A luta pela sobrevivência é perpassada pelo cuidado com a família, que é um trabalho exercido por mulheres. Mas, nem sempre foi assim. Até o séc. XV o cuidado e a reprodução da vida eram exercidos pela comunidade. Após a privatização da Terra e o cercamento das terras comunais, este trabalho passou a ser exercido pelas mulheres, de forma individualizada. Neste período, também sofremos com a descriminalização do estupro, e a proliferação de bordeis municipais pela Europa, como parte da estratégia entre a nobreza e a burguesia para debilitar a solidariedade de classe que fora construída pela luta antifeudal, a exemplo dos movimentos heréticos, nos quais as mulheres tinham protagonismo.
O capitalismo, a cultura da violência e a desvalorização do trabalho doméstico avançaram. Em 2021, o Brasil registrou um estupro a cada 10 minutos e um feminicídio a cada 7 horas. De acordo com o relatório da Oxfam, o trabalho não remunerado realizado por mulheres representa US$ 10,8 tri por ano no mundo. No Brasil, 90% do trabalho de cuidado no país são realizados, informalmente, pelas famílias – e desses 90%, quase 85% é feito por mulheres.
A base da desigualdade social e a luta pela sobrevivência tem cara de mulher. Qualquer projeto de reconstrução do Brasil que desconsidere esta realidade estará, a exemplo da burguesia e da nobreza feudal, trabalhando para manter um cenário social desigual e violento para toda a sociedade, e, sobretudo para nós, mulheres pobres.