Polícia Militar e Ministério Público do Paraná reconhecem que desconheciam parte da denúncia
Após o deputado estadual Renato Freitas (PT) veicular dois vídeos em que policiais militares do Paraná torturam presos em Matelândia, a Polícia Militar disse que desconhecia parte da denúncia envolvendo um terceiro policial. Os vídeos são de 2017 e a PM também apontou que todos os envolvidos já foram afastados. O parlamentar, no entanto, exige transparência sobre o caso, reivindicando a divulgação dos números dos processos administrativos e criminais referentes aos dois policiais que aparecem no segundo vídeo que denuncia práticas de tortura.
“É necessário na atividade parlamentar fiscalizar o governo e o serviço público prestado pelo Estado, sobretudo quando se trata da polícia que tem a função de salvaguardar a vida humana e a paz social, justamente o contrário do que foi feito nesse caso, esperamos que os responsáveis sejam punidos e excluídos da corporação”, afirmou Freitas.
Divulgados nas redes sociais no domingo (21), os vídeos mostram jovens algemados e presos no Batalhão da Polícia Militar de Matelândia encostados em uma parede sofrendo agressões por parte de policiais. Um dos policiais segura a cabeça de um deles e lhe dá um tapa. O rapaz está com uma luva cirúrgica no rosto e é possível ouvir alguém que parece estar filmando perguntar se ele “gostou do saco”.
Em um segundo vídeo, aparecem ao todo quatro jovens algemados e outro policial militar batendo com um bastão nos pés de um dos jovens. É possível ouvir risadas de quem está atrás da câmera.
Em coletiva de imprensa nesta segunda-feira (22), o corregedor adjunto da Polícia Militar do Paraná, Idevaldo de Paula Cunha, disse que o órgão tinha conhecimento das primeiras imagens e que os policiais militares envolvidos foram afastados. No entanto, reconhece que desconheciam o segundo vídeo.
“Tomamos conhecimento deste vídeo neste final de semana, quando começou a ser republicado no Instagram. E, ao verificar os vídeos, constatamos dois fatos. O primeiro, trata-se da utilização de uma luva de látex e já tinha sido identificado em 2019, e na época foi aberto processo apuratório expulsório, identificados dois policiais, um que comete as agressões e outro que grava. Em 2023, os dois foram condenados na esfera criminal”, disse.
Sobre o segundo vídeo, o corregedor adjunto explicou: “Não tínhamos conhecimento desta imagem e identificamos um terceiro envolvido que é o que segura a pessoa a ser agredida. Ele também foi afastado nesta semana e tem o inquérito de apuração aberto”.
Transparência
O deputado Renato Freitas, no entanto, vem questionando a Polícia Militar quanto à transparência dos processos administrativos, já que logo após a divulgação dos vídeos, a Polícia Militar chegou a publicar uma nota dizendo que todos os envolvidos haviam sido condenados e expulsos da corporação. Após a grande repercussão das imagens, uma segunda nota veio à público reconhecendo que um dos policiais envolvidos no segundo vídeo ainda não tinha sido investigado.
Também, em nota, o Ministério Público do Paraná disse que os envolvidos no primeiro vídeo foram denunciados ao órgão e condenados à perda de cargo público. Mas também que as imagens do segundo vídeo não haviam chegado ao conhecimento do MP e que serão “adotadas medidas apuratórias para esclarecimento e eventual responsabilização”.
Para Renato Freitas, é preciso ainda muitos esclarecimentos por parte da Polícia Militar. “Os meninos que aparecem no segundo momento do vídeo são menores? A PM alega que eles portavam drogas, quanto? O que aconteceu com essas vítimas, foram liberadas logo na sequência? O Estado indenizou os rapazes? Os policiais envolvidos cumpriram pena pelo crime de tortura? Quantos policiais respondem hoje pelo crime de tortura na corporação? Foram dois crimes de tortura no mesmo ano, na mesma delegacia, o que acontece por lá, não seria o caso de abrir uma sindicância? O que o governador acha disso? Por que a Assembleia Legislativa do Paraná não leva adiante o projeto que obriga as forças de segurança a usar as câmeras corporais, no qual sou coautor? A quem interessa passar pano para torturador?”, questionou Freitas.
“É preciso agir além dos casos pontuais”
Analisando todo o caso, o ex-coordenador do Movimento dos Policiais Antifascistas do Paraná, o policial reformado Martel Alexandre disse que, apesar da Polícia Militar ter agido com processos administrativos e afastamento dos cargos, ainda é uma ação pontual que não resolve algo que pode estar sendo reproduzido como ação comum.
“Para prestar um bom serviço, a Polícia deixou a desejar. Não basta fazer com que um policial que comete um erro desses responda. É preciso averiguar se essa ação é isolada, que os demais discordam, ou se este tipo de atitude está de alguma forma sendo reproduzida na instituição”, disse.
Segundo Martel, casos como estes exigem medidas para compreender e incidir sobre o todo. “Posso, por exemplo, sugerir que se faça uma pesquisa de como está o espírito da instituição, como os policiais enxergam isso. Portanto, a Polícia Militar deveria em nota ter demonstrado que condenou, mas que divulgou para o restante da corporação que isso será sempre repudiado. Além da nota, que esse repúdio chegue na formação destes profissionais, em cursos, etc”, explicou o policial reformado.
Fonte: Brasil de Fato