O Mercado ao qual nos referimos aqui não é o mercadinho do Seu João em alguma esquina no país ou o Mercado Municipal em alguma cidade brasileira. O Mercado aqui citado é o capital financeiro que domina o país, simbolizado pelos bilionários da Faria Lima, glamourosa avenida da cidade de São Paulo. Esse grupo de financistas mantém seu poder econômico pilhando e dilapidando diariamente o Tesouro Nacional por meio do sistema financeiro, incluindo o sistema da dívida pública.
Já falamos sobre isso aqui no artigo: “A falácia da dívida pública e como o sistema financeiro inviabiliza o desenvolvimento do país” de 16 de setembro de 2022.
Algo já não soava bem quando os números econômicos do país, durante 2023 e agora em 2024, começaram a mostrar uma recuperação econômica, com inflação controlada, diminuição do desemprego e aumento do PIB. Mesmo assim, os “economistas” escolhidos pelo Mercado, indo contra tudo isso, diziam que o governo deixava a desejar.
Tais discursos colaboraram o suficiente para que as taxas de juros iniciassem uma subida de forma hipersônica, sem razão alguma, através de uma política monetária escandalosa, ditada pelo mandatário do Banco Central, que foi escolhido pelo Mercado no governo anterior.
Com a atual economia equilibrada, menor taxa de desemprego, aumento do poder de consumo, desenvolvimento industrial, nada explica os atuais 11,25% de taxa SELIC, a segunda maior do mundo, só perdendo para a Rússia, que está há quase três anos em guerra.
É importante lembrar que 1% de aumento na taxa de juros Selic significa que aproximadamente 80 bilhões de reais sairão do tesouro nacional e irão para o Banco Central “pagar” os bancos já bilionários do nosso sistema financeiro. Por ano, estamos tirando da nação mais de 900 bilhões de reais repassados para os banqueiros só pra pagar juros de uma dívida, historicamente forjada, que não para de crescer.
Estima-se que, neste ano, pagaremos próximo a um trilhão de reais. Isso mostra que recursos existem, somos a nona economia do mundo, mas esses recursos são, diariamente, pilhados pela política rentista do Mercado. A cada dez reais arrecadados, quase cinco são direcionados para o pagamento dessa espoliação institucionalizada que suga o país. David Harvey explica isso com o conceito de acumulação via espoliação em seu livro o Novo Imperialismo.
Mas isso tudo ainda é pouco e, também diariamente, o Mercado vem a público através de suas empresas de comunicação, a mídia hegemônica, para falar que os gastos do governo estão muito altos e que é preciso fazer cortes neles, sobretudo gastos públicos e sociais, para equilibrar as contas do governo.
Com uma faca no pescoço do atual governo, o Mercado vem esperando desde setembro o anúncio desses cortes, que ocorreu no final do mês de novembro. Entretanto, numa jogada de mestre, o governo Lula anunciou, junto com os cortes, a isenção de imposto de renda para pessoas com rendimento até R$ 5 mil reais e mudanças na privilegiada aposentadoria militar, outro escândalo derivado da ditadura. Isenção até R$ 5 mil reais significa desonerar grande parte da classe média, aumentar o poder de renda dessa população e, consequentemente, o consumo, tudo aquilo que o Mercado, como demonstra, não quer!
A reação foi rápida, o dólar manipulado pela especulação financeira, em poucas horas ultrapassou a marca histórica dos seis reais. O Banco Central poderia intervir com operações de venda, colocando mais dólares no mercado, já que temos em reserva mais de US$350 bilhões e que vem aumentando, porém, nada foi feito! É importante lembrar que, no governo passado, mais de uma centena de intervenções foram realizadas pela mesma instituição para segurar o preço do dólar.
Como se não bastasse fechar os olhos para a especulação financeira cambial, o Banco Central resolveu, em mais uma escandalosa ação, aumentar em 0,5% ainda mais a taxa de juros. Sim, o país continua refém do Banco Central! No próximo mês, um novo presidente assumirá essa instituição, cabe saber se teremos mudanças ou não nessa política predatória.
As evidências de um Mercado que não quer que o país prospere ficaram mais evidentes ainda quando, na última semana, foi divulgada uma pesquisa Genial/Quaest com 105 agentes do mercado, gestores, economistas, analistas e tomadores de decisão, isto é, os empregados do sistema financeiro, quando não, os próprios patrões bilionários, vamos aos números:
- Para 85% do mercado financeiro, a isenção do imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil não é bem-vinda, pois tende a prejudicar a economia.
- 96% dos entrevistados consideram que a política econômica do país, mesmo com todos os dados positivos de controle da inflação, aumento do PIB e a mais baixa taxa de desemprego, está na direção errada!
- Mesmo com todos os indicadores econômicos positivos do governo Lula, sua reprovação alcançou 90%, saltando 26%; na última pesquisa, a avaliação negativa mais que triplicou!
- Quase 60% do mercado acha que o pacote fiscal do governo não é satisfatório.
- Em relação à vergonhosa taxa de juros, que remunera escandalosamente o mercado financeiro, 98% acreditam que ela deve aumentar no ano que vem.
- 80% do mercado votariam em Bolsonaro, mesmo com todas as mazelas registradas no país durante o seu governo, contra Lula em 2026, que receberia apenas 12% dos votos.
Essas respostas evidenciam algo que não dá mais para esconder ou ser camuflado pela mídia hegemônica: o Mercado não quer o desenvolvimento do país. Sim, quanto pior para o país, melhor para o mercado. Em outras palavras, se o Mercado não gosta das ações governo Lula, estamos no rumo certo! O que é bom para o Mercado, é péssimo para o Brasil.
Fábio da Cunha
Professor Dr. Fábio César Alves da Cunha é geógrafo e docente associado do Departamento de Geografia da Universidade Estadual de Londrina UEL. Possui mestrado em Planejamento Ambiental (UNESP), Doutorado em Desenvolvimento Regional (UNESP) e Pós-Doutorado em Metropolização pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Trabalha com geografia urbana e regional, planejamento urbano e ambiental, geopolítica e metropolização.