Se eleitos não mudassem autodeclaração, presença negra na Câmara dos Deputados cairia 11,29% em relação a 2018
O aumento de 9% no número de negros que ocuparão a Câmara dos Deputados em 2023, um salto de 124 para 135 deputados federais em relação a 2018, foi celebrado após a apuração das urnas, no dia 2 de outubro.
No entanto, levantamento feito pelo Brasil de Fato mostra que, caso diversos parlamentares não tivessem alterado sua autodeclaração racial em relação ao pleito anterior, a presença negra na Casa teria uma queda de 124 para 109, um recuo de 12,09%.
Dos 135 eleitos em 2022, 26, ou 19,25%, eram brancos na última eleição que disputaram. Caso mantivesse a autodeclaração, somente 109 parlamentares negros fariam parte da Câmara dos Deputados a partir de janeiro de 2023.
Entre os partidos com maior número de deputados federais eleitos que passaram a se apresentar como negros somente em 2022, Republicanos e PL puxam a fila: são sete e cinco candidaturas, respectivamente. Somados, são responsáveis por 12 dos 26 ex-brancos, 45% do total.
Além dos dois partidos, PP e UB, cada um com quatro deputados que eram brancos até este ano, completam o topo da lista. Todos, são partidos de direita. À esquerda, somente PT (2) e PCdoB (1) aparecem na relação.
Bahia e Minas Gerais são os estados com o maior número de mudanças na autodeclaração racial, entre os eleitos. As bancadas mineira e baiana na Câmara dos Deputados perderiam oito negros se os candidatos mantivessem a mesma autodeclaração de 2018.
Das 39 cadeiras baianas na Câmara dos Deputados, 21 foram ocupadas por candidatos que se autodeclaram negros em 2022. Destes, quatro afirmavam serem brancos na última eleição que disputaram: Alice Portugal (PCdoB), Felix Mendonça (PDT), Cláudio Cajado (PP) e Elmar Nascimento (UB).
Em Minas Gerais, das 53 vagas do estado na Câmara dos Deputados, 11 serão ocupadas por negros. Porém, no último pleito que disputaram, quatro deles se diziam brancos: Delegada Ione Barbosa (PP), Pinheirinho (PP), Wellington Prado (Pros) e Delegado Marcelo Freitas (UB).
Em 2023, a Câmara dos Deputados terá 26,5% das cadeiras ocupadas por negros. Sem os 26 ex-brancos, esse índice cairia para 21,3%.
Sheila Carvalho, advogada e integrante da Coalizão Negra por Direitos, pondera que a questão numérica pode ser uma armadilha se a quantidade de parlamentares negros eleitos não mantiver um laço estreito com as pautas do movimento negro.
“É preciso entender para quem é essa democracia de que o Brasil tanto fala. A representatividade racial certamente é importante, mas, para nós, o que é crucial é o comprometimento com as pautas que nós do movimento negro defendemos há décadas”, afirma Carvalho.
“Temos que nos manter atentos acerca dessas porcentagens de representatividade negra que não condizem com a realidade”, continua a advogada da Coalizão Negra por Direitos. “Há de se destacar que Arthur Lira, homem branco e atual presidente da Câmara federal, se declara hoje como negro.”
Financiamento de campanhas
A partir da eleição de 2022, candidaturas de mulheres e negros passaram a receber maior aporte financeiro dos partidos, por força de lei. Além disso, a Emenda Constitucional 111/2019 determina que, até 2030, cada voto em candidaturas negras terá peso dois na distribuição dos fundos partidário e eleitoral, que financiam as campanhas.
“Não podemos deixar de considerar a possibilidade de que muitos dos que se declararam negros neste ano o tenham feito pelas vantagens financeiras que isso dá à sua candidatura e ao seu partido, desvirtuando a política disputada pelo movimento negro. E aí o problema não está na regra, mas no uso de estratégias racistas para apropriação de ações afirmativas por grupos historicamente hegemônicos”, encerra Sheila Carvalho.
Confira a lista dos parlamentares que eram brancos na última eleição que disputaram e que se autodeclararam negros, em 2022:
Alexandre Leite (UB-SP)
Antônia Lucia (Republicanos)
Elmar Nascimento (UB)
Claudio Cajado (PP)
Alice Portugal (PCdoB)
Felix Mendonça (PDT)
Gilvan, o Federal da Direita (PL)
Evair de Melo (PP)
Da Vitória (PP)
Professor Alcides (PL)
Detinha (PL)
Cleber Verde (Republicanos)
Weliton Prado (Pros)
Pinheirinho (PP)
Delegado Marcelo Freitas (UB)
Delegada Ione Barbosa (Avante)
Delegado Caveira (PL)
Diego Garcia (Republicanos)
André Ferreira (PL)
Dimas Gadelha (PT)
Mineiro (PT)
Carlos Gomes (Republicanos)
Albuquerque (Republicanos)
Marcos Pereira (Republicanos)
Maria Rosas (Republicanos)
Juscelino Filho (UB)
Fonte: Redação Brasil de Fato