É fato que esses dados apresentados pela OMS já são sentidos, inclusive pelos servidores públicos curitibanos
À medida que as ondas de calor se intensificam em Curitiba, aumentam também as denúncias dos servidores públicos sobre a ausência de investimentos da Prefeitura Municipal para amenizar as altas temperaturas nos diferentes espaços públicos da cidade, como nas unidades de saúde, da assistência social, da educação, fiscalização, entre outros.
Em locais de trabalho os profissionais apontam a ausência, falta de manutenção ou deterioração de equipamentos de climatização, como ventiladores e ar-condicionado.
Esses equipamentos que, considerando a atual realidade, não são mais um luxo, podem reduzir os efeitos das altas temperaturas na saúde desses profissionais e também da população que busca atendimento nestes locais.
Ao que tudo indica, se não tiver medidas para mitigar o calorão nas unidades públicas, as denúncias dos servidores e da população curitibana tendem a aumentar, já que dados do relatório “Atualização Global Anual para Decadal do Clima”, produzido pela Organização das Nações Unidas (ONU), em parceria com especialistas do Reino Unido e da Organização Meteorológica Mundial (OMM), mostram que nos próximos cinco anos as temperaturas globais devem bater recordes, sendo que há a probabilidade de 66% da média anual de aquecimento ultrapassar o limite de 1,5 °C entre 2023 e 2027.
Trabalhadores de várias categorias têm reagido em suas pautas à exposição ao calor, caso dos Correios.
Juliana Mildemberg, coordenadora do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais (Sismuc), é fato que esses dados apresentados pela OMS já são sentidos, inclusive pelos servidores públicos curitibanos que ficam em ambientes fechados, sem refrigeração, e, muitos, expostos ao sol diariamente.
Ainda, segundo ela, não tem como “tapar o sol com a peneira”, é preciso uma ação eficaz do executivo municipal, para garantir ambientes seguros de trabalho para os profissionais e para a população, com refrigeração dos ambientes, e Equipamento de Proteção Individual (EPI) adequados à nova realidade.
“Para se ter uma ideia, temos servidores de diversos segmentos denunciando constantemente a falta de equipamentos para amenizar o calor nas unidades de atendimento e, inclusive, nos próprios veículos utilizados para realização do trabalho feito na rua. Agora, imagina, esses trabalhadores ficam horas e horas expostos ao calor, sem conseguir regular a temperatura corporal, isso é extremamente perigoso, tendo em vista que pode aumentar o risco de ocasionar diversos problemas de saúde, inclusive podendo até ser fatal. E, tem mais, isso também afeta a população atendida nestas unidades, já que também estão expostos em ambientes super quentes, sem refrigeração”, critica.
Juliana destaca a urgência de enfrentar as mudanças climáticas, que vão além de desafios meteorológicos. “Com o agravamento dessas mudanças, eventos extremos como ondas de calor, fortes chuvas e secas tornam-se mais frequentes e impactantes. É para hoje termos ações estratégias, robustas, de adaptação e mitigação para garantir uma cidade sustentável e preparada”. Ela ressalta, que, somente assim, garantiremos a segurança, saúde e bem-estar de todos, principalmente daqueles que ficam mais expostos a essa nova realidade”.
Escolas e Cmeis em ebulição
Os mais de 17 mil servidores e as crianças que frequentam diariamente as escolas e os Centros Municipais de Educação Infantil (Cmeis) também precisam enfrentar o calor nas unidades, já que as salas contam com má ventilação, os poucos ventiladores que existem não dão conta de “refrescar” o ambiente e ar-condicionado é item raríssimo de se encontrar nos ambientes.
O Censo Escolar de 2022 — principal instrumento de coleta de informações da educação básica e a mais importante pesquisa estatística educacional brasileira — apontou que apenas 1% das 4.379 salas de aula eram climatizadas. Essas estatísticas ganham uma dimensão crítica quando consideramos que essas salas atendem 118,3 mil alunos da educação infantil e ensino fundamental.
Professora de educação infantil há 11 anos, Marta (nome fictício), explica que nos Cmeis as turmas, que vão do berçário, maternal, pré I e II, chegam até 32 crianças. “Temos muitas salas lotadas de crianças, inclusive muitos têm deficiência, além, é claro, de nós, as professoras. Imagina, todos em um espaço quente, com apenas um ventilador? É insuportável, abafado. A prefeitura precisa investir para garantir que as salas sejam climatizadas, até porque esse calorão tende a piorar. E, isso afeta muito a qualidade do aprendizado das crianças, elas não conseguem se concentrar e nós também sofremos”.
Conforme divulgado no site da Secretaria Municipal de Educação, em 2023 foram investidos cerca de R$ 17 milhões em obras e serviços de reparo nas escolas e Cmeis. No entanto, não foi informado se houveram investimos em climatização das salas de atendimento das crianças.
Assistência Social em situação crítica
Os Centros de Referência da Assistência Social (CRAS) e Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS), responsáveis por oferecer suporte a famílias em situação de vulnerabilidade, também sofrem com a negligência. A falta de climatização impacta diretamente o atendimento, tornando-o menos eficiente e desafiador para os profissionais envolvidos.
Para uma servidora que atua na FAS e prefere não se identificar, é preciso rever todos as unidades e equipamentos utilizados pelos profissionais, garantindo EPIs e outros equipamentos adequados para o clima atual.
“Parece algo banal, mas não é, veja: usamos combis diariamente em nosso trabalho e elas não são climatizadas e não há nenhum tipo de proteção térmica que amenize o calorão. E, com o calor desses últimos dias, tem sido insuportável, parece que é ainda mais quente dentro do carro do que fora dele. Então, é preciso rever tudo, adaptando para a realidade que estamos vivendo, pois isso deixa, nós, servidores totalmente expostos, podendo ter problemas graves de saúde.
Já os espaços de Proteção Social Especial para Pessoas em Situação de Rua (POP Rua) também encontram-se em uma situação delicada. A falta de condições adequadas de enfrentamento as altas temperaturas colocam em risco a saúde e dignidade daqueles que já vivem em condições vulneráveis.
Saúde sob calor intenso
As nove Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), as 109 Unidades Básicas de Saúde (UBS) e o Laboratório Municipal, locais cruciais para o atendimento médico da população, não escapam do descaso.
Em visita realizada nestes espaços pela direção do sindicato, foram constatadas que apenas as salas de atendimento odontológico e algumas de atendimento e vacina possuem equipamentos de ar-condicionado, os demais contam apenas com ventiladores.
“Estamos trabalhando em uma unidade que não tem ventiladores suficientes para profissionais. A sala de vacina tem um ar-condicionado que tá sem manutenção. Até a água do galão está em um bebedouro que está estragado, não gela a água suficiente nesse calor. Estamos passando muito calor. Além do mais, a própria população que vem buscar atendimento já está vulnerável e com o calor dentro das unidades ficam ainda pior. Isso tudo compromete a qualidade dos serviços prestados”, afirmou outra servidora pública.
“A ausência de espaços com climatização e EPIs adequados não é apenas um desconforto; é uma ameaça à eficácia dos serviços públicos, comprometendo a qualidade de vida da população e a saúde dos servidores que, diariamente, enfrentam condições adversas para cumprir suas funções. A cidade clama por investimentos imediatos, visando assegurar ambientes mais saudáveis e funcionais em todas as esferas públicas, essenciais para a qualidade de vida e bem-estar de todos os curitibanos”, afirma Juliana.
Fonte: Brasil de Fato