O Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) determinou a reativação da Câmara Técnica de Gerenciamento Costeiro (CT-Gerco), responsável pela governança ambiental em matéria de gerenciamento costeiro no estado. A Câmara foi desativada em 2021, o que permitiu ao governo de Ratinho Júnior (PSD) fazer intervenções no litoral, como a engorda da praia de Matinhos, sem a avaliação técnica do colegiado, composto por representantes dos governo estadual e federal, dos municípios da região, de universidades e ONGs..
A cautelar concedida pelo conselheiro do TCE-PR Fernando Guimarães determina que a Secretaria de Estado do Desenvolvimento Sustentável (Sedest, antiga Secretaria do Meio Ambiente) comprove a constituição da CT-Gerco, vinculada ao Conselho de Desenvolvimento Territorial do Litoral Paranaense (Colit). A Representação ao TCE-PR foi feita pela entidade de defesa ambiental Cedea (Centro de Estudos, Defesa e Educação Ambiental).
Na denúncia feita ao TCE-PR, o Cedea afirma que houve omissão por parte da Sedest e do secretário Everton Luiz da Costa Souza, o que representaria um retrocesso na gestão do litoral. “No presente momento, a CT-GERCO não está operante por omissão do atual gestor, situação que significa retrocesso institucional na gestão costeira e na política do mar do Estado do Paraná, grave irregularidade decorrente de omissão da administração estadual que deve ser sanada por este órgão de controle”.
Segundo o Cedea, em maio do ano passado a Sedest informou que seria necessário convocar os membros do CT-GERCO para eleição do presidente, mas nenhuma providência foi tomada. “A declaração do Secretário de Estado foi feita em 15 de maio de 2024, e até o momento nenhuma providência foi adotada. Assim, fica atestada a omissão grave do administrador público, que demanda o controle externo”, afirma a denúncia. “Trata-se de irregularidade na atividade operacional da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Sustentável, em matéria lesiva à proteção ambiental”.
Criada em 2016 e regulamentada em 2018 por uma resolução da antiga Secretaria do Meio Ambiente, a CT-GERCO deve ter representantes da Sedest; do Instituto Ambiental do Paraná (que teve seu nome alterado para Instituto Água e Terra por Ratinho Júnior); do Instituto de Terras, Cartografia e Geociências (ITCG); do Instituto das Águas/Comitê da Bacia Litorânea; da Paranacidade; da Associação dos Municípios do Litoral do Paraná; do Ibama; do ICMBio, da Superintendência do Patrimônio da União (SPU); do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN); da Funai; de uma instituição de ensino superior; e de organizações não governamentais.
“Superpostes” de Matinhos não foram discutidos
Segundo o Cedea, uma intervenção que não foi debatida na CT-GERCO é a instalação de “superpostes” em Matinhos. O governo finalizou em outubro do ano passado a instalação de 145 postes de iluminação pública, de 17 metros cada um, ao longo dos 6,3 quilômetros da orla, com investimento de R$ 145 milhões.
A instalação foi questionada pelo Ministério Público Federal (MPF) em abril do ano passado. O MPF solicitou ao IAT o envio de especificações do aparato, previsão de material certificado pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), comprovação de atendimento às normas técnicas brasileiras sobre iluminação pública e a realização de um estudo de impacto ambiental.
“Os refletores superpotentes, de luz branca e temperatura acima de 5000k, são semelhantes aos utilizados em estádios esportivos e visam a transformar a ‘noite em dia’. O investimento do governo paraense, por meio do instituto, é de quase R$ 15 milhões. As instalações devem ser concluídas no prazo de um ano, pela empresa Samar Iluminação e Engenharia Ltda.”, informou na época o MPF.
No documento encaminhado ao IAT, a procuradora da República Monique Cheker afirmou que a instalação punha em risco uma área tombada. “A instalação dos superpostes demonstram uma ameaça à ordem jurídica de proteção da Orla de Matinhos (em razão do tombamento), ao bem-estar e saúde humana, aos interesses sociais e individuais indisponíveis, à proteção do patrimônio cultural e natural, ao meio ambiente e a outros interesses difusos e coletivos”, afirmou a procuradora.
O órgão argumentou que havia necessidade de estudo de impacto ambiental, pois o projeto causaria “risco de danos relacionados à desorientação espacial de animais de hábitos noturno, alteração da dinâmica de deslocamento espacial de espécies e alteração do ritmo circadiano das espécies animais”.
Também haveria risco de aumento de taxas e impostos decorrentes do aumento de carga de energia demandada e alto custo de manutenção; formação de barreira visual; interferência à apreciação da paisagem e da linha do horizonte, além da depreciação do valor imobiliário dos imóveis e de risco de aumento exponencial da dengue.
Em setembro, a procuradora Monique Cheker recomendou ao IAT que suspendesse o projeto, já que não havia sequer licenciamento ambiental. “Ao ver do MPF, inclusive por conta dos possíveis danos da iluminação excessiva na orla de Matinhos, o licenciamento deveria ter sido feito”, afirmou a procuradora. A recomendação não foi acatada: em outubro, o governo Paraná informou que parte dos equipamentos já havia sido ligada, “clareando um trecho de aproximadamente um quilômetro da Avenida Atlântica do balneário”. O MPF ajuizou uma ação contra a instalação dos equipamentos.
Governo prepara novas intervenções
Depois das obras na orla de Matinhos, que começaram em julho de 2022 – ano seguinte à desativação da CT-GERCO –, o governo de Ratinho Júnior mira agora nas orlas de Guaratuba e de Pontal do Paraná e no centro histórico de Paranaguá.
No mês passado, a agência de notícias do governo informou que pretende alterar mais de 55 mil metros quadrados do centro histórico de Paranaguá, com mudanças na pavimentação, no calçamento, na iluminação pública e no paisagismo, além de construir novos trapiches, ciclovia, estacionamento e centro gastronômico. Por lei, todas essas alterações deveriam ser analisadas pelo Iphan, que tem um representante na CT-GERCO, já que a área foi tombada pelo Instituto em 2009.
Na quinta-feira da semana passada (20), Ratinho Júnior assinou a ordem de serviço para a primeira fase da requalificação da orla de Pontal do Paraná. Segundo a agência de notícias do governo, a assinatura “permite o início das obras, com a instalação dos canteiros e de equipamentos”. O projeto prevê a revitalização de 3,66 quilômetros de extensão entre os balneários de Monções e Canoas. O investimento é de R$ 34,5 milhões, que serão repassados para o Consórcio Orla de Pontal, vencedor da licitação.
Outro projeto prevê a engorda da praia de Guaratuba, nos moldes do que foi feito em Matinhos, além da construção de um deck de madeira, reforma de trapiches, paisagismo, novo calçamento, iluminação, espaços de lazer e convivência e estacionamento. Segundo o governo, atualmente está sendo preparado um anteprojeto, que servirá de base para a elaboração da licitação, que será conduzida pelo IAT.
Secretaria não confirma reativação
A Sedest não confirmou se pretende reativar a CT-GERCO. Em nota, a assessoria da secretaria informou apenas que o órgão não foi informado sobre a determinação do TCE-PR e que responderá ao Tribunal. “A Secretaria de Estado do Desenvolvimento Sustentável (Sedest) ainda não foi notificada. Assim que houver a informação oficial, responderá diretamente ao TCE-PR”, diz a nota.
Fonte: Jornal Plural