Nesta quarta-feira (02), às 19h, a APP-Sindicato será sede de debate sobre a Revogação do Novo Ensino Médio. O evento, que visa à criação do Comitê de Revogação do Novo Ensino Médio de Londrina e Região, é uma ação conjunta de professores, estudantes e pesquisadores.
Com a participação das Professoras Sandra Garcia e Ileizi Fiorelli, associadas da Universidade Estadual de Londrina, o debate pretende chamar atenção para os desafios e impactos da implementação do Novo Ensino Médio.
Críticas
A reforma do ensino médio, instituída pela Lei nº 13.415/2017 e implantada em 2022, introduziu algumas mudanças significativas, como a flexibilização do currículo, itinerários formativos, ampliação da carga horárias, ensino técnico e ensino a distância.
Para a professora Ileizi Fiorelli, a proposta de ensino em tempo integral perde sua essência, uma vez que os itinerários formativos não apresentam uma base sólida em componentes curriculares tradicionais da ciência ou da tradição escolar brasileira. A carga horária das ciências de referência ter diminuíram.
“Então, ao mesmo tempo que torna o Ensino Médio em tempo integral, ou seja, com mais horas, retira-se partes dessa formação humana que seriam fundamentais ao longo do dia de quem fica na escola, como por exemplo, educação física, artes, que poderia contemplar artes cênicas, artes plásticas, então teatro, música, dança, enfim, a educação física, a prática de esportes”, disse.
Outro ponto destacado pela educadora é a implementação da reforma durante a pandemia, o que gerou insatisfação entre os estudantes, que não se sentem contemplados pelo novo modelo de ensino.
“Estudantes que ocuparam a maioria das escolas no Brasil em 2016, dizendo, não queremos essa reforma desse jeito, queremos ser ouvidos. Então, os estudantes não foram ouvidos, ao contrário, foram perseguidos, né, depois das ocupações históricas de 2016. E os docentes, os professores, as professoras, não foram e não estão sendo ouvidos nessa reforma. Os estudantes percebem que estão sendo enganados porque as escolas particulares, assim como elas não adotam o modelo cívico-militar, elas continuam dando conteúdos de física, química, biologia, história, geografia etc.”
A docente argumenta que a formação “sólida”, aplicada na maioria dos países, está sendo destruída. “Aqui no Paraná, você tem uma carga horária grande para, por exemplo, educação financeira, que é importante, que pode ser ensinada, mas não precisa ocupar a maior parte da carga horária do currículo ao longo do dia do ensino médio. Inventam uma coisa que simplesmente é negar conhecimentos científicos, negar uma formação humanística, negar uma formação completa para os filhos dos que vivem do trabalho, dos trabalhadores e das trabalhadoras”, disse.
“O desafio é interromper o quanto antes esse modelo e nós temos sim capacidade de implementar um outro modelo de ensino médio”, finaliza.
Mudanças
Como garantir que as mudanças no sistema educacional sejam bem-sucedidas e tragam melhorias efetivas para os estudantes? Segundo Fiorelli, antes de pensar no que será feito nas escolas, é necessário um longo diálogo com professores e estudantes, principalmente aqueles vinculados à rede pública de ensino. A permanência estudantil não deve ficar à margem do debate. “Sim, a gente tem que pensar num desenho curricular, do que vai ser ensinado, como vai ser ensinado, mas antes disso, quais vão ser as condições para os estudantes permanecerem na escola? Haverá bolsa de estudos para os estudantes? Isso que é importante, senão eles não ficam o dia todo na escola, eles vão trabalhar, vão fazer um bico na verdade, que se faz muito hoje. Eles precisam ter uma mínima condição para permanecer na escola”, disse.
A docente enfatiza que a reforma deve considerar as condições de estudo e trabalho dos professores. Investir em uma infraestrutura adequada nas escolas é fundamental. “Precisa ser uma escola bonita e não é caro fazer isso. Isso não é gasto, isso é um investimento sem precedentes para você ter um país longe da barbárie, um país que realmente acolhe as pessoas”, acrescenta.
A flexibilidade da carga horária, para desenvolver projetos pedagógicos e planejar aulas, é outra questão abordada. Fiorelli toma os Institutos Federais como exemplo. “É só pegar o modelo dos institutos federais, onde os professores têm cargo horário para preparar suas aulas, se dedicam a uma única instituição, então o contrato de trabalho escola e não por cargo horário. Então o professor precisaria ter tempo para desenvolver projetos dentro da escola. Reforma não existe sem pensar a condição de trabalho do docente, condição do trabalho do estudante, aí a reforma vai adiante”.
Além disso, a organização da escola deve ser pensada sob uma perspectiva abrangente, que integre ciência, trabalho e cultura, e não se limite exclusivamente às demandas do mercado de trabalho, que é dinâmico. Para preparar os alunos para os desafios futuros, é essencial oferecer uma formação sólida, que abarque aspectos técnicos, tecnológicos, científicos, artísticos e culturais. “Para que depois ele tenha, sim, condições de enfrentar as mudanças no mercado de trabalho, ser criativo de fato. Para ser criativo, eu preciso saber coisas. Eu não tenho que ter menos literatura para ser criativo, eu tenho que ter mais literatura, eu não tenho que ter menos música, menos artes, eu tenho que ter mais para eu realmente ter condições de enfrentar um mercado de trabalho dinâmico.
A reforma educacional deve ser uma construção coletiva, envolvendo docentes, estudantes e pesquisadores. “Fazer um pacto em torno desse ensino médio e investir nas condições para quem estuda e para quem ensina. Aí você tem realmente melhorias efetivas para os estudantes”, finaliza.
*Matéria da estagiária Victoria Luiza Menegon, sob supervisão