A organização das Nações Unidas – ONU foi criada em 1947 com uma intenção muito clara de resolver os conflitos políticos e geopolíticos que levaram às duas guerras mundiais daquele século. No entanto, hoje, estamos vivendo em um mundo no qual as guerras vêm aumentando em quantidade e intensidade. Temos um genocídio claro praticado por Israel na faixa de Gaza há um ano e agora, também, no Líbano.
Temos uma guerra na Ucrânia em seu terceiro ano, que poderia ter sido evitada, e vemos a ONU sem qualquer capacidade de resolver esses conflitos. A ONU virou uma instituição inócua.
Os conflitos políticos deste século entre o Ocidente (EUA e União Europeia) e a Ásia Oriental (China e Rússia) vêm aumentando os vetos para supostas resoluções de paz no mundo. Apenas cinco países têm o poder de veto sobre as resoluções apresentadas: EUA, Rússia, China, Reino Unido e França. Isso quer dizer que, mesmo que 99% dos países da ONU sejam a favor de uma resolução que busque a paz, se um desses cinco países a vetar, tudo volta à estaca zero!
Quando o Conselho de segurança chega a um consenso quanto a resoluções que buscam a paz, como no caso do genocídio praticado por Israel há quase um ano na faixa de gaza e, agora, também no Líbano, essas resoluções são simplesmente ignoradas pelo governo extremista israelense e, mesmo assim, recebem o apoio indireto dos EUA.
É o que aconteceu recentemente com a decisão do Tribunal Internacional de Justiça da ONU, validado pela Assembleia Geral da ONU, que declarou que as ocupações de Israel em terras palestinas são ilegais e pediu para que Israel se retirasse desses territórios em um ano.
O que Israel faz diante disso? Continua com o mais terrível processo de genocídio na faixa de Gaza, no qual mais de 40 mil pessoas foram assassinadas, dessas pelo menos 25 mil mulheres e crianças. Um processo genocida que não se via nesta magnitude desde o holocausto da Segunda Guerra contra o próprio povo judeu.
Mas Israel vai além. Importando-se muito pouco com a libertação dos reféns feitos pelo Hamas, é bom lembrar que muitos reféns foram mortos pelos mesmos bombardeios implementados por Israel no último ano. Israel foca a destruição total de seus inimigos, o Hamas, na faixa de Gaza e o Hezbollah, no Líbano, e, com sua inteligência, vem eliminando os principais líderes desses grupos.
No Início de maio deste ano, Israel atacou a embaixada iraniana em Damasco, uma violação ao direito internacional, causando a morte de sete pessoas, incluindo Mohammad Reza Zahedi, general da Guarda Revolucionária Iraniana. No dia 13 do mesmo mês, o Irã fez um ataque com mísseis convencionais de cruzeiro, balísticos e drones. A maioria desses ataques foram interceptados pelo sistema de defesa de Israel, o Domus de Ferro, maso Irã conseguiu mostrar a vulnerabilidade de Israel como nunca antes! O Irã declarou que tal ação seria legítima, utilizando-se do artigo 51 da Carta das Nações Unidas, que garante o princípio de legítima defesa com relação ao ataque a sua embaixada.
No dia 31 de julho desse ano, um dos líderes do Hamas, Ismail Abdel Salam Haniyeh, foi morto em um ataque terrorista na capital do Irã, onde estava para a posse do novo presidente desse país, Massoud Pezeshkian. Tudo indica um atentado orquestrado por Israel, que não negou. O Irã prometeu vingança pelo abuso de sofrer um ataque em sua própria capital.
Em 25 de agosto, o Hezbollah, braço armado no Líbano e aliado do Hamas, intensifica seus ataques a Israel com foguetes e drones. Israel, da mesma forma, intensifica seus ataques ao território libanês, próximo à fronteira com Israel, visando o Hezbollah como alvo.
No dia 17 de setembro, numa ação considerada terrorista, pagers e walkie-talkies, carregados com material explosivo, explodem junto aos corpos de milhares de cidadãos libaneses, causando mortes, mutilações e cegueira. O alvo são integrantes do Hezbollah, que usava esse tipo de comunicação, mas muitos civis também: mais de 3000 ficam feridos. Israel é responsabilizada por essa ação terrorista.
No dia 20 de setembro, Israel inicia ataques mais incisivos no Líbano, sobretudo em sua capital, Beirute. Em apenas duas semanas causou mais de duas mil mortes, dessas, 127 crianças, mais de 6 mil feridos e milhares de desalojados. Em um dia, 23 de setembro, Israel, com um bombardeio aéreo, provocou as mortes de 569 pessoas, incluindo 50 crianças e 94 mulheres.
Não tem como negar. O genocídio de Gaza está se expandindo também para o Líbano. Com a justificativa de eliminar agentes do Hezbollah, Israel, como em Gaza, assassina milhares de civis aos olhos da ONU e do mundo. Ninguém consegue deter o genocida e terrorista Netanyahu. Este já sabe que, mais cedo ou mais tarde, será preso por crimes de guerra, a não ser que consiga levar os Estados Unidos para uma guerra no Oriente médio, o que não é improvável.
Diante desse cenário trágico, grande parte da mídia ocidental, sobretudo a brasileira, continua com seu árduo trabalho de desinformação. Se esforça diariamente para sensibilizar a audiência, por exemplo, com longas matérias que mostram como é dura a vida dos israelenses que tiveram que abandonar suas casas no norte de Israel, devido aos terroristas do Hamas, mas não diz nada sobre as mais de 25 mil mulheres e crianças assassinadas pelas ações terroristas e genocidas de Netanyahu. A mídia brasileira é tão leviana como o genocida.
No dia 30 de setembro, Israel inicia uma invasão do território Libanês. O conflito se amplia.
No dia 01 de outubro, surge, por enquanto, a única força capaz de se contrapor ao genocídio praticado por Israel: o Irã. Este país ataca Israel com centenas de mísseis balísticos. Muitos hipersônicos, uma surpresa! Esta tecnologia russa, possivelmente, foi repassada para o Irã. Mais de 20 misseis atingiram a Base Militar Israelense de Nevatim; informações que chegam relatam que vários caças F-35 de Israel foram atingidos. Com mísseis hipersônicos, não existe Domus de Ferro! O Irã escancara a vulnerabilidade de Israel pela segunda vez no ano. Israel promete revidar o ataque. O Irã diz que, se houver retaliação, seu novo ataque será brutal e muito mais agressivo contra Israel. Ambos os países possuem armas nucleares. O Oriente Médio pode já ter virado uma bomba relógio nuclear.
É preciso deixar claro que não basta uma nação possuir armas nucleares e não ter a mesma tecnologia de transporte hipersônico, com uma velocidade até 10 vezes maior, como o Irã possui. No primeiro ataque do Irã, seus mísseis demoraram duas horas; neste último, os mísseis atingiram Israel em menos de 10 minutos. Israel e todo o ocidente precisam levar isso em consideração.
Os EUA vão entrar na guerra com Israel as vésperas das eleições americanas? Possivelmente não, por enquanto. China e Rússia já se posicionaram a favor do Irã, seu aliado em comum nos BRICS.
A ONU continua como uma instituição incapaz de interceder nesses conflitos. Faz-se necessária uma reformulação da ONU com urgência frente aos desafios do século XXI. O Presidente Lula, do Brasil, em discurso de abertura na ONU, no dia 24 de setembro, acertou ao afirmar:
“(…) A versão atual da Carta não trata de alguns dos desafios mais prementes da humanidade.
Na fundação da ONU, éramos 51 países. Hoje somos 193.
Várias nações, principalmente no continente africano, estavam sob domínio colonial e não tiveram voz sobre seus objetivos e funcionamento.
Inexiste equilíbrio de gênero no exercício das mais altas funções. O cargo de Secretário-Geral jamais foi ocupado por uma mulher.
Estamos chegando ao final do primeiro quarto do século XXI com as Nações Unidas cada vez mais esvaziada e paralisada.
É hora de reagir com vigor a essa situação, restituindo à Organização as prerrogativas que decorrem da sua condição de foro universal.
Não bastam ajustes pontuais.
Precisamos contemplar uma ampla revisão da Carta. (…)” (Presidente Lula na ONU em 24 de set de 2024).
Resta saber se as nações hegemônicas, sobretudo o ocidente, vão permitir essa revisão ou se vão continuar apostando nos lucros das guerras que assolam o planeta e podem, também, facilmente destruí-lo.
Fábio da Cunha
Professor Dr. Fábio César Alves da Cunha é geógrafo e docente associado do Departamento de Geografia da Universidade Estadual de Londrina UEL. Possui mestrado em Planejamento Ambiental (UNESP), Doutorado em Desenvolvimento Regional (UNESP) e Pós-Doutorado em Metropolização pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Trabalha com geografia urbana e regional, planejamento urbano e ambiental, geopolítica e metropolização.