O presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), ministro Alexandre de Moraes, decidiu barrar a instauração de inquéritos pela Polícia Federal e pelo Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) para investigar a atuação de institutos de pesquisas.
Em despacho assinado nesta quinta-feira (13), Moraes alegou ausência de justa causa e “incompetência absoluta” dos órgãos para uma apuração do tipo no período eleitoral.
Ele determinou ainda que a Corregedoria-Geral Eleitoral e a Procuradoria-Geral Eleitoral investiguem “eventual prática de abuso de poder político, consubstanciado no desvio de finalidade no uso de órgãos administrativos com intenção de favorecer determinada candidatura, além do crime de abuso de autoridade”.
As investigações contra institutos de pesquisa fazem parte de uma ofensiva de aliados do presidente Jair Bolsonaro (PL) desencadeada após o primeiro turno. O objetivo, de acordo com bolsonaristas, é apurar as divergências registradas em levantamentos de institutos e o resultado apurado nas urnas.
Nesta quinta, Alexandre Cordeiro, presidente do Cade, enviou um ofício à Superintendência-Geral do órgão determinando a abertura de uma investigação contra institutos de pesquisa.
Cordeiro, que é ligado ao ministro da Casa Civil do governo Bolsonaro, Ciro Nogueira, afirma que os institutos podem ter atuado como um cartel para “manipular” as eleições.
O ofício de Cordeiro foi recebido, porém, como uma representação convencional porque, segundo técnicos do Cade, o presidente do órgão não tem a competência de impor a abertura de investigações.
Em outra frente, a Polícia Federal instaurou, também nesta quinta, um inquérito para investigar institutos de pesquisas eleitorais. A apuração foi solicitada pelo ministro da Justiça de Bolsonaro, Anderson Torres.
“Esse pedido atende a representação recebida no MJSP [Ministério da Justiça e Segurança Pública], que apontou ‘condutas que, em tese, caracterizam a prática de crimes perpetrados’ por alguns institutos”, disse Torres em suas redes sociais ao anunciar, dias após o pleito, o envio de pedido de investigação à PF.
Além das investigações, aliados no Congresso trabalham pela aprovação de um projeto que, na prática, criminaliza levantamentos eleitorais e têm recolhido assinaturas para a instalação de uma CPI.
Moraes afirmou no ofício que o Ministério da Justiça e a presidência do Cade usurpam competências da Justiça Eleitoral. Ele viu ainda intenção dos dois órgãos de “satisfazer vontade eleitoral manifestada pelo chefe do Executivo [Bolsonaro]”.
“Ambas as determinações –MJ e Cade– são baseadas, unicamente, em presunções relacionadas à desconformidade dos resultados das urnas com o desempenho de candidatos retratados nas pesquisas, sem que exista menção a indicativos mínimos de formação do vínculo subjetivo entre os institutos apontados ou mesmo práticas de procedimentos ilícitos”, escreveu Moraes.
“Tais medidas açodadas, além da incompetência dos órgãos que as proferiram e da flagrante usurpação das funções constitucionais da Justiça Eleitoral, parecem demonstrar a intenção de satisfazer a vontade eleitoral manifestada pelo chefe do Executivo e candidato a reeleição, podendo caracterizar, em tese, desvio de finalidade e abuso de poder por parte de seus subscritores”.
O inquérito pedido no Cade seria para investigar os institutos Ipec, Datafolha e Ipespe.
A Folha apurou que, inicialmente, técnicos do órgão não viram materialidade na representação de Cordeiro e afirmam que, ainda que houvesse conluio entre os institutos para uma suposta manipulação de resultados, as empresas não teriam cometido infração à ordem econômica.
Ainda segundo eles, não havia na representação enviada pelo presidente do Cade elementos que evidenciassem, na prática, a combinação de um cartel, a divisão do mercado com o acerto entre eles dos clientes que contrataram as pesquisas. São esses elementos que justificariam a abertura de uma investigação.
“O Cade tem função de proteger a livre concorrência. Não vejo como pesquisas eleitorais possam violar esse princípio. Não há infração à ordem econômica numa pesquisa eleitoral”, afirmou Taís Gasparian, advogada da Folha.
Segundo ela, as pesquisas e sua divulgação são permitidas, e os institutos seguem a legislação ao registrarem os levantamentos. “Todos esses documentos são públicos. Ou seja, não há nem o que ser investigado”, disse.
Em nota após o pedido de investigação do presidente do Cade, o Ipec afirmou que lamentava “mais essa iniciativa contra os institutos de pesquisa, que apenas cumprem o seu papel de mensurar a intenção de voto do eleitor, baseado em critérios científicos e nas informações coletadas no momento em que as pesquisas são realizadas”.
Segundo o instituto, o fato de os levantamentos coincidirem “apenas demonstram a adoção de princípios estatísticos e modelos que suportam a atividade de pesquisa”.
O Ipec disse ainda pautar “a sua conduta profissional e empresarial em princípios éticos” e que “repudia veementemente ações baseadas em teorias que querem confundir e induzir a sociedade à desinformação, com o claro propósito de desestabilizar o andamento das atividades de pesquisa”.
Alexandre Cordeiro era chefe de gabinete de Ciro Nogueira e foi escolhido por Bolsonaro para assumir a presidência do Cade por indicação do ministro. Ciro é um dos políticos mais influentes no governo Bolsonaro. Desde o fim do primeiro turno, ele tem defendido um boicote contra institutos de pesquisa.
A proximidade de Ciro Nogueira e Alexandre Cordeiro teve destaque no relatório em que a Polícia Federal indiciou o ministro do governo Bolsonaro sob suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro, em abril.
O documento detalha uma conversa gravada em 2017 entre Ciro e os empresários Joesley Batista e Ricardo Saud, ambos da J&F.
Na gravação, Ciro chama Cordeiro de “meu menino”, diz que é um dos “seus” no Cade e afirma que não poderia “perder essa influência” no conselho. “Um cara de bom senso. Meu menino, ele era meu chefe de gabinete, eu botei ele lá [no Cade]… E ele conseguiu se entrosar lá”, disse o ministro.
Fonte: Redação Folha de S. Paulo