Relato de professor PSS que participou de todo o processo de aprovação e implantação do projeto revela os danos da iniciativa
Promessas de estabilidade no emprego e possibilidade de altos salários motivaram professores(as) PSS da rede pública estadual a aderir ao projeto Parceiro da Escola em 2022. No final do ano seguinte, eles(as) perceberam que haviam caído no conto do vigário, após serem demitidos sem justificativa.
Agora o governo Ratinho Jr tenta expandir o programa Parceiro da Escola, fazendo aprovar na Assembleia Legislativa projeto de lei para implantá-lo em 200 escolas, inicialmente. A APP se posiciona contrariamente ao projeto, que transfere recursos públicos para empresas sem qualquer possibilidade de controle sobre sua aplicação.
O caso do professor PSS Edson Mosko é exemplar em relação aos danos do projeto Parceiro da Escola para a escola pública de qualidade, humanizada e democrática. Ele lecionava no Colégio Estadual Aníbal Khury quando foi convencido a aderir ao projeto e divulgar suas supostas vantagens nas salas de aula e em lives para os pais.
“A escola é para os(as) alunos(as). Mas será que eles(as) estão tendo benefício real? Eu digo que não, pela experiência que eu tive em sala de aula. Não mudou nada. Qualquer um pode ir lá na escola e ver. O governo pode até fazer uma filmagem num dia bonito, colocar uniforme em todas as crianças e fazer um vídeo, todo mundo acha legal, mas no dia a dia não é isso que acontece”, afirma Mosko.
Sem avanços pedagógicos que beneficiem os(as) estudantes, o Parceiro da Escola não traz vantagens também para os(as) educadores(as). “O que eu tenho a dizer é: professores(as), não vale a pena, não vale a pena mesmo”, diz Mosko, que acompanhou todo o processo de aprovação e implantação do projeto.
“A gente já imaginava que aconteceria aquilo que acontece quando o dinheiro sai da mão do servidor público e vai na mão do empresário: ele entrega pra quem ele quer, ele contrata quem ele quer, contrata até quem não tem formação e aí nossos filhos(as), nossos alunos(as), estão aí na mão de pessoas que não têm formação”, dispara o professor.
Promessas
“Eu trabalhava como PSS em cinco escolas e houve a proposta de que se uma empresa passasse a administrar, em vez de trabalhar em cinco escolas eu trabalharia em uma escola só, o que me interessou muito”, conta Mosko. “Falaram também que salarialmente seria melhor que o PSS, mas o que mais me interessou foi ter a segurança de não ter que fazer prova, gravar vídeo, provar títulos e ficar na lista de espera dos PSS”, explica.
Mosko fez campanha em sala de aula pela aprovação do projeto, pedindo aos alunos que convencessem os pais a votar a favor. “Como professor de quem os alunos gostam, admito que tive alguma influência na aprovação. A proposta inicial realmente me atraiu”, diz.
Decepções
Depois da aprovação do projeto no Aníbal Khury começaram as decepções. “As empresas, que vieram de fora, de São Paulo e Minas Gerais, trouxeram professores de lá. Então comecei a perceber que ter esses professores atuando na escola era contrário ao que haviam prometido para nós, que teríamos aulas garantidas”, recorda Mosko.
De fato, depois que a empresa assumiu a gestão da escola, não houve aula disponível para Mosko. Ele foi transferido para outra escola em que o modelo foi aprovado, o Colégio Estadual Anita Canet, em São José dos Pinhais.
Em pouco tempo no Anita Canet, Mosko já pode perceber os retrocessos no modelo anunciado como inovador. A hora-atividade, fundamental para a qualidade do ensino e aprendizagem, foi reduzida drasticamente. “A cada oito aulas dadas você tem uma hora-atividade, diferente do PSS, em que a cada três aulas você tem uma hora atividade”, relata Mosko.
Outro retrocesso é a contratação de tutores(as) para atuar como professor(a) em sala de aula. “Eles pagam bem menos para um monitor, em torno de R$ 1,3 mil. Com isso estão deixando de pagar para um professor formado. E pasmem: a maioria desses monitores ainda está estudando, ou seja, seriam estagiários, mas atuam como professores em sala de aula”, denuncia.
Quando fazia propaganda para aprovar o Parceiro na Escola, o governo afirmava que uma das vantagens é que agilizaria reformas nas escolas. Depois da aprovação do modelo, não foi o que aconteceu. “As reformas que aconteceram na escola eram feitas com recursos do governo do Estado, mas a empresa fazia propaganda como se fosse ela que estivesse fazendo”, diz Mosko.
Tampouco houve avanços pedagógicos nas escolas com o Parceiro da Escola, relata o professor. “A empresa até tentou fazer alguma coisa, mas sem investimento financeiro, usando apenas o que a escola já tinha, como oferecer uma sexta aula aos alunos do terceiro ano”, conta.
“A ideia é que haveria um trabalho efetivo para que os estudantes tivessem bons resultados no Enem e tivéssemos uma grande aprovação no vestibular da UFPR, mas não aconteceu isso. Não aconteceu o que prometeram que iam fazer. Até porque quem dava a sexta aula eram monitores e não professores. Não teve aluno, até onde eu sei, do terceiro ano do Anita Canet, que passou na Federal”, relata Mosko.
Demissão
Como havia acontecido no Aníbal Khury, a vinda de professores de São Paulo e Minas Gerais tornou inviável a permanência de PSS no Anita Canet. “Criaram-se as panelas de quem veio através da indicação da direção da escola e da empresa. Vieram amigos, ex-alunos, veio gente que não tinha formação para atuar como professor”, afirma Mosko.
“A empresa começou a trazer gente de fora também para o Anita Canet. Tem o caso de um casal que veio, a professora é formada, mas o noivo não era, depois eles acabaram casando, mas ele não tinha a formação para o conteúdo no qual contrataram ele”, exemplifica.
Os(as) professores(as) que antes atuavam como PSS começaram a receber solicitações descabidas, como alterar notas e abonar faltas de alunos. Os que não concordaram com isso passaram a ser mal vistos pela empresa que os contratou.
“Quando chegou o final do ano houve uma demissão em massa, principalmente desses que não concordaram com as demandas de, por exemplo, tirar as faltas de aluno no final do ano, dar nota para aluno para que o colégio não ficasse com a nota lá embaixo. Isso foi algo que aconteceu comigo e com vários outros professores. Na calada da noite, dia 20 de dezembro, faltando poucos dias para o Natal, fomos demitidos”, conta Mosko.
“Estou pagando até hoje pela escolha que fiz e por ter acreditado no projeto”, lamenta o professor. Demitido pela empresa, ele ficou sem aulas no início de 2024, pois foi para o final da lista dos PSS. “Só comecei a dar aulas no mês de abril, não recebi o meu primeiro salário ainda. Só fui chamado em um novo edital, o 78, como substituto. Depois das férias eu vou voltar para a fila de novo”, afirma.
Fonte: APP Sindicato