Política de valorização do rendimento está em pauta no Congresso Nacional. Para entidade, reajuste irá aquecer economia e poderá contribuir para diminuição de desigualdades
No último 1º de maio, Dia do Trabalho, a Consolidação de Leis Trabalhistas (CLT) completou 80 anos. Estabelecido durante governo do presidente Getúlio Vargas (Lei nº 5.452 de 1943), o documento unificou todas as determinações, que regulavam as relações de trabalho no país à época, e inseriu os direitos dos trabalhadores na legislação brasileira. Entre as medidas mais importantes garantidas pelo marco, está o estabelecimento do salário-mínimo.
De acordo com o Artigo 76: “Salário-mínimo é a contraprestação mínima devida e paga diretamente pelo empregador a todo trabalhador, inclusive, ao trabalhador rural, sem distinção de sexo, por dia normal de serviço, e capaz de satisfazer, em determinada época e região do país, as suas necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene e transporte”, afirma a regulamentação.
Também na última segunda-feira (1º), durante pronunciamento em rede nacional, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou o aumento do salário-mínimo para R$ 1.320, acréscimo de R$ 18. De acordo com levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), a mudança irá impactar 54 milhões de pessoas direta ou indiretamente, o que representa 25,4% da população brasileira.
Segundo Fausto Augusto Júnior, diretor-técnico do DIEESE, é necessário rever as discussões sobre o que é considerado “gasto” e o que caracteriza “investimento” no país. Neste sentido, ele salienta que o aumento do salário-mínimo, mais do que onerar os cofres públicos, será importante para dinamizar a economia brasileira.
“Quando você compra um tanque de guerra, vira investimento. Quando coloca recurso na mão do pobre, vira um gasto. Se eu colocar na conta, a elevação do salário-mínimo, de quanto ele vai custar para a Previdência, é obvio que irá aumentar o gasto, porque as pessoas irão ganhar mais e este recurso precisa vir de algum lugar. Mas fala-se muito pouco da economia que é gerada a partir da elevação do salário, a primeira fonte de renda e como isto irá impactar na arrecadação. “O salário-mínimo está longe de ser um problema fiscal. Na verdade, ele é um mecanismo de viabilizar crescimento econômico”, avalia o especialista.
Diminuição desigualdades
No último trimestre de 2022, havia no Brasil 66,2 milhões de ocupados (ou 66,6% do total) com rendimentos correspondentes a até dois salários-mínimos. Porém, a situação das mulheres negras – que representavam 64,7% do total de mulheres (ou 11,4 milhões) – era a mais alarmante: quase metade delas (48,1%) possuía rendimentos equivalentes a até um salário-mínimo, situação inversa à dos homens não negros, entre os quais quase metade (47%) tinha rendimentos superiores a dois salários-mínimos.
“A necessidade de uma política de valorização do salário-mínimo, pois a elevação do piso nacional tem impactos diretos na redução das desigualdades salariais, tanto entre negros e não negros, quanto entre homens e mulheres. Além de permitir que os trabalhadores (formais ou informais) e beneficiários da Previdência Social com renda muito próxima ao valor do salário-mínimo reponham o poder de compra de seus rendimentos, que foi corroído pela alta dos preços de itens essenciais, como alimentação, transporte e habitação, favorece a ampliação do mercado consumidor interno e fortalece a economia brasileira”, sugere a instituição.
Poder de compra
Segundo levantamento da Organização Internacional do Trabalho (OIT), o Brasil ocupa 51ª posição entre 105 países com maior paridade de poder de compra. O poder de compra do salário-mínimo brasileiro está estimado em US$ 497 (aproximadamente R$ 2.511,89). Para se ter uma ideia, a Suíça, que aparece em primeiro lugar do ranking, possui poder de compra de US$ 3.415 (R$ 17.259,75), ou seja, oito vezes maior.
Na quinta-feira (4), o governo federal encaminhou ao Congresso Nacional, projeto de lei com nova política para valorização do salário-mínimo. O texto prevê que os reajustes levem em conta a variação da inflação e o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). A medida, se aprovada, passará a valer a partir de 2024. O reflexo calculado até aqui, estima o Ministério do Trabalho, é de 18,1 bilhões de reais para 2024, 25,2 bilhões de reais para 2025 e 39,1 bilhões de reais para 2026.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.