Novo foi o único partido que votou contra. PL, que segue agora para promulgação, inclui no Estatuto da Cidade diretrizes para impedir o emprego de “técnicas construtivas hostis” à população em situação de rua
O Congresso Nacional derrubou nesta sexta-feira (16) o veto do presidente Jair Bolsonaro (PL) à Lei Padre Júlio Lancellotti. Originada do projeto de Lei (PL) 488/2021, que proíbe o uso de arquitetura hostil, com emprego de materiais, estruturas, equipamentos e técnicas que afastem pessoas do uso de espaços de uso público nas cidades brasileiras, principalmente aquelas em situação de rua, havia sido barrada por Bolsonaro na terça (13).
No veto, publicado no Diário Oficial da União (DOU), o governo federal justificou que a proposição seria “contrária ao interesse público”. Alega que a medida poderia “interferir na função de planejamento e de governança locais da política urbana”.
O mandatário, derrotado na campanha à reeleição neste ano, também argumentou que o emprego da expressão “técnicas construtivas hostis” poderia causar insegurança jurídica. Segundo ele, esse seria um “conceito ainda em construção”.
Bolsonaristas e o Novo contra
A maioria dos parlamentares discordou da interpretação do Executivo. Conforme noticiou a RBA, o veto foi incluído na pauta do Legislativo antes mesmo do prazo final. No Senado, caiu com 60 votos em defesa da lei. Apenas os parlamentares bolsonaristas Flávio Bolsonaro (PL-RJ), Carlos Portinho (PL-RJ), Carlos Viana (PL-MG) e Eduardo Girão (Podemos-CE) foram contra a promulgação. Já na Câmara, a decisão do presidente perdeu com os votos de 354 deputados, ante 39 em defesa do veto. O Novo foi a única legenda que indicou a manutenção do veto.
A decisão final foi celebrada pelo autor da lei, senador Fabiano Contarato (PT-ES). O texto se tornará agora a Lei Padre Júlio Lancellotti. Uma homenagem ao líder religioso que dedica a vida ao acolhimento dos mais pobres e excluídos. O projeto de lei também faz referência à luta engajada por Lancellotti nos últimos anos contra o uso da “arquitetura hostil” em espaços públicos.
O pároco chamou atenção ao problema principalmente em fevereiro de 2021, quando quebrou, com uma marreta, paralelepípedos instalados pela prefeitura de São Paulo sob um viaduto na zona leste da cidade. Desde então, ele passou a denunciar o problema nas redes sociais, compartilhando o uso da técnica em todo o país para afastar e restringir o acesso de espaços públicos principalmente por pessoas em situação de rua. No mesmo ano, o papa Francisco também classificou a prática como “arquitetura hostil”.
Luta e inspiração
A atuação de Lancellotti foi lembrada também nesta sexta pelo PT, que destacou a derrubada do veto como uma “marretada no ódio”. O deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), que foi relator da proposta na Comissão Constituição e Justiça (CCJ), também comemorou a promulgação da lei.
“É uma conquista civilizatória, inspirada na luta de padre Júlio por cidades mais humanas e menos hostis à população de rua. Viva os direitos humanos!”, destacou.
O texto do PL também proíbe o uso de espetos pontiagudos instalados em fachadas comerciais, pavimentação irregular, pedras ásperas, jatos de água, cercas eletrificadas ou de arame farpado e muros com cacos de vidro. A iniciativa também altera a Lei 10.257 de 2021, do Estatuto da Cidade, para estabelecer como diretriz a “promoção de conforto, abrigo, descanso, bem-estar e acessibilidade na fruição dos espaços livres de uso público, de seu mobiliário e de suas interfaces com os espaços de uso privado”.
O trabalho do religioso inspirou propostas semelhantes em câmaras municipais e assembleias legislativas. Ainda ontem (15), Recife se tornou a primeira capital a aprovar uma lei, de autoria da vereadora Liana Cirne (PT), contra a arquitetura hostil. O prefeito João Campos (PSB) sancionou a lei nesta sexta.
Fonte: Redação CUT