Luta pela regulamentação já ultrapassa três décadas, aponta SindSaúde-Paraná
“Mais um dia de luta” é a expressão que Olga Estefânia, coordenadora do Sindicato dos Trabalhadores da Saúde Pública do Estado do Paraná (SindSaúde-PR), utiliza para explicar as manifestações de profissionais da Saúde, que ocuparam as ruas de diversas cidades, na última quarta-feira (21), para atos nomeados “Dia D da Enfermagem”. O movimento busca a implantação do piso salarial nacional da categoria, garantido pela Emenda Constitucional 124, aprovada em julho de 2022. O projeto de lei é de autoria do senador Fabiano Contarato (PT).
A medida estipula que enfermeiros contratados em regime de Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) devem receber, no mínimo, R$ 4.750 mensais. Já a remuneração de técnicos de enfermagem passa a ser de R$ 3.325 e a de auxiliares e parteiros, R$ 2.375. Entretanto, no início deste mês, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), através de decisão provisória, suspendeu a Lei sob a justificativa de que a regulamentação foi sancionada sem que os poderes Legislativo e Executivo garantam a sua execução, ou seja, o magistrado solicita que os entes estatais e órgãos públicos competentes apresentem mais informações sobre a origem e viabilidade dos recursos a fim do pagamento do piso.
Para a liderança, a resolução do STF atende interesses do governo federal, já que Jair Bolsonaro (PL), através de seu ministro da Economia, Paulo Guedes, solicitou que a Corte não regulamentasse o piso e as interesses de empresas privadas que dificultam não apenas um rendimento que contemple, inclusive, as perdas inflacionárias, mas outras reinvindicações como o respeito à carga horária. De acordo com ela, desde 1986, isto é, há 36 anos, trabalhadores da Enfermagem buscam a efetivação do piso salarial e maior valorização do trabalho desempenhado pela categoria.
“Acontece que nem as empresas de Saúde querem renunciar a parte muito pequena da sua lucratividade para pagar o salário da Enfermagem e nem o governo federal quer indicar estas fontes de financiamento. O governo federal, inclusive, mandou o ministro [Paulo] Guedes falar com o ministro Barroso para pedir que ele não aprovasse para que o nosso piso fosse suspenso. Nós denunciamos isto nos atos que fizemos, afirma.
Estefânia pontua que o governo federal aprovou o piso apenas com intenções eleitoreiras, mas não considera que a atual gestão tenha respeito e comprometimento com os trabalhadores da Saúde e nem com a área de maneira mais ampla, visto a disseminação de discursos negacionistas durante a crise sanitária provocada pelo novo coronavírus e o desfinanciamento de políticas da pasta voltadas, sobretudo, as camadas mais pobres da população. A proposta de orçamento para 2023, enviada pelo Palácio do Planalto ao Congresso Nacional estabelece corte de 59% no programa Farmácia Popular e de 50% no Mais Médicos, por exemplo.
“O governo federal, o presidente da República [Jair Bolsonaro] é contra o piso da Enfermagem. Ele só aprovou porque foi pressionado pela categoria e também pela conjuntura das eleições e ele não quis sofrer este desgaste. “Basta ver a posição que ele teve durante todo o processo da pandemia, não teve nenhuma empatia com as pessoas que estavam morrendo, usou de escárnio, disse que não era coveiro, que a doença era ‘uma gripezinha’ em vez de se empenhar para trazer a vacina para o Brasil, ele ficou distribuindo Cloroquina, uma medicação que demonstrou que não tem nenhuma ação sob a Covid-19”, ela avalia.
Embora tenha ratificado a legislação, Bolsonaro vetou a correção anual do piso, que seria feita pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC). “O SindSaúde-Paraná não vai descansar até que este piso esteja no contracheque dos profissionais da Enfermagem, tanto do enfermeiro e da enfermeira, do técnico e técnica e auxiliares. Assumimos esta posição. Se esta liminar não for derrubada, nós poderemos entrar em greve por tempo indeterminado. Nós vamos continuar mobilizadas e mobilizando toda categoria para que este piso seja implantado o mais rápido possível e também pela derrubada do veto deste presidente que não tem qualquer empatia com os trabalhadores e trabalhadoras da Saúde no geral”, garante Estefânia.
Londrina
Profissionais da Enfermagem realizaram uma manifestação no calçadão de Londrina nesta quarta-feira (21). Entretanto, a paralisação nacional não teve concordância e adesão de toda categoria. De acordo com Márcio Pereira Machado, diretor do Sindicato dos empregados em estabelecimentos de Saúde de Londrina e Região, o momento exige cautela.
Ele pondera que o entendimento da entidade é que a suspensão do piso pelo STF é um “ato antidemocrático”, pois a solicitação do informe sobre a origem dos recursos não demandava a interrupção do estabelecimento do piso. Para Machado, o encaminhamento soma-se a um cenário mais amplo de desvalorização dos profissionais da Saúde e precarização do trabalho.
“A gente tem o conhecimento que muitos trabalhadores serão penalizados, com desconto do seu dia de trabalho por ter participado das manifestações Brasil afora. A maioria dos protestos foi considerada uma greve abusiva porque não teve todos os trâmites legais conforme diz a legislação. Por isso que em nossa região de Londrina não foi possível fazer essa greve devido a falta de tempo para fazer todos os trâmites legais para que ela fosse considerada justa”, ele explica.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.