Em 2020, 26% dos paranaenses não tinham acesso a esgoto tratado
Esta segunda-feira, 5 de junho, é considerado Dia Mundial do Meio Ambiente. A data foi estabelecida em 1972, na Assembleia Geral das Nações Unidas e tem como finalidade conscientizar a população a respeito da importância de preservar os recursos naturais. Mas o marco também abre espaço para outras discussões como: todas as pessoas possuem acesso aos bens oferecidos pela natureza? E todos os segmentos são afetos de mesma maneira pelos processos de degradação?
É sob este contexto que surge as discussões acerca do “racismo ambiental”, termo popularizado a partir da década de 1960, para nomear processos de discriminação e exclusão aos quais populações mais empobrecidas são submetidas através da devastação da natureza.
O debate denuncia a distribuição desigual dos impactos ambientais entre a população, sendo a camada marginalizada e historicamente invisibilizada a mais afetada pela poluição, por exemplo. “Há um senso comum, e até um mito criado em torno da questão ambiental, de que ela nos atinge a todos igualmente”, conta Marcos Bernardino de Carvalho, professor de Gestão Ambiental.
Negros, indígenas e quilombolas são mais afetados
O estudo “Injustiça socioambiental e racismo ambiental”, elaborado pelo Instituto Pólis e publicizado pela Agência Pública, observou três capitais brasileiras — Belém, Recife e São Paulo e identificou reflexos que se repetem em outras regiões do país.
Em Belém, 75% das pessoas que moram em áreas de risco são negras, mostra a pesquisa. Em Recife, 55% da população é negra, mas nas regiões com risco de inundação o valor sobe para 59%, e atinge 68% onde há risco de deslizamento. Em São Paulo, apenas 37% da população é negra em comparação com a média brasileira de 54%. Mas a maioria das pessoas que vivem em regiões de risco são negras (55%).
Na capital paulista, 8,4% das famílias são chefiadas por mulheres com renda de até um salário mínimo — valor que sobe para 12,6% nas áreas de risco. A média do rendimento das famílias que vivem em áreas de riscos ambientais é de R$1,6 mil, enquanto a média da cidade é consideravelmente maior: R$3,5 mil.
“Os impactos ambientais nas cidades são socialmente produzidos: não são apenas fruto de eventualidades climáticas. No entanto, a distribuição de suas consequências se dá de forma desigual no território urbano. Esse desequilíbrio é, em parte, a expressão da injustiça socioambiental e do racismo ambiental nas cidades”, afirma o relatório.
Ainda, a investigação indica que as áreas de risco não despertam o interesse do mercado imobiliário. Majoritariamente, estas regiões têm sido ocupadas por famílias de baixa renda que encontram dificuldades para acessar políticas habitacionais. Além disso, estas localidades possuem menos oferta a serviços básicos como água potável, saneamento e tratamento de lixo.
Dados da 14ª edição do Ranking do Saneamento, publicado pelo Instituto Trata Brasil, em parceria com a GO Associados, com foco nos 100 maiores municípios brasileiros identificou que, em 2020, quase 35 milhões de pessoas no Brasil vivem sem água tratada e cerca de 100 milhões não têm acesso à coleta de esgoto, resultando em doenças que poderiam ser evitadas, e que podem levar à morte por contaminação.
“Não é coincidência que esses bolsões de gente vulnerabilizada, que acaba sendo vitimada por esse processo de degradação, acabam sendo as pessoas não apenas vulnerabilizadas e empobrecidas, mas as pessoas negras”, afirma o professor em entrevista ao jornal da Universidade de São Paulo (USP).
Paraná
Embora, o Paraná apresente um dos mais altos indicadores de saneamento básico no Brasil: em 2020, aproximadamente 2,2 milhões de paranaenses ainda não possuíam acesso a serviços de esgoto no estado. O dado foi levantado pela Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (ABCON).
Ainda segundo a ABCON, cerca de 22,2 mil paranaenses foram internados com doenças causadas pelo consumo de água contaminada, como diarreia bacteriana e gastroenterite, apenas nos dois primeiros meses daquele ano.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.