Mesmo antes do início da guerra entre Rússia e Ucrânia, já havíamos apontado, no artigo “Dez pontos para entender o conflito Rússia x Ucrânia”, que uma das causas de manipular a Ucrânia, colocando-a num confronto direto contra a Rússia, era o gasoduto Nord Stream 2, um segundo gasoduto que, prestes a ser inaugurado naquele momento, dobraria a capacidade de fornecimento de gás da Rússia para a Alemanha e demais países da Europa. Assim foi colocado no artigo:
“- Alguns especialistas em geopolítica apontam que o verdadeiro interesse dos EUA neste conflito não é a Ucrânia, mas sim, o “Nord Stream 2”, um segundo gasoduto no mar Báltico que fornecerá mais gás natural da Rússia para a Alemanha. Este país vem, nos últimos anos, desligando suas usinas termonucleares e precisa urgentemente daquela fonte de energia. O Norte Stream 2, mais do que reafirmar as relações comerciais entre Alemanha e Rússia, poderá, com o tempo, abrir possibilidades do abandono do dólar americano em suas transações. Isso contribuiria para uma perda ainda maior da hegemonia americana e da própria OTAN na Europa Ocidental”.
No dia 07 de fevereiro de 2022, o Presidente Biden, em coletiva de imprensa conjunta com o chanceler alemão Olaf Scholz, afirma: “Se a Rússia invadir – isso significa tanques ou tropas cruzando a fronteira para a Ucrânia novamente – não haverá mais Nord Stream 2”. “Eu prometo a vocês”, disse Biden, “que vamos acabar com isso”.
A guerra iniciou apenas duas semanas depois dessa fala do Presidente Americano e ficou claro que a guerra poderia ter sido evitada com uma declaração da Ucrânia ou da OTAN, que esta organização não avançaria para o território Ucraniano, mas isso não ocorreu, o que demonstrou que era interesse dos EUA prosseguir com o conflito.
No dia 26 de setembro de 2022, um ataque terrorista submarino explodiu o Nord Stream 2, o maior ataque de terrorismo industrial da história! Causou enormes prejuízos para a Rússia e para algumas empresas alemãs que colaboraram com a construção deste gasoduto.
No último dia 8, o renomado jornalista Seymour Hersh revelou, numa reportagem investigativa, que a Marinha americana, sob direção do presidente Biden, foi responsável pelo ataque terrorista ao gasoduto Nord Stream, possivelmente com a ajuda da Noruega. A operação foi ordenada pelo Presidente Joe Biden e planejada pelo secretário de Estado Antony Blinken, pela sub-secretária de Estado Victoria Nuland e o conselheiro de segurança nacional Jake Sullivan. Logicamente, a mídia corporativa ocidental não quis comentar o relatório.
Quais seriam as razões para se destruir essa importante infraestrutura de energia para a Europa? Várias: com o Nord stream 2, a Rússia dobraria suas exportações de gás para a Europa, algo em torno de 40 bilhões de dólares, um mercado que os EUA perderiam, assim como a Noruega. Além disso, a Europa ganharia com o fornecimento de gás natural de baixo valor, o que contribuiria ainda mais para o desenvolvimento de sua indústria. O Nord stream 2 seria bom para a Rússia e para a Europa, só não era bom para os EUA, cujo poder é abalado por esta parceria! Os Estados Unidos estão perdendo sua hegemonia econômica e militar e precisam, de qualquer forma, esmagar os centros emergentes de poder que a ameaçam. O Nord Stream 2 representa uma integração Europa-Rússia que ameaça o poder regional americano sobre a Europa. Com essa integração não são mais necessárias bases militares dos EUA na Europa, não há mais necessidade de se comprar armamentos caros da indústria bélica americana, não há necessidade da OTAN e, a curto prazo, de negociar em dólares, algo que já vem ocorrendo entre Rússia e China.
Depois deste ataque terrorista, os valores do gás subiram, beneficiando os EUA e a Noruega, os novos fornecedores em decorrência da guerra. Fica nítido o papel nefasto, vassalo e traidor dos líderes europeus. Nunca a Europa foi tão mal governada a ponto de seus dirigentes permitirem a degradação contínua de sua economia com o aumento exponencial do preço do gás, que afeta as indústrias, causando falências, desemprego, inflação e uma crise social que vem aumentando diariamente, só para manter as políticas neoliberais de um capitalismo financeiro mundial que não se preocupa se o território europeu será arrasado pela economia ou por bombas numa guerra que se agrava entre potências nucleares.
Fábio da Cunha
Professor Dr. Fábio César Alves da Cunha é geógrafo e docente associado do Departamento de Geografia da Universidade Estadual de Londrina UEL. Possui mestrado em Planejamento Ambiental (UNESP), Doutorado em Desenvolvimento Regional (UNESP) e Pós-Doutorado em Metropolização pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Trabalha com geografia urbana e regional, planejamento urbano e ambiental, geopolítica e metropolização.