No Dia dos Professores, educadores do Paraná enfrentam um cenário de adoecimento, sobrecarga de trabalho e salários defasados
O Dia dos Professores, celebrado em 15 de outubro, deveria ser um momento de reconhecimento aos profissionais da educação, porém no Paraná, a data tornou-se, sobretudo, um símbolo da luta dos docentes.
Com a privatização das escolas, como uma das principais vitrines da atual gestão, profissionais se mobilizam em todo o estado, para defender a categoria e a escola pública dos ataques neoliberais promovidos pelo governo de Ratinho Junior (PSD).
Através deste cenário de lutas e mobilizações, o Portal Verdade conversou com profissionais da educação, a fim de entender as dificuldades vivenciadas.
De acordo com professor Ivo Ayres, Secretário Educacional da APP Sindicato (Sindicato dos Professores e Funcionários de Escola do Paraná) – Núcleo Londrina, há um abismo entre a propaganda do governo estadual, que enaltece a qualidade da educação no Paraná, e a realidade vivida nas escolas.
“A propaganda do governo apresenta a educação do estado como a melhor do Brasil, com escolas perfeitas, onde seus estudantes e profissionais da educação estão felizes e satisfeitos com as ações do governo. Já o sistema real, concreto, vivenciado cotidianamente nas salas de aulas é bem diferente. Neste sentido, professores, pedagogos e funcionários sofrem pressão diária para cumprir regras e metas estabelecidas pela SEED e impostas às equipes diretivas, as quais por sua vez, se obrigam a repassá-las a todos”, afirma Ivo.
Conforme noticiado anteriormente pelo Portal Verdade, a situação dos professores da rede pública estadual do Paraná continua a se agravar.
A política educacional do governo estadual tem sido marcada por constantes ofensivas como a plataformização do ensino e privatização das escolas, gerando grande insatisfação entre a categoria. O programa “Parceiro da Escola”, criticado pela APP-Sindicato, é visto como parte desse movimento.
A discrepância entre propaganda e realidade
De acordo com um professor entrevistado, que pediu para não ser identificado devido à sua situação contratual como PSS (Processo Seletivo Simplificado), a instabilidade é um dos maiores problemas. “Lidamos com uma incerteza constante. Nossos contratos são temporários, e a cada ano, não sabemos se continuaremos ou não nas escolas”, relata.
Ivo Ayres também aponta a limitação da autonomia docente nas salas de aula e como isso afeta a qualidade do ensino.
“A pressão para o uso de plataformas educacionais que limitam a autonomia docente e massacram estudantes com materiais previamente produzidos por empresas privadas, além da exigência de realizar buscas ativas durante a hora atividade para diminuir a infrequência estudantil, momento este que deveria ser utilizado para estudo e planejamento de aulas; a obrigatoriedade não oficial, mas concreta, de aprovação compulsória de estudantes independentemente de sua frequência ou aproveitamento escolar ao longo do ano letivo”, assinala.
“O direcionamento de conteúdos voltados somente à realização da Prova Paraná e de outras avaliações institucionais num processo de incentivo à competitividade entre escolas, que tem gerado situações absurdas em detrimento do ensino com qualidade referenciada “, destaca.
Precarização, adoecimento e desvalorização salarial
O adoecimento físico e mental dos professores tem sido um dos maiores desafios, segundo o presidente da APP-Londrina, Márcio André Ribeiro. “A sobrecarga tem aumentado cada vez mais em vários aspectos e nos levado a uma situação de exaustão completa, de várias doenças, e essa desvalorização absoluta que temos sofrido, isso é perfeitamente visível por toda a sociedade. É óbvio que ninguém, absolutamente ninguém, deseja entrar numa profissão, a nossa”, desabafa.
Além disso, a diminuição das horas de planejamento de aulas para apenas 20% da carga horária tornou a preparação adequada das aulas ainda mais difícil.
“Já tivemos a hora atividade relativamente boa, de 35% da nossa carga horária, destinada a preparar as aulas, corrigir provas e trabalhos, preparar provas e trabalhos, fazer discussões pedagógicas na sala de aula, e aí o governador diminuiu, tirou abruptamente essas horas de atividade, diminuiu para 20% de novo, o que é insuficiente”, aponta.
Márcio André destaca que uma hora atividade ideal seria de 50% do tempo de trabalho, o que melhoraria muito a qualidade do conteúdo ensinado em sala de aula. Ainda, o docente diz que a cada ano há menos motivos para comemorar a data, diante de tantos desafios.
“Todas essas questões nos levam à reflexão de que cada ano que passa nós temos cada vez menos a comemorar no dia do professor e da professora, a gente não tem nada para comemorar, absolutamente nada. Toda a comunidade escolar também tem sofrido bastante, por todas as questões”, afirma.
Defasagem nos salários e o desânimo dos futuros docentes
A defasagem salarial assim como o avanço da privatização das escolas públicas do Paraná é uma preocupação crescente entre os professores.
O professor PSS, que prefere não ter a identidade revelada, com medo de represálias, alerta que a falta de valorização da profissão está afetando diretamente os estudantes que pensam em seguir a carreira docente.
“Muitos jovens desistem da ideia de serem professores ao verem a nossa realidade. A profissão, que deveria ser um pilar da sociedade, está se tornando um caminho de incerteza e baixos salários”, lamenta.
Ivo Ayres compartilha a insatisfação com a defasagem salarial enfrentada pelos profissionais e pelo estado por tratar a educação como uma mercadoria.
“Nossos salários estão defasados em cerca de 40%, pois estamos sem recomposição da inflação desde 2015. Ratinho Jr., não apenas se nega discutir algum plano de pagamento desta dívida, como também não se manifesta a pagar a data base deste ano, na ordem 3,62%. Ao invés disso, opta por distribuir migalhas aos profissionais da educação como premiação aos que tenham obtido sucesso em competições como a que buscou melhorar o IDEB das escolas, cujo resultado “positivo” só foi possível por conta das ações mencionadas anteriormente”, relata.
Para o professor Márcio André, o estado enfrenta uma crise desde 2014, onde a cada ano a situação piorou gradativamente.
“Infelizmente, nós não temos nenhuma notícia positiva que possa ser dada a respeito da educação paranaense, das condições de trabalho dos educadores e educadoras na rede estadual do Paraná”, conclui.
Para Ivo, a situação é precária, mas é necessário enfrentá-la a fim de defender a educação gratuita no estado. “Entendemos que os profissionais da educação da rede pública estadual de educação do Paraná não têm o que comemorar neste 15 de outubro. Resta-nos continuar a lutar em defesa da educação pública, laica, gratuita, com qualidade socialmente referenciada, o que inclui, neste momento, a luta contra a venda de nossas escolas como pretende fazer Ratinho Júnior”, finaliza.
Matéria do estagiário Jader Vinicius Cruz sob supervisão.