Saúde nunca é neutra. Os indicadores de expectativa de vida ao nascer, por exemplo, são praticamente tratados de sociologia. Em outras palavras, quanto mais próspero e igualitário um país, melhores são esses indicadores. Na outra ponta, quanto mais desigual, piores são esses índices. Embora óbvio, é muito interessante que observemos esses dados. Falo isso, claro, pensando no Brasil, um país estruturalmente injusto.
Logo nas primeiras aulas de saúde pública, na universidade, o professor mostrava um gráfico emblemático nos anos 70 do século passado. Ele estampava a relação inversa entre salário-mínimo e mortalidade infantil. Quando o salário-mínimo subia a mortalidade infantil caía.
Outro trabalho feito há alguns anos apurou a expectativa de vida entre os membros da OAB de São Paulo e do Sindicato das Empregadas Domésticas. Só confirmava o que se intuía na observação superficial: as empregadas domésticas viviam muito menos. A desigualdade piora a vida e faz os pobres viverem menos.
Oferecer serviços universais de saúde é um caminho de justiça social, que melhora e prolonga a vida de milhões de pessoas. O Brasil construiu ao longo de décadas uma rede de saúde pública, que apesar dos percalços e imperfeições tem mostrado resultados animadores. Lembremos a tragédia da COVID 19, por exemplo.
Graças ao SUS foi possível levar vacinas a lugares remotos, onde, mesmo com estrutura precária existia um postinho de atendimento, um ponto de apoio para vacinação. Sem essas condições, a desastrosa política de saúde da época teria produzido piores resultados.
Por outro lado, uma política de distribuição de renda e melhora das condições gerais de vida da população, passa por investimentos pesados na saúde pública. Basta lembrarmos que o SUS é subfinanciado, com alcance, embora amplo, ainda limitado.
E não é compensada pela estrutura paralela de assistência médica fornecida pelo sistema de saúde complementar (UNIMEDs, seguros saúde, ligados a bancos e outras empresas de assistência). Apesar de que esse setor atende em torno de 40 milhões de brasileiros. Porém, parte nada desprezível dos tratamentos de alto custo são repassados ao SUS. O que é mais uma sobrecarga para uma estrutura deficitária.
Existem propostas de que parte do financiamento da saúde venha também de investimentos no setor de tecnologia, com produção de equipamentos hospitalares, de vacinas, medicamentos. Criar uma estrutura que poderia tornar o Brasil uma plataforma de produção e exportação de produtos médico hospitalares. Algo parecido com o que foi feito com a EMBRAER.
Ideias interessantes. Mas que precisaria de empenho e vontade política de governos.
Texto: Dr. Marco Antônio Fabiani, cardiologista