Levantamento identificou que denúncias saltaram, principalmente, entre 2020 e 2021
Levantamento realizado pela empresa de consultoria jurídica, DataLawyer, e publicizado pela Folha de São Paulo no último sábado (18), demonstra que a quantidade de funcionários que recorreram à Justiça para que suas jornadas de trabalho não sejam extrapoladas quase dobrou nos últimos quatro anos.
Em 2018, foram registrados 1.329 pedidos. No ano seguinte, 2019, o número saltou para 1.576 queixas. Já em 2020, foram contabilizadas 1.903 denúncias e, em 2021, o índice chegou a 2.396. No último ano, 2022, chegaram 2.666 novos processos. São Paulo lidera os pedidos com 4.091 processos em andamento, seguido de Minas Gerais (1.442 ações) e Rio de Janeiro (1.399 petições).
O estudo identificou aumento do uso de processos trabalhistas com a indicação dos termos “direito à desconexão”, “desconexão do trabalho” ou “desconectar do trabalho”, sobretudo, entre 2020 e 2021. As solicitações incluem não responder e-mails ou atender telefonemas referentes a assuntos corporativos após o fim do expediente.
Ainda, segundo a investigação, desde 2014, pelo menos 23.750 ações foram motivadas pelo não cumprimento da carga horária chegaram à Justiça do Trabalho em todo o país. O valor pago em indenizações ultrapassa R$ 5 bilhões. A advogada trabalhista Natalia Vilas Boas considera que o crescimento das petições está relacionado a maior adesão do trabalho remoto, modalidade que passou a ser mais utilizada pelas empresas a partir de 2020, com a crise sanitária provocada pela Covid-19 e a necessidade de isolamento social.
“Certamente, há um impacto do home-office que passou a ser mais adotado pelos ambientes corporativos nos últimos dois anos. Muitas empresas permanecem neste modelo com a retomada das atividades presenciais. Embora, profissões mais precarizadas não tenham esta opção, é uma realidade que tem modificado o mercado de trabalho no Brasil”, avalia.
Segundo ela, apesar de o trabalho remoto propiciar benefícios para os funcionários como a economia de tempo e dinheiro destinados ao deslocamento, também traz dificuldades a exemplo de separar compromissos particulares dos profissionais e dissociar os ambientes de trabalho e descanso, visto que, na maioria das vezes, os trabalhadores desenvolvem suas jornadas de casa.
“Notamos muitos relatos de trabalhadores que recebem solicitações após o horário de trabalho. Embora não tenha respaldo legal, permanece a ideia de que pelo colaborador estar em sua casa deve ficar disponível o tempo todo. Mas é preciso desconstruir esta ideia alicerçada na exploração desmedida da força de trabalho”, observa.
Descanso remunerado é direito
Há mais de sete décadas, a legislação trabalhista determina que todo trabalhador com carteira assinada tem direito à descanso semanal remunerado. “Todo empregado tem direito ao repouso semanal remunerado de vinte e quatro horas consecutivas, preferentemente aos domingos e, nos limites das exigências técnicas das empresas, nos feriados civis e religiosos, de acordo com a tradição local”, considera a Lei nº 605 de 1949.
Em casos de desrespeito à carga horária, o colaborador deverá acionar a Justiça do Trabalho. Acompanhe canais de queixas, disponíveis aqui.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.