Segundo Gaeco, há indícios de que 12 mortes investigadas em Curitiba não teriam sido decorrentes de confrontos
Uma operação deflagrada nesta terça-feira (13) pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público do Paraná, determinou o afastamento de 19 policiais paranaenses de suas atividades de rua. Eles passam a cumprir funções administrativas.
A operação, que contou com o apoio da Corregedoria-Geral da Polícia Militar, tem o sugestivo nome de Vehmico. Segundo o site do MP, trata-se de uma referência aos Tribunais Vehmicos, do final da Idade Média, na Alemanha, também chamados de “tribunais secretos”, “tribunais silenciosos” ou “tribunais proibidos”, em que a única punição que poderia ser imposta era a morte. “Se o acusado comparecesse, a sentença era imediatamente executada – se ele não aparecesse, a primeira pessoa a encontrá-lo estaria autorizado a matá-lo”.
O objetivo da operação é obter elementos que auxiliem na investigação do Gaeco sobre quatro ações de policiais militares que resultaram na morte de 12 pessoas em Curitiba e Região Metropolitana. As apurações feitas até agora, de acordo com o órgão, apontam haver indícios de que as mortes não teriam ocorridos em confrontos armados com as vítimas, “que teriam sido mortas por motivos variados”.
Foram cumpridos 31 mandados de busca e apreensão em sete cidades: Curitiba, Pinhais, São José dos Pinhais, Campo Largo, Colombo, Guaratuba e Londrina.
Ao todo, são investigadas 23 pessoas: 18 policiais lotados no Batalhão de Polícia das Rondas Ostensivas de Natureza Especial (Rone), dois policiais do Esquadrão de Eventos do Regimento de Polícia Montada (RPMon), dois policiais da 3ª Companhia do 17º Batalhão de Polícia Militar (Campo Largo) e um policial penal lotado no setor de inteligência do Departamento Penitenciário do Estado (Depen).
Policiais envolvidos em casos apurados
Um dos fatos investigados ocorreu em 11 de agosto, na capital, tendo resultado na morte de oito pessoas, nos bairros Cajuru e Campo de Santana, a partir de ação policial contra possíveis membros de facção criminosa.
O segundo fato resultou na morte de uma pessoa, em 24 de agosto, no interior de uma casa no Jardim Melyane, em Campo Largo.
O terceiro aconteceu na Vila Parolim, em Curitiba, em 2 de setembro, com a morte de um adolescente.
A quarta situação foi em 2 de setembro, no bairro Campo Comprido, em Curitiba, quando morreram duas pessoas, a partir de alegada diligência policial de apoio ao serviço reservado que teria obtido informação de que indivíduos envolvidos em prática de crimes estariam no interior de um condomínio.
Alívio
“Só de saber que eles estão afastados e não mais nas ruas matando ninguém já é um alívio”, afirma Inês Somariva, mãe de Ezequiel Claiton da Silva, morto pela PM no Cajuru, na capital, dia 11 de agosto. “Agora queremos que eles respondam por crime de homicídio”, ressalta.
Segundo Inês, a polícia entrou na casa da irmã dela e fez quatro pessoas reféns: duas de suas irmãs e dois sobrinhos. “Eles ficaram com armas apontadas para eles, que foram obrigados a se ajoelhar e a colocar a mão nos ouvidos”, conta. A sobrinha teve de levar a PM até a casa onde Ezequiel morava, no mesmo terreno da tia. “Estouraram o portão. Fizeram uma série de torturas que durou duas horas. Sem dó nem piedade, mataram todas as seis pessoas que estavam na casa, enquanto eles imploravam pela vida”, diz Inês.
De acordo com ela, Ezequiel estava quites com a Justiça. Tinha acabado de cumprir pena.
Inês afirma que sua irmã, dona da casa, não tem coragem de voltar a Curitiba. Ela foi para o interior e se abrigou na casa de um parente.
Outro caso que está sendo investigado, e que teve os policiais envolvidos afastados, foi o do adolescente Dalysson Willian Mariano, de 17 anos, morto pela Polícia Militar no Parolin, no dia 2 de setembro.
A polícia alega que houve confronto, mas moradores e familiares contestam, dizendo que o jovem não estava armado e sequer reagiu à abordagem. Contam ainda que, após os disparos, ficou mais de meia hora sem nenhum tipo de socorro.
A mãe de Dalysson e seus familiares também passaram a receber diferentes tipos de intimidações. No dia 21 de outubro, policiais que participaram da operação que resultou na morte de Dalysson tentaram invadir a casa da família. Dia 4 de dezembro, PMs que supostamente estavam na região para efetuar prisões teriam agredido e ameaçado moradores (ver vídeo).
Outro lado
Em nota, a Polícia Militar do Paraná diz que a Corregedoria acompanhou a operação realizada pelo Gaeco, quando foram cumpridos 31 mandados de busca e apreensão “em desfavor” de policiais militares. No entanto, segundo a instituição, “nada de ilícito” foi encontrado com eles. “A PMPR ressalta seu compromisso em prestar todos os esclarecimentos necessários, atuando sempre em prol da transparência para com a população paranaense”, diz o documento.
Fonte: Redação Rede Lume