Ato acontece nesta quarta-feira (2), Dia de Finados. Concentração está marcada para 9h na Concha Acústica
Familiares e amigos de vítimas de violência policial em Londrina participam de ato na próxima quarta-feira (2 de novembro), Dia de Finados. A manifestação é promovida pelos grupos Justiça por Almas, Movimento Autônomo Popular e Sem justiça, sem paz. A concentração acontece às 9h no estacionamento do Zerão, em frente ao Moringão. A partir das 10h, o cortejo segue até o Cemitério São Pedro, também no centro da cidade.
“Queremos justiça por nossos filhos executados pela polícia militar na cidade de Londrina e região. Em confrontos ilegítimos. Exigimos câmeras de monitoramento nas fardas e viaturas, exames toxicológicos nos policiais”, aponta Hayda Melo da Silva.
Mãe de uma das vítimas, ela conta que a atividade busca chamar atenção para alta letalidade decorrente da ação policial no município. Também procura cobrar investigações mais detalhadas por parte das forças de segurança pública, desconstruindo os discursos corriqueiros disseminados pela polícia militar e veículos de comunicação hegemônicos de que os assassinatos de civis foram por autodefesa, ou seja, decorrentes de “confrontos” e de que “bandido bom é bandido morto”.
“Colocando como justificativa para matar só porque a pessoa tem passagem pela polícia, mandado de prisão, ou por estar cometendo um crime ilícito. O Brasil não existe pena de morte, então não cabe a polícia militar decidir que eles devem morrer. O trabalho da polícia não é matar, é prender. Exigimos que eles façam apenas o seu trabalho”, ela evidencia.
Silva ressalta que longe de oferecer segurança, as forças policiais provocam medo, visto o aumento da repressão. “Está claro que existe um grupo de extermínio em nossa cidade, a Choque e a Rotam saem às ruas para matar. Não para nos servir e nos proteger como deveriam. Queremos chamar a atenção para que enviem uma força-tarefa para fazer uma investigação mais transparente sobre essas execuções. Sabemos que os que se foram não iram voltar, mas não queremos que mais sejam mortos. Exigimos o direito à vida”.
Levantamento do Ministério Público do Paraná, divulgado em abril deste ano, aponta que em 2021, ocorreram 417 mortes decorrentes de confrontos com policiais civis, militares e guardas municipais no estado, aumento de quase 10% em comparação ao ano de 2020, quando ocorreram 380 mortes. Dos óbitos, a maioria das vítimas tinham até 29 anos (62,9%) e eram negras e pardas (53,3%). Londrina é o segundo município com mais mortes em supostos confrontos.
Em entrevista ao Portal Verdade, Claudio Galdino, geógrafo, mestre em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), pesquisador das temáticas violência policial e racismo, observou que, na cidade, uma pessoa negra corre 70% mais risco de ser vítima de violência do que uma pessoa branca, embora, a população negra represente em torno de 26% dos habilitantes. Ele destaca que a maioria das vidas perdidas é de jovens negros.
“Em sua maioria, estas mortes seguem sempre o mesmo roteiro. Essa ‘coincidência’ pode ser entendida como extermínio mesmo e você percebe que não há uma tentativa efetiva de mudar esse quadro por parte do Estado. O verdadeiro genocídio da população negra continua e você não vê políticas públicas que venham minimizar os indicadores, ao contrário, isso é tido como aceitável, vivemos um continuísmo do processo de escravização”, afirma.
Para Galdino, discursos que fogem aos oficiais, como quando há testemunhas que presenciaram os casos e indicam que não aconteceram “confrontos”, mas sim “execuções” tendem a ser deslegitimados. Segundo ele, isto ocorre porque ainda há uma validação de tais mortes. “Vemos com muita frequência, falas que expressam que a pessoa que teve a vida ceifada, ela mereceu aquilo e, principalmente, esse merecimento se dá pela cor da pele”.
O ato é aberto ao público. Organizadores pedem para os participantes irem de roupa preta, sem estampas, pois “estamos de luto, Londrina sangra e ninguém faz nada”, adverte Silva.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.