O Supremo Tribunal Federal já encaminhou 10 pedidos de investigação contra Bolsonaro em instâncias inferiores
Estimular um golpe de Estado, colaborar para a morte de 700 mil pessoas durante a pandemia de Covid-19 e promover um genocídio ao povo yanomami parecem crimes mais graves do que a adulteração de carteiras de vacinação.
No entanto, o caminho utilizado pelo relator do inquérito das milícias digitais, o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, parece ser o mais curto para colocar o ex-presidente Jair Bolsonaro no banco dos réus e, assim, responder por todos os crimes que cometeu na sua gestão (e antes dela também).
A Operação Venire, deflagrada nesta quarta, 3, pela Polícia Federal, no bojo das investigações sobre as milícias digitais, apura os possíveis crimes de um grupo suspeito de adulterar dados sobre a vacinação no Ministério da Saúde para beneficiar a entrada de Bolsonaro e seus aliados em solo americano.
Liderada pelo ajudante de ordem do ex-presidente, o tenente-coronel Mauro Cid, a quadrilha usou o acesso aos dados da Saúde, como o Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI) e a Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS), para enganar a imigração dos Estados Unidos e conseguir entrar no país sem sem imunização.
A operação cumpriu 16 mandados de busca e apreensão, inclusive na mansão de Jair Bolsonaro, em Brasília, e prendeu preventivamente seis aliados do ex-presidente. Entre os presos, Mauro Cid escondia R$ 160 mil em notas dentro da sua residência.
Quatro meses depois do fim do mandato e a perda do foro privilegiado, a Justiça bate na porta do capitão para fazê-lo responder por seus crimes. E segundo especialistas ouvidos pela imprensa do país, Bolsonaro terá um longo inverno pela frente.
A imprensa nacional começa a apurar a quantidade de casos em que Bolsonaro pode se tornar réu, além das possíveis penas que ele poderá cumprir nos próximos anos. A BBC News Brasil conversou com alguns especialistas de diferentes áreas do direito para compreender as consequências jurídicas para o ex-presidente no caso da adulteração dos dados da Saúde.
Segundo a BBC News Brasil, Bolsonaro pode pegar até 20 anos de cadeia. O jornal calcula a pena máxima dos crimes de falsificação de dados (máx. seis anos), uso de documentos falsos (máx. seis anos), corrupção de menores (máx. quatro anos), infração de medidas sanitárias preventivas (máx. um ano) e ação criminosa (máx. três anos).
Já o Poder 360 fez o levantamento de 25 investigações em que Bolsonaro pode se tornar réu. Dentre elas, o inquérito das milícias digitais, investigações sobre a tentativa de golpe de estado no 8 de janeiro, o caso das joias, a condução do país durante a pandemia de Covid-19 e outros.
Compilamos os levantamentos das principais investigações contra Jair Bolsonaro. Confira abaixo:
Milícias Digitais:
A BBC News Brasil escutou alguns especialistas para entendermos quais são as possíveis consequências para o ex-presidente Bolsonaro nas investigações sobre os crimes cometidos pelo grupo acusado de adulterar dados nos sistemas do Ministério da Saúde. Bolsonaro pode pegar 22 anos de prisão, se somados os delitos infligidos.
Falsificação de dados: chamado de peculato digital (crimes praticados contra a administração pública), inserir dados falsos em sistema de informação está previsto no Código Penal. O artigo 313-A estabelece pena de 2 a doze anos de prisão e multa.
Uso de documento falso: segundo as investigações da Polícia Federal, o grupo investigado na Operação Venire adulterou os dados do Ministério da Saúde com objetivo de imprimir carteiras de vacinação falsas para adquirir benefícios imigratórios. O Código Penal prevê pena de dois a seis anos de prisão, quando o documento falsificado é público.
Infração de medida sanitária preventiva: considerado crime contra a Saúde Pública, a Constituição prevê penas de um mês a um ano de prisão, além de multa. Segundo o artigo 268, o crime consiste em “infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”.
Associação criminosa: O Código Penal prevê crime de um a três anos de prisão quando mais de três pessoas se juntam para cometer crimes. Segundo um integrante do Ministério Público ouvido pela reportagem da BBC News Brasil, para que fique configurado o crime, o grupo precisa realizar crimes repetidos.
Corrupção de Menores: Previsto no artigo 244-D do Estatuto da Criança e do Adolescente, o crime por corrupção de menores consiste em “corromper ou facilitar a corrupção de menor de 18 (dezoito) anos, com ele praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la”. A pena prevista é de um a quatro anos de prisão.
Em um eventual julgamento, tanto Jair Bolsonaro, quanto Mauro Cid, incorreriam nestes crimes por terem falsificados a carteira de vacinação de suas respectivas filhas, as duas menores de idade, fazendo-as entrar em solo americano com documentos falsos.
8 de janeiro
Em abril, Bolsonaro passou a fazer parte do inquérito que investiga os autores intelectuais da tentativa de golpe do 8 de janeiro. O ministro Alexandre de Moraes atendeu pedido da Procuradoria Geral da República (PGR) que avaliou que o ex-presidente “teria supostamente incitado a perpetração de crimes contra o Estado de Direito” em uma publicação de 10 de janeiro.
Na publicação, Bolsonaro compartilhou um vídeo que diz que Lula não havia vencido as eleições presidenciais, mas que tinha sido escolhido pelos ministros do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral.
Em depoimento a Polícia Federal, Bolsonaro alegou estar sob efeitos de remédios e que, por isso, publicou por engano.
Caso das joias
O Estadão revelou, em março, seguidas tentativas do governo Bolsonaro de incorporar joias sauditas avaliadas em R$ 20 milhões ao seu acervo pessoal. Foram ao menos três pacotes presenteados pelo governo da Arábia Saudita, um deles, avaliado em R$16,5 milhões, dado a ex-primeira-dama, Michelle Bolsonaro.
Em 2016, o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), Walton Alencar, decidiu que presentes valiosos não são patrimônio privado de ex-presidentes. Ao contrário do que pensava Bolsonaro, as joias da grife Chopard, não se enquadram como itens de “natureza personalíssima”.
Pandemia
Em dezembro do ano passado, a Polícia Federal fez chegar ao ministro Alexandre de Moraes um relatório em que conclui que Bolsonaro cometeu crimes ao divulgar informações falsas sobre a pandemia de Covid-19. Segundo a PF, o ex-presidente desincentivou o uso de máscaras, mesmo quando a utilização do EPI foi considerada obrigatória, além da associação da vacina de Covid-19 ao risco de desenvolver Aids.
Vazamento de informações
Em 2020, um ataque hacker ao sistema do TSE teve acesso a dados de servidores do tribunal. Em agosto de 2021, em campanha pela difamação do sistema eleitoral brasileiro, o então presidente Jair Bolsonaro fez uma live vazando informações de um inquérito sigiloso da Polícia Federal sobre o caso.
Em janeiro de 2022, a PF afirmou em relatório entregue ao STF que Bolsonaro teve “atuação direta” no vazamento do inquérito.
Interferência na PF
Em abril de 2020, o então ministro da Justiça, o senador Sérgio Moro, pediu demissão do cargo após denunciar o presidente da República, Jair Bolsonaro, por interferência na Polícia Federal. Na ocasião, Bolsonaro demitiu o então diretor-geral da corporação, Maurício Valeixo. Era uma tentativa do ex-presidente de colocar a PF sob comando de Alexandre Ramagem, nome próximo da família.
As suspeitas era de que Bolsonaro interferia no órgão para tentar blindar ele e seus filhos das investigações sobre rachadinhas.
Caso Maria do Rosário
Bolsonaro já é réu em ação no STF por incitação ao estupro e injúria contra a deputada Maria do Rosário (PT-RS). Em 2014, Bolsonaro declarou que Rosário não “merceia” ser estuprada por ser “muito feia”. A tramitação do julgamento foi interrompida por causa do período em que o ex-presidente tinha foro privilegiado.
Sem o foro, a PGR defende que o caso volte a ser julgado na 1ª instância.
1ª Instância
Segundo o levantamento do Poder 360, o STF já encaminhou ao TJDFT (Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios) e ao TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região) 10 pedidos de investigação contra o ex-presidente.
Cinco deles se referem a alegações de crimes de atentado contra a ordem constitucional, o Estado Democrático de Direito e a separação de Poderes durante as celebrações do 7 de setembro.
Motociata em Orlando: s crimes mencionados são de responsabilidade e prevaricação
“Mais de sete arrobas”: a deputada Sâmia Bonfim e o deputado Orlando Silva denunciaram o ex-presidente por racismo por ter se referido a um homem negro dizendo que ele pesava “mais de sete arrobas”
Fonte: Portal Vermelho