Programa prevê que a gestão de colégios estaduais sejam repassados à iniciativa privada. Contratação de docentes passa a ser via CLT, desobrigando a realização de concursos
Representantes do Coletivo de Sindicatos de Londrina e Região anunciaram apoio à greve dos professores da rede estadual de ensino no Paraná. Durante assembleia realizada no último sábado (25), docentes da educação básica aprovaram paralisação a partir de 3 de junho (saiba mais aqui).
Entre as reivindicações do professorado está a retirada de pauta do programa ‘Parceiro da Escola’, responsável por repassar para iniciativa privada a gestão de escolas estaduais, também pagamento da data-base e fim da terceirização do cargo de funcionários de escola.
“Recebemos novamente a notícia de que o governo do estado vem agora querer privatizar o ensino na educação pública do Paraná. Ele já tem avançado muito nessa pauta na área de saúde, que a gente vê que em vários casos tem prejuízo pelo atendimento da população, pois entendemos que há um fechamento de portas no atendimento e de perspectivas de negociação dos municípios com o estado para tentar ampliar, principalmente, o atendimento de urgência e emergência”, pontua Laurito Porto Lira, diretor de formação do Sindicato dos Bancários de Londrina e Região.
A liderança destaca os reflexos do projeto para trabalhadores da educação e estudantes. Além disso, ele ressalta as consequências da medida para o desmantelamento da educação pública como direito.
“Normalmente com privatização vem a precarização do trabalho, diminuição dos salários e a alta rotatividade de profissionais. Isso trará um prejuízo enorme para todas as comunidades que são atendidas através da escola pública. Afinal de contas, a grande maioria da população depende do ensino público para garantir educação aos seus filhos. Então, um ataque de privatização à educação é algo muito sensível e trará grande prejuízo no longo prazo para o estado do Paraná e também para o país”, acrescenta.
O projeto foi enviado para ALEP (Assembleia Legislativa do Paraná) nesta segunda-feira (27) em regime de urgência, o que reduz o prazo para análise das comissões do Legislativo antes da votação pelo plenário. Com isso, a resolução deverá ser apreciada em um prazo máximo de 48 horas pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e pela Comissão de Educação.
Lira também questiona o argumento da SEED (Secretaria Estadual de Educação) que a privatização trará benefícios para as escolas.
Entre as justificativas para aprovação da iniciativa, o chefe da pasta, Roni Miranda, defendeu que a terceirização irá melhorar a qualidade do ensino público do Paraná através da elevação do IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica).
De acordo com ele, as escolas vão poder identificar, através de pesquisas de avaliação, se o projeto resultou em progresso para o colégio. E caso haja insatisfação o contrato de terceirização não será renovado.
Outro fator a ser adotado é o desempenho dos alunos, que terão de fazer uma avaliação das disciplinas de português e matemática no começo do ano para que haja uma percepção da progressão do aprendizado.
“E esses movimentos de privatização, eles vêm com a falácia de que o privado é melhor que o público e vendendo a ideia de que a escola vai virar uma escola privada para atender e terá qualidade maior. Isso não é verdade. A gente vê aí que pelas notas e as avaliações que são as universidades públicas e escolas públicas que conseguem ter mais notas, as notas maiores de avaliação, não está na área privada. E mesmo quando essas notas têm as escolas privadas na frente, a diferença não é grande, é uma diferença não tão significativa. Então, a escola pública, sim, tem qualidade. O que falta para a escola pública é um olhar com mais cuidado. Mais investimentos e mais contratação de professores e de outros trabalhadores através de concurso público”, assinala o sindicalista.
Em Londrina, a SEED espera implementar o projeto nas seguintes escolas:
- Colégio Estadual Professora Cleia Godoy Fabrini da Silva (zona Sul)
- Escola Estadual Professora Kazuco Ohara (zona Oeste)
- Colégio Estadual Nossa Senhora de Lourdes (zona Leste)
- Colégio Estadual Professora Ubedulha Correia de Oliveira (zona Norte)
“A quem interessa a privatização das escolas públicas?”
Gilson Luiz Pereira Filho, técnico de enfermagem e membro da diretoria estadual do SindSaúde-PR (Sindicato das Trabalhadoras e Trabalhadores do Serviço Público da Saúde e da Previdência do Estado do Paraná) reforça a negligência de Ratinho Júnior (PSD) com os serviços públicos no estado.
Para ele, é necessário romper com a visão neoliberal que estabelece a defesa do estado mínimo, mas cuja organização tende a favorecer as classes dominantes.
“A minha pergunta é a quem interessa a privatização das escolas? A quem interessa a entrega de parte dos serviços públicos à iniciativa privada? Quem ganha com a privatização de escolas? Quem ganha com a privatização de estatais? Quem ganha com a privatização da Copel? Quem ganha com a privatização dos serviços públicos de saúde?”, questiona.
“O governador Ratinho Júnior vem fazendo esse avanço na privatização dos serviços públicos de saúde desde o seu 1º dia de mandato. Já temos o exemplo de outras entregas do bem estar da população à iniciativa privada que só tem interesse com os lucros. A exemplo da educação que passa por esse momento e precisamos resistir para que isso não aconteça, para que a educação não seja entregue nas mãos de pessoas que pensam somente em lucro, ao mercado e capital que pouco se importam com o resultado educacional e pouco se importam com a construção de um futuro de crianças que, em grande parte, estão em situação de vulnerabilidade”, complementa.
Diferentemente do que estava previsto, o projeto não limita o repasse da administração a 200 escolas e permite que a maioria dos estabelecimentos de ensino terceirizem diversos serviços como segurança, limpeza, oferta de merenda. O programa também possibilita que professores sejam admitidos via CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), desobrigando a realização de concursos públicos.
“Crianças filhas de trabalhadores que dependem muitas vezes do ambiente escolar para se proteger de violências. Jovens e adolescentes que dependem do ambiente escolar para traçar um futuro melhor do que eles experimentam hoje, que dependem da escola pública para se alimentar. Esse processo de privatização representa também a entrega dos cidadãos a própria sorte, dos estudantes à própria sorte”, adverte Filho.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.