No Brasil, mulheres e pessoas não-binárias são as que mais apresentam cansaço excessivo e sintomas depressivos
Estudo publicado na última quarta-feira (15), pelo Future Forum, instituto que focaliza suas pesquisas na organização do mercado de trabalho em escala global, trouxe informações preocupantes sobre a saúde mental dos trabalhadores. De acordo com a investigação, no final de 2022, a parcela de funcionários com Síndrome de Burnout (também conhecida como Síndrome do Esgotamento Profissional) superou os índices do pico da pandemia de Covid-19.
Quase metade dos trabalhadores (42%) finalizaram o último ano com sintomas do transtorno. O levantamento ouviu 10.243 trabalhadores de seis países: Alemanha, Austrália, Estados Unidos, França, Japão e Reino Unido. Todas as localidades registraram aumento face a 2021. Contudo, as maiores taxas foram identificadas na Austrália (50%), França (48%) e Reino Unido (48%).
No mesmo período, a OMS (Organização Mundial da Saúde) classificou a doença como “uma síndrome resultante de um stress crônico no ambiente de trabalho que não foi administrado”. A psicóloga Renata Gonçalves avalia que o reconhecimento da enfermidade enquanto um fenômeno ocupacional, ou seja, relacionado ao mercado de trabalho é de grande importância para discussão e superação do problema que tem acometido cada vez mais pessoas no mundo que tem entre seus principais sintomas sensações de esgotamento físico e mental, insatisfação com o próprio desempenho e distanciamento social.
“Estes dados demonstram a importância de revermos as formas como as relações de trabalho estão organizadas. Sob o capitalismo e políticas neoliberais que buscam apenas o lucro, alcançado com a exploração irrestrita da força do trabalho, metas abusivas, assédios são normalizados nos ambientes corporativos. Os resultados são o adoecimento, a reafirmação de uma lógica desumanizadora. É como se o trabalhador não pudesse ter vida para além das empresas”, aponta.
Trabalhadores brasileiros também estão adoecidos
Investigação desenvolvida pela empresa Gattaz Health & Results, em parceria com o Instituto de Psiquiatria da USP (Universidade de São Paulo), em 2022, identificou que 18% dos profissionais brasileiros, um a cada cinco, sofrem com Síndrome de Burnout. Além disso, 43% relataram sintomas depressivos e 24% apresentaram queixas relacionadas à ansiedade, embora somente 5% tenham sido diagnosticados com o transtorno.
Em complementariedade, estudo realizado com 188 mil funcionários de 419 empresas brasileiras, observou que os níveis de estresse excessivo no ambiente trabalho são maiores entre mulheres e pessoas não-binárias. Elas apresentam 12% mais sintomas de ansiedade do que homens e 73% mais casos de Burnout. Por sua vez, pessoas não-binárias relatam 71% mais exaustão mental. A pesquisa foi conduzida pela FIA Employee Experience em 2022.
O principal motivo sugerido em comum pelos entrevistados foi: sobrecarga de trabalho. Ainda, segundo o levantamento, enquanto para homens o fator que traz mais desgaste é remuneração baixa, para mulheres, é o convívio com colegas de trabalho, o elemento mais estressante.
Gonçalves ressalta as duplas jornadas de trabalho desempenhadas pela maior parte das mulheres, visto a responsabilização com afazeres domésticos e cuidados com filhos, entre outros dependentes, de maneira proporcional aos homens. Também observa que os preconceitos ressoam nos ambientes corporativos, comprometendo a saúde mental dos trabalhadores que compõem grupos minorizados.
“Mulheres, negros, comunidade LGBTQIA+ enfrentam mais dificuldade para conseguirem inserção do mercado de trabalho, principalmente, o formal. Com isso, a pressão para se manterem nos postos é ainda maior. Além do acúmulo de trabalho, estas pessoas apresentam preocupação exacerbada com a qualificação, participando de cursos, eventos. É uma tentativa de demonstrarem que são capazes de ocuparem aquela vaga”, observa.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.