Renato Freitas e Ricardo Arruda são levados ao Conselho de Ética da Alep após Corregedoria analisar denúncia contra ambos
Caberá ao Conselho de Ética da Assembleia Legislativa (Alep) decidir se abre ou não procedimento disciplinar contra os deputados Renato Freitas (PT) e Ricardo Arruda (PL). O órgão foi acionado pela Corregedoria da Casa, que afirmou nesta terça-feira (23) ter encontrado indícios de quebra de decoro parlamentar em material de denúncia contra ambos, analisado nas últimas semanas.
Freitas e Arruda estavam presentes na sessão desta terça – e a decisão não surpreende nem a eles nem aos demais na Assembleia. Já era um posicionamento esperado desde que a postura de dos deputados começou a irritar a Mesa Diretora.
A decisão leva em conta falas proferidas em diferentes discursos na tribuna do Plenário. Segundo o relatório final, em muitos dos trechos analisados destacam-se expressões pejorativas trocadas entre os dois e que também atingiram “autoridades públicas ocupantes ou não de cargos públicos, e até mesmo, por vezes, contra particulares, atribuindo-lhes, em certa medida, imputações criminosas”.
Na semana passada, a Corregedoria decidiu arquivar uma das denúncias levadas ao órgão contra Freitas. O corregedor, o deputado Artagão Junior (PSD), entendeu que o questionamento específico – promovido por Arruda contra Freitas – não dava materialidade ao caso.
Além da denúncia já arquivada, o petista tinha ainda outras duas queixas sobre a mesa da Corregedoria. Uma continua em apuração e a outra, em que também pesam acusações contra Ricardo Arruda, agora segue adiante. Com os autos em mãos, é o Conselho de Ética que terá de decidir se os indícios são suficientes para abrir procedimento contra os parlamentares.
Esta não é a primeira vez que Renato Freitas terá de lidar com um processo disciplinar, caso a investigação se materialize. No ano passado, enquanto vereador de Curitiba, ele chegou a ser cassado em uma decisão depois suspensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O relator, o ministro Luís Roberto Barroso, associou a cassação também a uma questão de racismo.
Agora na Alep, se houver sinal verde, o petista e o deputado do PL poderão ser punidos depois de cumprido todo o rito previsto no regimento da Alep. De acordo com as regras, o desrespeito a estas normas podem render penas de censura verbal e escrita.
A avaliação da equipe da Corregedoria da Alep é de que houve violação às regras descritas pelos incisos II, IV e V do artigo 271 do documento, relacionados, respectivamente, à “prática de atos que infrinjam as regras de boa conduta nas dependências da Casa”, ao “uso, em discurso ou proposição, de expressões atentatórias ao decoro parlamentar” e à “prática de ofensas físicas ou morais a qualquer pessoa, no edifício da Assembleia Legislativa, ou o desacato, por atos ou palavras, a outro Parlamentar, à Mesa ou a Comissão, ou aos respectivos Presidentes”.
O despacho assinado pelo corregedor no dia 15 de maio, e tornado público durante a sessão desta terça-feira (23), sugere práticas supostamente contrárias ao decoro parlamentar em duas frentes. Umas delas envolve acusações mútuas trocadas entre os deputados – em parte, foi o que continha a denúncia de Arruda contra Renato Freitas arquivada neste mês.
Outra parte traz um recorte de trechos dos discursos analisados sob a perspectiva de terem, “eventualmente, atingido instituições, autoridades, cidadãos ou empresas privadas, diante da utilização de termos pejorativos, de baixo calão ou por atribuição direta ao cometimento de fatos ou ações não comprovadas ou que ainda não tenham tido decisão judicial transitada em julgado”.
“Quero ver o senhor falar das nossas manifestações de direita, que nunca foram violentas, zero de violência. E quem invadiu e quebrou tudo no dia 8 foram os contratados do PT”, diz uma das partes destacadas de um dos pronunciamentos de Ricardo Arruda. Bolsonarista, o deputado direciona com frequência suas falas contra o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “E aí o Lula disse um dia: Temos que acabar com essas manifestações em frente aos quartéis. Qual era o jeito? Vamos armar uma situação para culpá-los de terroristas. Exatamente. Por isso a paúra do Lula e do Flávio Dino que a CPI ocorra”, diz outro fragmento, referente aos atos antidemocráticos de 8 de janeiro, cujos propósitos estão em investigação pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Também foram recortadas falas do deputado do PL contra empresários do transporte público de Curitiba (“Estou falando da família Gulin, aquela família, Deputado Tito, que vimos o Prefeito Rafael Greca, às escondidas, no Graciosa Country Club, almoçando com o Donato Gulin e acertando os valores de subsídio, de aumento da tarifa do transporte”) e contra outros parlamentares da Alep (“Esse é um Projeto importante, porque os diretores de colégios, a maioria de esquerda, vão com camiseta do Lula, fazem campanha eleitoral, falam mal do outro Governo. Infelizmente o relator foi o Deputado Romanelli, erraram na relatoria; mas, enfim, tinha que pôr alguém ou de centro ou de direita para relatar isso”).
Dos discursos de Renato Freitas, foram extraídos trechos de críticas a políticos, como contra o governador do Paraná. “Agora, o que sei é que o ensino não reflexivo, que estimula a preguiça intelectual, a fake news intencional, esse discurso está sendo alimentado e praticado pelo Rato, pelo abjeto Governador”.
Uma fala envolvendo o empresário Luciano Hang, dono da rede de lojas Havan e um dos nomes de maior peso nas campanhas de Jair Bolsonaro, também foi negritada (“Está apodrecendo em vida. Por quê? Assim como o Velho da Havan, que rifou a própria mãe para fazer experimento laboratorial, negando a vacina, e o resultado foi tão triste para ela. Ele permanece vivo, não sei se dorme à noite”).
Entraram nos recortes também partes de discursos do petista com críticas à órgãos e agentes de segurança pública. “Uma política de morte promovida pelo município de Curitiba, capital deste importante Estado do Paraná, que governamos”, diz um trecho, cujo o contexto era a morte de um adolescente pela Guarda Municipal de Curitiba. Outro tem relação com investigação de supostas práticas de corrupção práticas por Arruda, em andamento na Justiça. “Quando esses policiais – e isso ficou comprovado pela palavra dos próprios policiais – foram extorquidos em valores de 50, 60, R$ 70 mil para voltarem para sua corporação, a partir do Chefe de Gabinete do senhor, Ricardo Arruda, assessores políticos de sua confiança, Deputado Ricardo Arruda, quando essas pessoas são admitidas, a morte volta a assolar a população mais pobre, a população fragilizada, vulnerável”.
Ao falar sobre a conclusão dos trabalhos nesta terça-feira, o corregedor da Alep disse que foram analisados vídeos e transcrições de diversas sessões da Casa. “Tais imputações não podem ser levadas À tribuna dessa Casa a não ser que, junto com elas, estejam os documentos que comprovem, que demonstrem, que confirmem tais afirmativas”, disse o deputado Artagão Junior.
O Conselho de Ética e Decoro Parlamentar é presidido pelo deputado Delegado Jacovós (PL). No início do ano legislativo, Jacovós e Ricardo Arruda protagonizaram uma cena de desentendimento em meio ao Plenário, provocada pelo fato de Arruda – que foi presidente do Conselho na legislatura passada – não ter concordado em perder a posição dentro do órgão.
Afastado da Alep por atestado médico, Arruda divulgou um vídeo em que afirma estar “muito tranquilo” com o processo e garante que tudo o que ele falou em plenário ele “comprova”, pois “não há nenhuma mentira”. Segundo ele, suas falas são baseadas no artigo 53 da Constituição Federal, que trata deputados e senadores como “invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”.
“A Corregedoria tem que tomar uma atitude. Se o deputado julgou dessa maneira, vamos responder com muita tranquilidade”.
O mandato do deputado Renato Freitas ainda não se manifestou.
Fonte: Jornal Plural