Melhorias salariais, assistência médica e seguro de vida estão entre as principais demandas dos trabalhadores
Seis reais. Esse é o valor mínimo que entregadores de aplicativos como iFood e Rappi recebem atualmente por cada entrega realizada no Brasil. De acordo com um relatório conduzido pela Oxford Internet Institute e pelo WZB Berlin Social Science Centre, as plataformas digitais brasileiras não oferecem padrões considerados mínimos de trabalho decente.
O estudo teve como base cinco critérios: remuneração, condições de trabalho, contratos, gestão e representação justas. Nenhum app no país obteve mais de 2 pontos em um máximo de 10. Sem qualquer vínculo empregatício que assegure direitos trabalhistas previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), motoboys e ciclistas entregadores têm denunciado a precariedade trazida pela falta de regulamentação.
“Hoje, estamos numa situação extremamente precária em relação ao iFood. A tarifa de entrega sempre vem aumentando para os clientes. Mas nós, entregadores, continuamos recebendo míseros R$ 6,00 por entrega, às vezes R$ 6,70 para 6 km rodados ou mais. Isso sem falar quando coletamos dois pedidos e recebemos R$ 1,00 a mais por uma entrega, não temos nem um seguro decente na plataforma”, relata Talisson Vieira, de 23 anos, entregador do iFood Pedal de Porto Alegre. Essa realidade é sentida por aproximadamente 1,5 milhão de trabalhadores que atuam no serviço de entrega no Brasil.
“Trabalhadores de aplicativo não são microempreendedores”
No dia 25 de janeiro, estava prevista para acontecer uma paralisação nacional em busca de melhorias salariais, assistência médica e seguro de vida para a categoria. No entanto, os entregadores suspenderam a greve após o secretário de Economia Solidária, Gilberto Carvalho, afirmar, em reunião na última quarta-feira (17) com representantes de centrais sindicais, que a regulamentação do trabalho por aplicativo é prioridade para o governo Lula (PT).
O ministro do Trabalho, Luiz Marinho, comparou a situação de trabalhadores de aplicativos com a de escravos. “Nós acompanhamos a angústia dos trabalhadores de aplicativos, que muitas vezes têm que trabalhar 14h, 16h por dia para poder levar pão e leite para casa. Isso, no meu conceito de trabalho, beira o trabalho escravo”, disse Marinho, durante encontro com sindicalistas no Palácio do Planalto nesta quarta-feira (18), que contou com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Na ocasião, Lula assinou a portaria interministerial de criação de um grupo de trabalho para elaboração de projeto de lei que institui a Política de Valorização do Salário Mínimo (PVSM). O grupo terá vigência de 45 dias, renováveis por igual período, e tratará, entre outros pontos, da regulamentação de quem atua em apps.
Melhorias salariais
Os profissionais demandam que a taxa mínima paga por entrega aumente de R$ 6,00 para R$ 8,00. Também exigem a extinção das chamadas “entregas duplas ou triplas”, que é quando os entregadores precisam levar mais de um pedido na mesma rota sem remuneração proporcional, isto é, sem receber os valores integrais das entregas feitas dentro de uma mesma viagem.
Assistência médica
Apenas um a cada quatro (23%) entregadores e motoristas autônomos pagam contribuição ao INSS, segundo levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Isso significa que 77% não contribuem com a Previdência Social e não estão protegidos em casos de acidentes ou de doenças que exijam afastamento do trabalho. Além disso, não possuem o seu tempo de trabalho contado para a aposentadoria.
Nesse sentido, os entregadores pedem um plano de assistência mais eficaz e que os aplicativos sejam obrigados a fornecer equipamentos de proteção individual, como capacetes e coletes refletivos.
Seguro de vida
O iFood tem uma página dedicada aos seguros no Portal do Entregador com detalhes sobre as coberturas e meios de contatar a seguradora diretamente pelo site.
Mas a falta de implementação do suporte preocupa quem trabalha no app. O caso do entregador Yuri de Souza, de 24 anos, que morreu fazendo entrega para o iFood em 2022, evidencia o descaso. A família do jovem alega não ter conseguido acesso ao auxílio-funeral a tempo e que teve o seguro de vida negado. Onze dias depois de sua morte, a conta de Yuri foi desativada por “má conduta”.
De acordo com o iFood, a cobertura foi ampliada para trazer mais proteção às mulheres entregadoras, como licença-maternidade, indenização em casos de câncer de mama e de colo do útero, e às famílias dos profissionais em caso de morte, como auxílio-funeral e ajuda financeira para quem precisa cuidar dos filhos em caso de doença ou acidente.
O mercado de apps de entregas e o subemprego
Foi em meio à crise da covid-19 que o boom das plataformas de delivery aconteceu no Brasil. Devido às restrições de circulação impostas e às recomendações para ficar em casa, o delivery de alimentos subiu 187% no primeiro ano da pandemia no Brasil, conforme análise realizada pela startup de gestão de finanças pessoais Mobills.
Somado ao fator sanitário, o crescente desemprego fez com que os trabalhadores recorressem a esses serviços como complemento de renda ou mesmo como único meio de sobrevivência. Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) e do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV IBRE), entre 2020 e os primeiros meses de 2022, o país ganhou 1,42 milhão de trabalhadores informais.
Fonte: Redação Brasil de Fato