Entidade alerta para o desmonte da Caapsml e aumento nas cobranças dos serviços
A possibilidade de privatização dos serviços prestados pela Acesf (Administração dos Cemitérios e Serviços Funerários de Londrina), conforme projeto de lei nº 23/2024, proposto pelo poder Executivo local e em tramitação na Câmara de Vereadores, tem despertado críticas e preocupações entre o Sindserv (Sindicato dos Servidores Municipais de Londrina).
Em entrevista ao Portal Verdade, o presidente do Sindicato, Fábio Molin, pontua a contrariedade à medida. A liderança ressalta que é necessário que haja uma atualização do regimento da Acesf, estabelecido em 1977, mas discorda que a concessão para a iniciativa privada seja o caminho.
Molin destaca os impactos da iniciativa para os servidores. Para ele, um dos principais reflexos é o desmonte da Caapsml (Caixa de Assistência, Aposentadoria e Pensões dos Servidores Municipais de Londrina).
O fundo é responsável pelo plano de seguridade social dos servidores municipais ativos e inativos de Londrina. Contudo, a partir da terceirização dos serviços, as empresas terão liberdade para determinar suas próprias formas de contratação, sem a realização de concursos públicos.
“O que a gente teme, principalmente, é que quando o estado deixa de oferecer um serviço que é uma necessidade para a população e coloca nas mãos de uma empresa, essa empresa vai contratar trabalhadores vinculados ao INSS [Instituto Nacional do Seguro Social], trabalhadores via CLT [Consolidação das Leis do Trabalho]. Então, pessoas concursadas deixarão de contribuir para a Caapsml”, alerta.
Outro ponto de atenção refere-se aos servidores atualmente alocados na Acesf, que poderão ser transferidos para outros órgãos da administração municipal.
“Esses servidores hoje que prestam o serviço durante o sepultamento, demais serviços realizados dentro dos cemitérios, esses servidores, em tese, poderão ser realocados para outros locais e isso realmente nos preocupa porque as pessoas fizeram um concurso, se dispuseram anos e anos trabalhando nesse serviço e de uma hora para outra podem ser retirados desse local”, compartilha.
A proposta foi tema de audiência pública coordenada pela Comissão de Justiça, Legislação e Redação na última segunda-feira (4). A reunião foi uma solicitação da pasta antes de emitir seu parecer.
O projeto de lei original já havia recebido pareceres favoráveis da Comissão de Finanças e Orçamento da Câmara. Os vereadores da Comissão de Administração, Serviços Públicos, Fiscalização e Transparência também votaram a favor da primeira proposta, mas fizeram uma série de apontamentos de melhoria.
Experiência paulista demonstra aumento dos valores
Molin também observa as consequências para a população de maneira mais ampla. Ele lembra do repasse da gestão de 22 cemitérios municipais à iniciativa privada na cidade de São Paulo.
Levantamento do Sindsep (Servidores Municipais de São Paulo) identificou que, após a terceirização realizada em março de 2023 pelo prefeito reeleito Ricardo Nunes (MDB), os preços dos enterros e cremações triplicaram na capital paulista.
“É preocupante, os preços da Acesf são preços acessíveis às pessoas, em alguns locais já existe a experiência, até São Paulo recentemente foi feito um estudo, depois que foi terceirizado o serviço ampliou o valor do sepultamento e dos demais serviços prestados. A sociedade precisa refletir sobre isso”, adverte.
Molin também questiona o discurso neoliberal de que os serviços prestados pela iniciativa privada são mais eficientes do que os realizados pelo setor público. “A terceirização nunca se mostrou economicamente mais eficaz e nem do ponto de vista de entregar um serviço melhor do que a própria administração pública faz”, analisa.
O sindicalista defende o maior investimento, via recursos públicos na Acesf, e a realização de processos seletivos para contratação de novos servidores estatutários.
“Esse é um problema, acho que a sociedade precisa entender que hoje a Acesf trabalha com muita dificuldade em razão do não investimento, trabalha com falta de pessoas e precisa realmente que seja investido, não que seja repassada para uma empresa tocar esse serviço”, assinala.
Atualmente, a Acesf possui aproximadamente 100 servidores, a maioria concursados, que prestam diversos serviços, desde atendimento à população a processos internos como preparação dos velórios, sepultamento, exumações, entre outros. Ainda, parte do quadro é composto por trabalhadores terceirizados responsáveis pela limpeza e zeladoria.
Se o texto for aprovado, a Acesf manterá a exclusividade dos seguintes serviços: gerenciar, arquivar e manter todos os registros de óbitos; remoção e transporte dos corpos, nas estradas do município, salvo no caso em que o transporte deva ser feito pela autoridade policial; fornecer urnas mortuárias e demais artigos de ornamentação; realizar toda a ornamentação necessária às urnas, às capelas e aos velórios; proceder à preparação dos corpos; conceder autorização e instalação dos velórios; arrecadar taxas e emolumentos, instituídos pela administração municipal, bem como as tarifas devidas pelos serviços prestados pela autarquia.
De acordo com Molin, o Sindserv tem acompanhado o andamento do projeto de lei e mediado mudanças no texto original junto à Prefeitura a fim de chegar a um “equilíbrio” entre todos os envolvidos.
“Estamos já conversando com a administração, propondo algumas alterações nesse projeto, que é necessário sim em alguns pontos, atualizar a legislação, mas a gente também gostaria que tivesse um entendimento por parte de quem está elaborando, que quem já faz parte do quadro [de servidores] que não tenha nenhum tipo de prejuízo e, claro, pensar também na nossa comunidade que a Acesf, presta um serviço de qualidade, acessível às pessoas, que esse serviço não seja de um dia para o outro cobrado de uma forma muito acima do que é hoje”, conclui.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.