Em 2023, Londrina recebeu o selo “Cidade Amiga da Pessoa Idosa”
A possibilidade de extinção das Secretarias da Mulher, Idoso e Assistência Social, em Londrina, têm despertado críticas de diversos segmentos da população.
Conforme informado pelo Portal Verdade, o comunicado foi realizado na última quinta-feira (2) pelo novo prefeito, Tiago Amaral (PSD).
Segundo ele, a intenção é incorporar as três pastas em apenas uma secretaria chamada Família e Desenvolvimento Social, e que deverá ser comandada pela empresária Marisol Chiesa. Um projeto de lei para a reforma administrativa ainda será enviado para a Câmara Municipal de Londrina.
Para Dacio Villar, economista, coordenador do Projeto CEFE (Centro de Estudos e Formação para o Envelhecimento) da Casa de Maria, a extinção da Secretaria Municipal do Idoso significa o desmonte dos serviços de proteção e atendimento à pessoa idosa (aquelas com 60 anos de idade ou mais), área que, segundo ele, vem se estruturando nos últimos 25 anos na cidade.
“Londrina, por ter uma secretaria especializada na pessoa idosa, tem um trabalho de 25 anos reconhecido até internacionalmente, como é o caso da Cidade Amiga da Pessoa Idosa. Isso se deve ao desenvolvimento de uma sólida parceria entre as famílias, o estado e a sociedade. O estado, no caso a Prefeitura é o organizador e sustentador dessa parceria”, diz.
A Secretaria Municipal do Idoso foi instituída pela Lei 7.995, de 1999, com a finalidade de desenvolver em âmbito local um conjunto integrado de ações para o atendimento das necessidades das pessoas idosas, de acordo com o que determina a Política Nacional do Idoso, o Estatuto do Idoso e demais leis correlatas.
A principal finalidade do órgão é assegurar os direitos desta população, criando condições para a promoção de sua autonomia, integração e participação efetiva na família e na sociedade.
A pasta iniciou suas atividades em 8 de janeiro de 2000, sendo a primeira em todo o território brasileiro. “Desde os anos 2000, Londrina vem especializando e diversificando o seu trabalho. Esse é o motivo de nos tornarmos referência no cuidado e defesa dos direitos da pessoa idosa”, observa.
Entre as atividades desempenhadas pela Secretaria está a administração dos Centros de Convivência da Pessoa Idosa bem como do Fundo Municipal da Pessoa Idosa e do Banco de Projetos do Fundo da Pessoa Idosa. Para Villar, que também já presidiu o Conselho Municipal da Pessoa Idosa, tais competências são incompatíveis com uma secretaria com múltiplos interesses.
Isto é, a liderança ressalta que a futura pasta voltada à Família e Desenvolvimento Social possui escopo muito amplo e sob este guarda-chuva, o receio é que as demandas da população idosa fiquem desatendidas.
“Existe um trabalho delicado trazendo o declarante do Imposto de Renda, pessoa física e jurídica a destinar recursos para projetos específicos da nossa cidade”, adverte.
De acordo com a Lei nº 13.354, de 2022, o Fundo Municipal dos Direitos da Pessoa Idosa de Londrina corresponde a um instrumento de captação, repasse e aplicação de recursos destinados a proporcionar suporte financeiro na implantação, na manutenção e no desenvolvimento de programas e ações dirigidos a pessoas idosas do município de Londrina.
O Conselho Municipal do Idoso, por sua vez, delibera sobre o destino de toda receita recolhida pelo Fundo. Além de transferências de recursos municipais, estaduais e federais, desde 2020, pessoas físicas podem optar pela doação aos fundos controlados pelos Conselhos de Direito da Pessoa Idosa diretamente em sua declaração de imposto de renda. As doações constituem em uma das principais formas de captação de recursos dos Fundos do Idoso no Brasil.
Ele lembra que, de acordo com o artigo 230, da Constituição Federal de 1988, é responsabilidade da família, sociedade civil e dos poderes públicos garantir os direitos e cuidados à população idosa.
“Não é um secretaria de Assistência Social, que tem outras e mais amplas responsabilidades, que irá fazer esse trabalho. Tememos que esses recursos possam ser diluídos com uma administração não especializada”, assinala.
Villar também rechaça o argumento emitido pelo prefeito de economia dos investimentos públicos com a redução das pastas.
“Precisamos deixar claro que a pessoa idosa não sobrecarrega as despesas do município, porque todas as melhorias são realizadas em parcerias com instituição privadas e usando recursos da renúncia fiscal do imposto de rendas das pessoas físicas e jurídica destinados ao Fundo Municipal dos Direitos da Pessoa Idosa. A administração pública apenas formaliza contabilmente as decisões tomadas pelo Conselho”, evidencia.
Questionado pela reportagem se o Conselho Municipal do Idoso foi consultado sobre o mudança, Villar sinaliza que não houve nenhuma tratativa por parte da gestão de Amaral, nem mesmo durante a disputa eleitoral. “Enquanto candidato, o atual prefeito não teve o cuidado de abrir canal de dialogo com o Conselho”, indica.
Violência contra a pessoa idosa
O Disque 100, responsável por receber denúncias de agressão contra idosos em todo o país, registrou aumento de 14% no primeiro semestre de 2024, em relação ao mesmo período do ano anterior. Nos seis primeiros meses de 2023, foram registradas mais de 65 mil denúncias de violência.
No mesmo período em 2024, mais de 74 mil queixas chegaram ao Ministério dos Direitos Humanos.
Villar destaca o trabalho desempenhado pela Secretaria Municipal do Idoso no combate à violência. “O trabalho de redução da violência contra a pessoa idosa e as manifestações de etarismo de forma geral tem uma diretoria especializada dentro da Secretaria. Essa é a razão de, praticamente, não existirem casos em nossa cidade”, pontua.
Conforme descrito no Relatório Mundial sobre Idadismo, da OMS (Organização Mundial da Saúde), o etarismo se refere a “estereótipos (como pensamos), preconceitos (como nos sentimos) e discriminação (como agimos) direcionadas às pessoas com base na idade que têm”, explica o documento.
Cidade Amiga da Pessoa Idosa
Em 2023, ainda sob a gestão de Marcelo Belinati (PP), Londrina foi certificada como “Cidade Amiga da Pessoa Idosa”, selo concedido pela OMS e OPAS (Organização Pan-Americana da Saúde).
Isto quer dizer, segundo as organizações, que Londrina é uma cidade que adapta seus serviços e estruturas físicas para ser mais inclusiva e receptiva às necessidades da população idosa que nela reside.
“Faço parte hoje do Comitê Cidade Amiga da Pessoa Idosa, que vem realizando um levantamento sobre as condições em que a cidade se encontra e as melhorias que devem ser implementadas para alcançarmos plenamente esse patamar. E essa é uma coordenação indispensável da Secretaria da Pessoa Idosa”, alerta Villar.
Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) demonstram que Londrina possui mais de 100 mil habitantes com mais de 60 anos, o que corresponde a 17% da população.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.