Governador não deu sanção expressa ao projeto no prazo legal e agora caberá ao legislativo fazer valer a Lei Pétala
O governador Ratinho Jr. (PSD) não terá o nome associado à Lei Pétala, que passou a garantir o acesso sem barreiras a medicamentos à base de canabidiol no Paraná. Encaminhado ao Palácio Iguaçu depois de aprovado por ampla maioria na Assembleia Legislativa, em meados dezembro, o texto recebeu sanção tácita, ou seja, ganhou status de lei de forma automática diante do “silêncio” do governador.
O recurso está previsto na Constituição do Estado. A norma diz que projetos aprovados pelos deputados precisam ser sancionados ou vetados pelo chefe do poder Executivo em até 15 dias. Caso não haja reação do governador no prazo, o “silêncio importará em sanção” e a lei deve voltar para a Assembleia e ser promulgada pelo presidente do Legislativo.
O ato da promulgação foi marcado para o dia 13 de fevereiro, exatamente dois meses após a aprovação da proposta, informou nesta sexta-feira (3) o mandato do deputado Goura (PDT), um dos autores do projeto. A iniciativa também teve a assinatura dos agora ex-deputados Michele Caputo (PSDB) e Paulo Litro, correligionário de Ratinho.
Conservadorismo e cannabis
Embora legal, o rito não é comum e causou estranheza. Há quem interprete na omissão de Ratinho Jr. uma tentativa de não gastar capital político com um tema que é erroneamente polemizado por uma parte do eleitorado conservador alinhada ao mandatário. Há também quem a analise como uma perda de oportunidade do governador em agilizar a sanção e referendar uma medida de conquistas já bastante importantes no país.
Na última terça-feira (31), o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), organizou cerimônia para sancionar lei que obriga o estado paulista a fornecer gratuitamente remédios elaborados a partir da Cannabis. No evento, o ex-ministro de Jair Bolsonaro (PL) chegou a expressar emoção ao falar sobre os benefícios das fórmulas ao tratamento de um sobrinho portador de síndrome rara causadora de múltiplas convulsões diárias.
Assim como Ratinho, Freitas segue como aliado devoto do ex-presidente, mas usou o lado técnico da moeda de seu governo para fazer valer a decisão dos parlamentares. Bolsonaro, ao contrário, desprezou durante todo seu mandato a discussão nacional sobre o uso dos remédios com Cannabis sativa e chegou a se referir ao projeto de lei federal que trata do tema como “porcaria”.
Canabidiol no Paraná
No Brasil, o acesso a produtos à base de Cannabis medicinal foi aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em 2015, após pressão de famílias de pacientes e entidades defensoras da causa para o acesso aos produtos. O primeiro registro nacional de fórmula medicamentosa à base Cannabis sativa – de onde se extraem a maconha e o cânhamo – saiu em 2017.
Desde então, a sociedade civil tem mobilizado para garantir o avanço dos debates que reconhecem o canabidiol como tratamento de saúde em casos específicos.
No caso do Paraná, a medida não impõe obrigatoriedade ao governo estadual de ofertar, mas destrava o acesso aos produtos prescritos desde que os requisitos impostos sejam cumpridos. Em todo o estado, até o ano passado, 196 pessoas já haviam assegurado o uso de produtos à base da substância para fins terapêuticos, a um custo de R$ 3,44 milhões entre 2017 e 2021.
“A análise política que faço [de o governador não ter sancionado ativamente o projeto da Lei Pétala] é de que é bastante estranho, até porque o governo do estado já vem agindo na questão do uso da Cannabis medicinal. Há inciativas importantes do Tecpar em relação a isso, e a Sesa [secretaria da Saúde] já fornece medicamentos para quem ganhou na justiça o direito de acessá-los”, disse ao Plural o deputado Goura.
Recentemente, o Instituto de Tecnologia do Paraná (Tecpar) assinou acordos de cooperação técnica com três empresas para viabilizar transferência de tecnologia para a produção e comercialização de medicamentos e produtos à base de Cannabis para fins medicinais de uso humano.
Medo de quê?
Ao defender votação favorável ao projeto da Lei Pétala em dezembro passado, o então líder do governo na Assembleia, Marcel Micheletto (PL), chegou a afirmar não ter recebido orientação contrária do governador e defendeu a proposta. Pesou o fato de o Paraná ter uma empresa produtora de medicamento formulado com a substância. O laboratório Prati-Donaduzzi, sediado Toledo, tem autorização da Anvisa para a fabricação de um produto medicinal que leva Cannabis na composição.
“Não dá para saber se o governador ficou com medo de se associar a essa pauta ou foi para não da visibilidade ao meu trabalho, já que sou da oposição. A questão é que essa é uma pauta que superou a questão de esquerda e direita. É um direito, uma questão de saúde”, acrescentou o deputado do PDT.
Questionado sobre o fato de o governador não ter dado sanção expressão ao projeto, o Palácio Iguaçu disse não ter qualquer “motivo especial” para justificar o fato. “O projeto mencionado foi sancionado pelo governador de forma tácita, o que ocorre quando o gestor não se manifesta sobre a questão em 15 dias após ter recebido a proposição. O projeto retornou à Assembleia Legislativa no dia 18 de janeiro”, diz nota enviada à reportagem.
Fonte: Plural Jornal