mais atingidos, aparece em quarto lugar, com 10 casos (7,8%). Não foi possível identificar a filiação partidária de 18 vítimas.

O acompanhamento é feito a partir do Alerta do Google, que envia diariamente relatórios a partir de um conjunto específico de palavras-chave. As informações obtidas nesses veículos são depois validadas pela equipe de investigadores com outras fontes de modo a descartar mortes naturais, acidentais ou sem razão conhecida.

As informações que compõem o perfil social e político das vítimas são obtidas no Repositório de Dados Eleitorais e na plataforma de Divulgação de Candidaturas e Contas do Tribunal Superior Eleitoral.

Fonte: Portal Vermelho

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